A
esperança cristã
>> Tese defendida em 28/04/1998 no ISTARJ, filiado à PUC-RJ
1. A DESCOBERTA PROGRESSIVA DA ESPERANÇA
1.1. A criação e a esperança do Reino (o fim já está no começo).
1.2. A progressiva revelação da esperança no AT.
1.3. O ser humano como ser de esperança.
2. JESUS, REALIZAÇÃO DA NOSSA ESPERANÇA
2.1. Kénosis: caminho de Cristo para realização da esperança.
2.2. Parusia: realização plena de toda esperança.
2.3. Espírito Santo: garantia da nossa esperança.
3. IGREJA, SERVA E ANUNCIADORA DA ESPERANÇA
3.1. O anúncio (kérygma) da esperança.
3.2. O testemunho da esperança (caridade).
3.3. A celebração da esperança (dimensão sacramental).
Introdução
Partindo do amor do Deus
criador, em cuja perspectiva é possível compreender seu relacionamento com o
não-existente, notamos que Ele não seria capaz de deixar nada ao nada.
Primariamente, a esperança fundamenta-se nas promessas desse Deus criador. A
lembrança da intervenção histórica de Deus alimenta a esperança universal. A
esperança do Reino de Deus está unida à esperança da salvação, da felicidade e
da vida. Desde o início, Deus se faz presente na caminhada do povo, cuja
esperança se encontra n’Ele. A dinâmica da esperança começa quando Deus se
revela como alguém que promete a terra e a prole numerosa. Além desses dois
elementos, a esperança vétero-testamentária inclui ainda a intimidade com Deus.
A partir da libertação do
Egito percebe-se uma ampliação da esperança de Israel. Os profetas, por sua
vez, são a motivação de que a esperança de Israel não será destruída. Eles
foram os responsáveis por alimentar a esperança na restauração de Israel,
anunciando-a na forma de uma nova aliança, e por pregar contra as falsas
esperanças: força, inheiro, poder etc. Pouco a pouco, vamos percebendo que é a
esperança que dá coragem a esse povo para seguir na sua caminhada. Sem a
esperança, a vida perde totalmente o seu sentido. O homem não se contenta com o
mundo, já que foi feito para algo maior; por isso, inconformado com a realidade
que não o satisfaz plenamente, encontra em Deus a razão da sua esperança. Para
o cristão, essa esperança consiste na posse dos bens eternos.
Com a vinda de Jesus ao mundo,
concretizam-se as nossas esperanças, pois o prometido e esperado torna-se
visível. Cristo, o novo Adão, carrega sobre si os pecados dos homens e Deus
exalta sua humilhação. Jesus vem trazer ao mundo uma mensagem de misericórdia,
de perdão e de salvação, mudando o foco do julgamento da lei para a graça de
Deus. Seus milagres são manifestações da salvação que chamam à fé num Deus que
deseja a plena felicidade do homem. Graças à Sua ressurreição, temos a garantia
de que também ressuscitaremos para a vida eterna após nosso encontro pessoal
com Ele na morte. Cristo prometeu retornar no fim da história; contudo, os
primeiros cristãos esperavam uma volta imediata. Antes de regressar ao Pai,
Jesus promete o auxílio do Paráclito, o Espírito Santo. Ele nos foi confiado
como garantia da glória, nos acompanha em nossa caminhada e nos torna ricos em
esperança.
Os apóstolos, testemunhas da
ressurreição, têm a missão de anunciar essa boa-nova, segundo a qual todos os
homens são chamados à salvação. A meta da pregação cristã é, justamente,
comunicar a vitória da vida sobre a morte. O tempo da Igreja é o tempo da pregação
e do testemunho. Este se manifesta na caridade que, juntamente com a fé
fortalecem a esperança. A eficácia do testemunho eclesial é garantida pela
presença do Cristo ressuscitado que, através do Espírito, acompanha Sua Igreja.
Enquanto a esperança antevê o futuro e o Reino, já presentes em nosso meio, ela
tem motivos para celebrar e comemorar. A celebração tem como ponto de partida
as experiências humanas; contudo, trata da eternidade e visa o agradecimento a
Deus e o fortalecimento dos cristãos. A festa surge, então, como manifestação
da alegria de saber que, na eternidade, acontecerá a plena realização de tudo
aquilo de bom e verdadeiro que aqui sentimos.
Primeiro Capítulo: A
DESCOBERTA PROGRESSIVA DA ESPERANÇA
1.1. A criação e a esperança
do Reino
No Deus que chama o não-ser ao
ser, o futuro se torna compreensível uma vez que pode ser esperado. O crente
vive para além do dia, na espera das coisas que , de acordo com a promessa do
Criador do mundo, devem vir. Na perspectiva do Deus criador, é possível compreender
um amor para com o não-existente, para com o desigual, transitório e sem valor.
A esperança é capaz de ver um futuro para o que passa, o que morre, futuro este
que está nas ppromessas do Deus criador. Por isso, viver sem esperança é como
não mais viver. Não é à toa que Dante, ao falar sobre o inferno, escreveu:
"Deixai toda a esperança, vós que aqui entrais". "A esperança
colocada no Criador torna-se felicidade no presente, pois seu amor nada deixa
ao nada e mostra a tudo a abertura em direção ao possível, onde poderá viver e,
com certeza, viverá".
Unida à esperança do Reino de
Deus está a esperança de que os homens e toda criação cheguem à salvação, à
felicidade, à vida e ao seu verdadeiro destino. Na concepção do Reino de Deus,
Moltmann destaca dois momentos relacionados entre si: a esperança do Seu reino
histórico e do Seu senhorio universal. Diz ele que estes aspectos não podem ser
opostos entre si de modo a afirmar que o primeiro é uma limitação nacional e o
segundo é uma fé cósmica universal. Conclui afirmando que a esperança universal
funda-se na lembrança da realidade histórica da ação de Deus e que o Reino de
Deus já estaria presente como promessa e esperança dentro do horizonte de
futuro para toda a criação.
Boff defende que o fim já está
presente no começo. Diz ele que, quando o primeiro átomo começou a vibrar, seu
movimento não foi sem sentido; "tudo se mexe e caminha porque está em
gestação um céu que começa aqui embaixo e vai crescendo e se expandindo até
terminar de nascer na consumação dos tempos". Para ele, em vez de falarmos
em fim do mundo, deveríamos falar em futuro do mundo.
Moltmann defende que, desde
tempos remotos, o futuro da criação era designado como sendo Reino da Glória. A
finalidade deste símbolo da esperança cósmica é, segundo ele, indicar que a
criação no início é aberta e sua consumação consiste em ser pátria e moradia da
glória de Deus. Sendo assim, no Reino da Glória, Deus tomaria integralmente e
para sempre morada na sua criação e faria com que todas as suas criaturas
pudessem participar da plenitude da sua vida eterna. De acordo com a tradição
bíblica, a criação está orientada desde o início para a sua salvação, pois a
criação do mundo está voltada para o sábado, onde ela chega à sua plenitude e o
sábado revela o mundo como criação de Deus.
1.2. A progressiva revelação
da esperança no AT
Dentre as características
fundamentais da história do povo de Israel encontramos a esperança. No AT, a
esperança consiste na expectativa confiante da proteção e da bênção de Javé, como
cumprimento das promessas da aliança. Desde o início, Deus se faz presente na
caminhada do povo, cuja esperança para uma vida bem-sucedida é sempre esperança
em Deus. Israel
sempre esperou o Deus que age na história e que haverá de levá-la a uma meta de
salvação universal que é o Reino de Deus. A dinâmica da esperança começa já no
início da revelação, quando Deus se revela como alguém que promete a terra e
numerosa prole. Quem tem prole não morre, porque aquilo que foi e aquilo que
fez continua nos filhos e netos. Blank ensina que a dinâmica que começou com a
esperança na libertação continua incentivando a caminhada pelo deserto e, a
partir da libertação do Egito, a esperança se amplia. As experiências
históricas do passado são narradas para despertar a confiança na fidelidade de
Javé. Tais referências ao passado fortalecem a fé num Deus que prometeu e
realizou suas promessas. Além dos elementos "terra e descendência",
podemos dizer que a esperança vétero-testamentária compreende ainda a intimidade
com Deus.
A revelação feita a Abraão
inclui uma promessa, que era, para ele, razão de esperança. Ele, então caminha
rumo a esta esperança concreta. Por ocasião do nascimento de Isaac, esta
esperança começou a se concretizar, pois a promessa dizia que Abraão seria pai
de um grande povo, bênção para todas as nações. Deus encaminha a esperança de
Israel para um futuro visível: a descendência numerosa e a terra prometida;
depois, aos poucos, amplia o horizonte da esperança. Ao fundar uma aliança,
Deus promete sua presença e, com suas promessas, coloca o futuro como tempo de
esperança. No Egito, Javé se revela como Deus da libertação; contra a
resistência do faraó, conduz seus eleitos para um futuro apenas por Ele
conhecido. Percebe-se que, a cada aparição de Deus está ligada uma promessa de
salvação. Israel deve cada etapa em busca da posse da terra prometida à
iniciativa de Javé, que se mantém fiel apesar de toda a infidelidade do povo
eleito. Até a conquista de Canaã, o principal objeto da esperança era a terra
prometida; em seguida, aumentando-se os perigos que ameaçavam a existência de
Israel, a esperança da proteção de Javé foi ficando mais viva.
Como a história dos reis é
marcada pela não realização da unção por parte dos ungidos, compreende-se o
surgimento do messianismo: a fé no ungido que cumprirá a unção. Unido a este
fato está a constituição de uma monarquia de salvação, a qual deve conduzir a
uma esperança que vai além da realidade política. A figura do rei
transforma-se, portanto, na figura do Messias. Esta transformação mobiliza o
povo para uma nova marcha na sua esperança em Deus.
Os profetas, anunciando a
mensagem transmitida por Deus, são a motivação de que a esperança de Israel não
será destruída. Eles preservam a identidade do povo escolhido, interpretando
sua história e suscitando suas esperanças, que são incentivadas pelas
promessas, as quais, por sua vez, lançam o olhar para o "éschaton" do
seu cumprimento. As palavras proféticas após o exílio querem transmitir que, mesmo
quando a comunhão do povo com Deus se encontra comprometida, o Deus da criação
e da aliança é a causa da esperança. Os profetas, embora ameaçassem com a
punição divina, não deixaram de alimentar a esperança na redenção e na
restauração de Israel. Eles pregaram contra as falsas esperanças dos homens,
tais como a força, o dinheiro e o poder.
Quando o castigo predito se
tornou um fato pela destruição dos dois reinos, a esperança da salvação chegou
ao seu auge, sobretudo nas profecias de Jeremias, Ezequiel e do II Isaías;
estes anunciaram a restauração de Israel na forma de uma nova aliança e de uma
entronização de Javé como rei não apenas de Israel mas do mundo inteiro. Deste
modo, a esperança em Israel ganha um caráter escatológico. No tempo dos
profetas, compreende-se que toda a humanidade participará na esperança de
Israel. Como o Deus de Israel é o criador do mundo e da humanidade, o futuro do
povo eleito será a salvação para toda a humanidade. A esperança messiânica de
Israel se torna tão universal na esperança apocalíptica que a promessa
específica e a própria história de Israel desaparecem, atingindo-se o horizonte
original da criação. Percebemos, portanto, que Deus, desde o começo, tinha em
mente a salvação de toda a criação.
A grande esperança de Israel e
de todos os povos não pode ser reduzida apenas aos bens terrenos, porque Deus é
a única esperança capaz de suprir as infinitas aspirações dos povos. O Messias
é uma figura de esperança histórica para o povo, alguém que traz uma
expectativa supramundana, pois vence o mundo para todos os povos. O servo de
Javé de Isaías é a figura da realização messiânica da profecia de Israel. O
novo servo de Javé deverá ser: profeta
do novo êxodo, sacerdote da reconciliação e sacrifício da redenção simultaneamente.
do novo êxodo, sacerdote da reconciliação e sacrifício da redenção simultaneamente.
1.3. O ser humano como ser de
esperança
Esperamos e trabalhamos para
que o ainda-não aconteça, mesmo sabendo que só Deus é capaz de cumpri-lo
plenamente, e a nossa esperança não é abalada. Ter esperança não significa
aguardar resignadamente. Kemp chama esta atitude de "alienação da
esperança", pois se poderia pensar: "não tenho capacidade para
realizar coisa alguma". Dentro dessa perspectiva, se esperaria que, no
futuro, tudo se realizasse sem qualquer esforço. Este tipo de esperança
passiva, nada mais é do que uma forma disfarçada de desesperança. "O
importante é aprender a esperar (...) quando olhamos para o futuro aberto,
escuro e indeterminado como ele é, é a esperança que nos dá coragem".
O ser humano sempre viveu de
esperança, a qual consiste na certeza do incerto. Abordando este tema, Walter
Kasper, afirma: "quando não há esperança alguma para o futuro, a vida fica
completamente sem sentido". Tentando definir a esperança, diz Fromm que
ter esperança é estar pronto a todo momento para o que ainda não nasceu e não
se desesperar se não ocorrer nascimento algum durante nossa existência. O homo
sperans age para ver o mais depressa possível o "ainda-não-existente"
tornar-se realidade. A esperança nos faz compreender porque muitos homens não
temeram a morte, chegando a dar suas próprias vidas por causas nobres.
Compreende-se ainda porque muitas pessoas, impulsionadas pela esperança,
renunciaram às suas paixões, suas vaidades, família e terra de origem para se
dedicar no serviço aos outros. Embora não esteja livre do temor, da ansiedade,
da insegurança e do risco,o homem está sempre na espera de algo melhor.
O homem tem garantida a sua
esperança na fidelidade de Deus, que mantém sua palavra, sua promessa e não
mentirá, pois não pode negar-se a si mesmo. "Se a certeza da esperança
cristã se fundamenta na promessa e na missão do Cristo crucificado, logo, a
ressurreição de Cristo traz consigo uma esperança que aponta para o futuro do
mundo e do homem no futuro de Cristo". O verdadeiro cristão questiona-se
sobre a ligação das esperanças humanas com a esperança escatológica no sentido
de descobrir como a esperança maior pode caber na pequena esperança do
dia-a-dia. Ao descrever nossa realidade, Libânio diz que as ameaças sobre o
futuro da humanidade têm gerado desesperança, angústia e medo e há casais que
pensam apenas no curto prazo da existência e, por isso, multiplicam as
situações de prazer ao máximo, sem qualquer perspectiva de futuro através da
procriação de filhos. Contudo, a esperança do homem em Cristo não é arruinada
pelas desesperanças deste mundo. O cristão não se conforma com a morte, uma vez
que Cristo não permaneceu na morte.
A esperança cristã não é uma
utopia da fé, não é apenas "mais uma possibilidade"; ao contrário,
ela se apresenta como um processo em direção à verdade, não se aliando ao
desespero das esperanças terrenas, mas produzindo um sentimento de confiança de
que o bem e a justiça de Deus virão. O homem não se contenta com o mundo, uma
vez que foi feito para algo maior. Inconformado com a realidade que não o preenche
nem satisfaz plenamente, encontra em Deus a razão da sua esperança e vive dessa
esperança.
Enquanto o futuro
freqüentemente provoca medo no homem, a esperança procura adiantar-se ao
futuro, criando-o na imaginação e amando-o na pré-captação, dinamizando e
iluminando, assim, toda a existência do homem, pois o capacita a caminhar com o
coração alegre e ansioso pelo que vem. Sem esperança, o homem não é capaz de
lutar nem de sofrer. Enquanto não encontra em Deus a sua esperança, o homem,
desalentado, contenta-se com a segurança oferecida pela sociedade moderna.
"Enquanto vive, o homem
tem esperança; quando desaparece a esperança, tudo está perdido". Na
perspectiva da nova aliança em
Jesus Cristo , a esperança já não é mais a mesma dos que
viviam na antiga aliança, pois ela se apóia na redenção já realizada por
Cristo. Através das bem-aventuranças, Jesus quer anunciar aos pobres, humildes
e oprimidos a futura realização da esperança deles. A esperança do cristão
consiste na posse de bens que pertencem ao Reino de Deus e que são, ao mesmo
tempo, presentes e futuros; ela não decepciona e, juntamente com a fé e o amor,
constitui toda a vida interior do cristão.
Segundo Capítulo:
JESUS, REALIZAÇÃO DA NOSSA ESPERANÇA
2.1. Kénosis: caminho de
Cristo para a realização da esperança
Com a vinda de Jesus ao mundo
e sua mensagem, concretizam-se as nossas esperanças, uma vez que o prometido e
esperado torna-se visível, e, deste modo, acontece a grande e decisiva virada
da história da humanidade, que tende ainda à plenitude e à completa consumação.
São Paulo, na sua segunda carta aos Coríntios, lembra muito bem que Jesus,
através de sua kénosis, de rico se fez pobre para nos enriquecer com sua
pobreza. O primeiro homem peca, exaltando-se ou procurando igualdade total com
Deus. O pecado de orgulho leva-o a romper a comunhão com Deus e com os irmãos e
precipita toda a humanidade no pecado. Já Cristo, o novo Adão, se abaixa até
tornar-se servo sofredor que carrega sobre si os pecados dos homens. Deste
modo, Deus exalta a sua humilhação e nela a sua função de novo Adão, que dá a
vida.
O caminho seguido por Cristo
não foi o da glória, mas o da doação, do esvaziamento, da humildade e do
sofrimento. Fez o contrário de Adão que, ao desobedecer a Deus, procurava a
própria realização. Ao seu esvaziamento contrapõe-se a exaltação da parte de
Deus. Na existência histórica de Cristo, cujo centro encontra-se no evento
pascal, reside o ápice do seu ‘esvaziamento’, humilhação e, conseqüentemente,
da sua exaltação. A ressurreição de Jesus dentre os mortos é o acontecimento
fundamental que antecipa, entre outras coisas, o propósito da história e a
vinda da futura salvação.
Enquanto João Batista fala de
ira e condenação, Jesus fala de salvação, de misericórdia, mudando o foco do
julgamento da lei para a graça de Deus. O Batista estava ainda no âmbito da
Lei, enquanto que Jesus, com o seu Evangelho, quer transmitir a infinita
bondade do Pai. Na mensagem de Jesus, a face de Javé perde definitivamente sua
característica ameaçadora: Deus se torna unilateral e gratuitamente um Deus de
salvação. Os milagres são manifestações da salvação que convidam à fé num Deus
que quer a felicidade plena do homem. Jesus, ao contrário dos profetas, não
apenas anuncia o Reino de Deus, mas já o torna presente. A mensagem de Jesus, a
qual anuncia o Reino, proclama a realização de tudo o que sempre foi esperado e
amplia as dimensões da esperança, não só para o povo de Israel, mas para toda a
humanidade.
Deus quis se aproximar de nós;
em Jesus termina o prazo da espera. O Filho de Deus assume a natureza humana
para realizar nela a nossa salvação. O Novo Testamento, viu n’Ele o homem novo
e o Adão escatológico, o primeiro a chegar àquilo que pessoa alguma havia
chegado. Com Sua encarnação e ressurreição, diz Boff, a utopia se tornou topia,
o impossível ao homem, mas ansiado e buscado insaciavelmente, se mostrou
possível para Deus. "Cristo realizou o que, para nós, é ainda esperança.
Não vemos o que esperamos, mas somos corpo da Cabeça na qual se concretizou o
que esperamos".
Para os primeiros cristãos,
era evidente que os atos de Jesus supunham a história e as esperanças
messiânicas de Israel, assumidas por Ele em toda a sua totalidade. Jesus, que
se apresentava em nome das esperanças do povo, via-se rejeitado por esse mesmo povo.
Contudo, a oposição não lhe tira o ânimo; Jesus interpreta a hostilidade dos
judeus à luz da perseguição dos profetas. A esperança não encontra desilusão e
não foi à toa que os discípulos deixaram tudo para comprar o tesouro escondido.
Por isso, nós que, à semelhança dos primeiros cristãos, descobrimos a
preciosidade de Jesus, diante do qual tudo mais se torna insignificante,
podemos dizer como eles: "Cristo é a nossa esperança".
2.2. Parusia: realização plena
de toda esperança
A espera da parusia do Senhor
começou cedo na Igreja, como podemos perceber na invocação "Maran
atha" ou "Marana tha". Esperava-se com alegria a volta de
Cristo. Graças à Sua ressurreição, temos a garantia de que também
ressuscitaremos para a vida eterna após nosso encontro pessoal com Ele na morte
(considerado como parusia pessoal) e nisto consiste a nossa esperança. Após
reconciliar a humanidade com Deus, Cristo prometeu, para a nossa felicidade,
retornar no fim da história. Contudo, os primeiros cristãos esperavam uma volta
imediata. A mentalidade dos apóstolos e primeiros discípulos levava-os a viver
numa atitude de expectativa, uma vez que havia sido criado um clima de uma
volta iminente de Cristo.
Hubert Lepargneur questiona-se
quanto à influência do "atraso" da parusia para o cristianismo
primitivo: "a correção do prognóstico foi suave e pouco sentida ou sacudiu
a fé e a boa vontade dos crentes primitivos?" Ao tentar responder seu
próprio questionamento, diz que, no caso de S. Paulo, apesar de sua crença
inicial na parusia iminente, esta não era um dogma para ele, que acabou se
conformando com o "atraso" do fim do mundo. S. Pedro, para justificar
a protelação da parusia, esperada para breve, consola os cristãos
assegurando-lhes: "diante de Deus, um só dia é como mil anos e mil anos
como um só dia. Deus não tarda a cumprir Sua promessa como alguns pensam".
No caso da espera de um fim do mundo iminente, alerta Rossé para o perigo de um
desinteresse pela existência histórica atual e pelo empenho concreto na
sociedade. O não acontecer da segunda vinda do Senhor Jesus provocou, ao invés
de uma provável crise, a ampliação do conteúdo da fé.
O tempo entre a primeira vinda
de Cristo e a sua parusia é um tempo escatológico de decisão que antecipa o já
dentro da história. Lembra Boff que há outras "parusias" de Deus na
história, as quais são sinais da sua graça como, por exemplo, o surgimento dos
santos, os concílios, a emergência da maturidade dos leigos etc. "Cristo
sempre bate à porta e vem com visitas pascais de cruz e ressurreição que nos
preparam para o encontro final". A cruz, para Moltmann, é o único motivo
suficiente para que, pela demora da parusia, não se esqueça a promessa de Jesus
sobre o reino futuro.
Mesmo mudando sua concepção,
no que diz respeito à compreensão das primeiras comunidades, a parusia
permanece como dado constitutivo da nossa fé e de relevante importância. Um
exemplo de uma nova visão do conceito de parusia encontra-se na proposta de
superação de uma concepção linear da história, onde a parusia se encontraria no
ponto terminal da mesma. A parusia dá-se no momento da ressurreição e na hora
da morte de cada homem; pela força da ressurreição de Jesus, todos os que n’Ele
crêem e morrem, participam desse final de glorificação com tudo aquilo que são.
Libânio enfatiza que o fundamento da nossa fé está na certeza da glorificação
do corpo e da história, dada pela certeza da ressurreição de Jesus; "o fim
do mundo não é a destruição da vida ou das coisas, mas a sua
glorificação".
A mensagem de Cristo, que tem
por núcleo a pregação do Reino, já se faz presente pela sua ação salvadora, mas
se manifestará plenamente na Parusia; nossa esperança na vinda do Senhor é
segura, mas como a hora e o momento são incertos, a atitude da esperança deve
ser vigilante e ativa. O crescimento do interesse pela parusia deve contribuir
para aumentar o empenho cristão nas atividades terrenas. "Não é a crise
mundial que conduz à parusia de Cristo; é a sua parusia que traz este mundo com
suas crises para uma consumação". "Onde o evangelho é ouvido e evoca
fé, a vida nasce novamente para uma viva esperança e o renascimento do mundo é
previsto (...) Deus sem o mundo e o mundo sem Deus, fé sem esperança e
esperança sem fé são os produtos da desintegração de um cristianismo sem
Cristo".
2.3. Espírito Santo: garantia
da nossa esperança
O Espírito Santo, também
chamado de Espírito da Verdade, é "a testemunha de Cristo que conduz ao
conhecimento da verdade (...) o doador da vida eterna de Deus ao mundo".
"O Espírito torna os cristãos ricos em esperança (...) a experiência do
Espírito é descrita como um renascimento para a verdadeira vida, um
renascimento pessoal que prevê o renascimento de todo o universo (...) estas
são imagens da esperança com as quais é descrita a experiência do Espírito como
a experiência de um novo começo da vida". O Espírito Santo nos foi
confiado como garantia da glória e acompanha o cristão na sua caminhada.
Fundamentada na certeza
proporcionada pela presença de Jesus ressuscitado e pelo dom do Espírito Santo,
a esperança cristã abre caminho para um futuro onde a âncora já se encontra
fixada. A presença do Espírito em nosso meio nos convida à esperança na
ressurreição. O Espírito do Ressuscitado é a força que age no fiel como
alegria, esperança, capacidade de esforço ativo e constante no conformar-se com
Cristo e prelúdio da comunhão com Ele que, no "éschaton", será plena
e definitiva.
Antes de deixar o mundo e
regressar ao Pai, Jesus promete aos Apóstolos o auxílio especial do Paráclito,
o Espírito Santo. Tratando do "primeiro Pentecostes", que define como
experiência comunitária do Espírito, Karl Rahner afirma que tal experiência
coletiva exige do cristão a responsabilidade de uma radical decisão de fé,
tomada a partir da experiência de Deus. Sem a presença vital do Espírito, a
obra e a pessoa de Jesus permaneceriam como que bloqueadas no seu passado
histórico; por meio do Espírito, que age como energia que impele para a nova
vida em Cristo, Jesus se torna presente na fé, na vida da Igreja e no mundo.
Deus, em sua misericórdia, nos
proporcionou renascer da água e do Espírito para uma viva esperança. Abordando
a recriação pelo Espírito, diz Moltmann: "esperamos que o Espírito da nova
criação derrote a violência humana e o caos do universo; mais do que isso:
esperamos que a força do tempo e da morte serão derrotadas também; finalmente,
esperamos a eterna consolação (...) esperamos alegria eterna na dança do
companheirismo com todas as criaturas e com o Deus trino".
Como diz S. Paulo, nós somos templos
do Espírito Santo, que nos ilumina e orienta em nossa caminhada terrena rumo à
meta escatológica, da qual nos permite provar antecipadamente os frutos. No que
diz respeito à salvação, nossa confiança fundada na presença operante do
Espírito de Deus nos garante contra qualquer fracasso. "Tudo podemos
naquele que nos conforta, ilumina e inflama na caridade: o divino Espírito
Santo, fiador do magistério e luz da teologia".
Terceiro Capítulo:
IGREJA, SERVA E ANUNCIADORA DA ESPERANÇA
3.1. O anúncio (kérygma ) da
esperança.
Os apóstolos, testemunhas da
ressurreição, foram chamados a difundir em toda parte o kérygma da esperança
cristã. Eles têm a missão de anunciar essa boa-nova, segundo a qual todos os
homens são chamados à salvação. As profissões de fé não deixavam de ser, a seu
modo, um anúncio da boa-nova. O elemento unificante do kérygma é a pessoa de
Jesus, identificado como Cristo e Senhor; esta proclamação da parte da Igreja
torna o evento da salvação eternamente presente. O kérygma, centralizado na
ressurreição de Jesus, abre para quem n’Ele crê um futuro de vida e de
esperança.
O tempo da Igreja é o tempo da
pregação e do testemunho. O Ressuscitado envia seu Espírito aos discípulos para
que possam compreender o testemunho das Escrituras e anunciá-lo a todas as
nações. A atuação da Igreja no mundo se realiza dentro do horizonte de sua
esperança no Reino de Deus. "A Igreja anuncia aos não crentes a mensagem
da salvação, para que todos os homens conheçam o único e verdadeiro Deus e
Aquele que enviou Jesus Cristo e se convertam de seus caminhos, fazendo
penitência". A meta da pregação cristã, no processo de justificação e
chamamento dos sem-Deus para uma viva esperança, é comunicar a ressurreição dos
mortos e a vitória da vida sobre a morte. O sucesso do anúncio do evangelho,
que leva à fé e exorta à conversão, é uma revelação do infinito poder de Deus.
A comunidade eclesial situa-se entre o "já" e o "ainda-não", entre a salvação já recebida e a salvação na esperança. Durrwell afirma que o "já" e o "ainda-não" não se opõem: "o primeiro se encontra no coração do segundo". Neste tempo de peregrinação e espera, os cristãos, que se esforçam para vencer a tentação do pecado e, assim, viver em santidade, encontram especialmente em Maria um exemplo de virtudes.
Se anunciamos a supremacia do
evento último universal, o destino da pessoa pode parecer suspenso numa
"problemática terra-de-ninguém" desde sua morte até o fim do mundo. O
discurso escatológico é a mensagem de esperança que o mundo tanto precisa e a
escatologia atual deve abrir o olhar para a dimensão transcendente sem esquecer
a realidade histórica concreta. Numa época em que as grandes utopias
fracassaram, em que há carência de respostas diante da questão do sentido da
vida e da história humana, o anúncio do Reino de Deus pode abrir novos
horizontes de esperança. O motivo último para a esperança não é o progresso
científico ou tecnológico, mas Cristo, esperança da glória. O homem, movido
pela esperança proveniente do anúncio salvífico, deve começar a abrir-se desde
já para o Reino de Deus.
Nosso mundo atual está carente
do anúncio da Palavra de Deus e, por isso, nosso papa João Paulo II lembra a
necessidade de uma nova evangelização: "existe a necessidade de um anúncio
evangélico que se faça peregrino com o homem, que se ponha a caminho com a nova
geração (...) e qual é a palavra que mais vezes ouvimos no Evangelho senão
esta: ‘Segue-me!’ Ela chama os homens de hoje, especialmente os jovens, para se
colocarem a caminho ao longo dos percursos do Evangelho na direção de um mundo
melhor".
3.2. O testemunho da esperança
(caridade).
No momento em que se constata
o avanço do mal no mundo através do egoísmo, do desejo de poder, da busca
desordenada do prazer, a esperança se fortalece com a fé e com a caridade e nos
revela o amor misericordioso de Deus. Fortalecido, o cristão é capaz de
perceber o plano de Deus na realização das pequenas esperanças do dia-a-dia. Se
não houver esperança, nossa fé corre o risco de tornar-se utopia e a caridade,
ativismo alienante.
A caridade, por sua vez, é
fundamento da Igreja, modo pelo qual ela se manifesta como presença de Deus
nesse mundo e o nosso grande desafio é tornarmo-nos imitadores de Deus, amando
como Jesus amou. Como Jesus, poderemos dar um testemunho eficaz se fizermos conhecer
aos demais homens aquele amor que nós mesmos recebemos e que agora podemos dar,
justamente porque já o recebemos. A tarefa do cristão, chamado à perfeição do
amor, compreende o dever de testemunhar esse amor de maneira perceptível. O
amor ao próximo é a principal maneira de tornar possível aos outros o encontro
com Deus.
Esperança e amor se fundem no
abandonar-se totalmente a Deus, que consiste em prestar fé absoluta no Seu
amor, crer no Seu amor sendo expressão de resposta de amor; contudo, esse abandono
confiante em Deus não nos dispensa de um esforço ativo: a esperança se traduz,
por parte do cristão, na espera paciente e perseverante, na vigilância, na
disponibilidade para arrastar cada dificuldade, até "esperar contra toda
esperança".
Lepargneur faz a ligação entre
missão e esperança dizendo que a missão se processa na esperança e esta exprime
seu dinamismo ativo na obra missionária. No parecer do Cardeal Suenens, estamos
enfrentando uma crise da virtude teologal da esperança e sabemos que, encontrando-se
abalada a esperança dos cristãos, a Igreja dificilmente terá grande ativismo
missionário. A esperança cristã não é um "consolo barato" que permite
ao cristão retirar-se do mundo, cruzar os braços e esperar o que irá acontecer
ou o que Deus irá fazer. O cristão não pode ficar passivamente esperando uma
intervenção divina milagrosa; ele precisa viver sua fé como esperança e
caridade para amar verdadeiramente o próximo e vencer os obstáculos que impedem
uma boa convivência fraternal.
É por isso que a Igreja, no
fiel cumprimento de sua missão, precisa sempre revisar suas atitudes, a fim de
evitar situações que venham impedir o bom cumprimento do seu mandato
missionário, tais como o distanciamento das massas, o não reconhecimento da
presença do Espírito em valores humanos cotidianos etc. Por exemplo, a renúncia
aos bens e ao matrimônio são dons, carismas, concedidos por Deus, não oriundos
do poder humano e com vistas
ao testemunho interpelador diante dos demais cristãos. Conseqüentemente, o cristão pode e deve viver o seu cristianismo no matrimônio, na família, na sociedade, no Estado, no trabalho e nas profissões.
ao testemunho interpelador diante dos demais cristãos. Conseqüentemente, o cristão pode e deve viver o seu cristianismo no matrimônio, na família, na sociedade, no Estado, no trabalho e nas profissões.
No que diz respeito à eficácia
do testemunho eclesial, esta é garantida pela presença do Senhor Ressuscitado
que, através do Seu Espírito, estará para sempre junto com a Sua Igreja. Neste
século, o Vaticano II foi um grande esforço que possibilitou a entrada de
"novos ares" na Igreja e, conforme está escrito na constituição
Gaudium et Spes, a Igreja não ignora o quanto recebeu da evolução da humanidade.
Embora de origem divina, a Igreja faz parte da sociedade e é dela que saem os
seus membros. Daniélou lembra que o cristão, pelo próprio fato de ser cristão,
há de procurar orientar a sociedade de acordo com a Lei de Deus. É preciso que
o cristão, encontrando coragem na esperança, seja capaz de superar os
obstáculos e, através da caridade, possa atrair as pessoas para Cristo.
Portanto, enquanto possui uma missão no mundo, não deve fugir dele nem
desprezar seus valores, sabendo distinguir o que é saudável dentre tudo aquilo
que lhe é oferecido e testemunhando a grandiosidade do amor de Deus.
3.3. A celebração da esperança
(dimensão sacramental)
A Igreja, confessando-se
pecadora, consegue ser comunidade de esperança que, sacramentalmente, realiza a
nova criação. Enquanto a esperança antevê o futuro e o Reino já presentes em
nosso meio, no bem, na comunhão, na fraternidade, na justiça, no crescimento
cultural, na abertura para com o Transcendente, ela tem motivos para celebrar e
comemorar. Surge, então, a festa como manifestação da alegria de saber que, na
eternidade, acontecerá a plena realização daquilo que de verdadeiro e bom
vivenciamos no tempo.
Desse modo compreendemos
melhor a exortação paulina aos filipenses: "Alegrai-vos sempre no
Senhor!" A nossa fé cristã nos permite saborear Deus na fragilidade humana
e festejá-lo na transitoriedade deste mundo que passa. Celebrar significa
entrar em comunhão com Deus. Através da celebração dos sacramentos da iniciação
cristã, o cristão entra na dinâmica escatológica, compreendida como posse e
esperança. O batizado é um "homem à espera", que tende para a plena
realização do que lhe foi dado inicialmente.
Alegres na esperança, devemos
nos preparar para celebrar o Jubileu do ano 2000 que está muito próximo.
"A celebração jubilar atualiza e simultaneamente antecipa a meta e o
cumprimento da vida do cristão e da Igreja em Deus uno e trino". O próprio
Papa João Paulo II quer que o ano jubilar seja exuberantemente celebrado como
uma festa de aniversário sem precedentes para Jesus. Diz ele: "cada um é
convidado a fazer tudo quanto esteja ao seu alcance para que não fique
esquecido o grande desafio do ano 2000, ao qual está seguramente ligada uma
particular graça do Senhor para a Igreja e para a humanidade inteira".
A celebração parte de
experiências humanas como o lavar, o comer etc., mas trata de eternidade e tem
como meta o agradecimento e o louvor a Deus bem como o fortalecimento dos
cristãos na caminhada rumo à "vida eterna". Cada celebração aqui na
terra é um treinamento para o culto eterno; a liturgia da história continuará a
ressoar na liturgia da eternidade. Não se discute neste ítem a validade ex
opere operato das celebrações sacramentais, as quais, feitas como a Igreja
manda, produzem por si os efeitos desejados. A questão aqui é outra: como uma
celebração pode ser vivida em termos de esperança? Sabemos que a celebração
traz o transcendente à história e, nesse sentido, é fonte de esperança.
Pedagogicamente falando, uma celebração bem preparada proporciona a todas as
pessoas que dela participam uma ocasião privilegiada de intimidade com Deus.
Para celebrarmos dignamente a
esperança é preciso que sejamos mais comunitários e menos individualistas,
servindo aos irmãos, confortando nos momentos de sofrimento, iluminando nas
ocasiões de dúvida, dando sentido à vida quando ela parece perder o sentido.
Nós, peregrinos da esperança, através do tempo, rumo à eternidade, pedimos a
Deus que atenda as nossas súplicas e agradecemos por estar sempre nos
acompanhando, tanto nos momentos alegres como nas horas difíceis, e mantendo
viva a chama da esperança até que possamos nos encontrar com Ele na pátria
celeste. Amém.
Conclusão
Tendo como objetivo abordar a
importância da esperança cristã, iniciei este trabalho mostrando que a criação
está orientada desde o princípio para a sua salvação; Deus deseja que suas
criaturas participem da plenitude da Sua vida eterna; desde o começo Ele tinha
em mente a salvação de toda a criação. Ao fundar uma aliança, Deus promete sua
presença e, com suas promessas, coloca o futuro como tempo de esperança. O
problema é que o povo eleito não cumpre com a promessa, mas, apesar de toda
infidelidade, Deus se mantém fiel. Os profetas, ao falarem de uma nova aliança,
colocam Javé como Senhor não apenas de Israel, mas de todo o mundo. Com isso, a
esperança em Israel assume um caráter escatológico, uma vez que toda a
humanidade participará na sua esperança. Movidas pela esperança de um dia estar
junto de Deus, partilhando das alegrias eternas, muitas pessoas renunciam às
suas paixões, vaidades, família e terra para se dedicar no serviço aos outros.
Compreendemos, assim, que as desesperanças deste mundo não são capazes de
arruinar a esperança do homem fortalecido em Cristo, pois a sua esperança é
muito maior do que qualquer eventual desesperança.
A mensagem de Cristo proclama
a realização de tudo o que sempre foi esperado e amplia as dimensões da
esperança para toda a humanidade. De acordo com a dinâmica do "já" e
do "ainda não", compreendida também na perspectiva do binômio
"dom e tarefa", vemos que é preciso estar aberto para acolher o que
Deus nos oferece sem se esquecer de trabalharmos pela realização do plano de
Deus em nossas vidas. Nós, cristãos, somos membros do Corpo em cuja Cabeça (Cristo)
se concretizou, embora não plenamente, o que esperamos. Fica evidente,
portanto, que, diante da grandiosidade de Jesus, tudo mais se torna
insignificante. É só Ele que importa, nada mais; Cristo é a nossa esperança.
Com relação à expectativa da parusia de Cristo, o seu não acontecer iminente
acabou provocando, ao invés de uma crise, a ampliação do conteúdo da fé. Cristo
está sempre se fazendo presente e nos preparando para o encontro final na
glória, basta olharmos os acontecimentos sob o prisma da fé. Nesse caso, a atitude
do cristão deve ser ativa e vigilante para que Jesus não passe despercebido na
sua vida. Por meio do Espírito Santo, que nos ilumina e orienta nossa
caminhada, Jesus se torna presente na fé, na vida da Igreja e no mundo.
O anúncio da salvação,
centralizado na ressurreição de Jesus, abre para o crente um futuro de vida e
de esperança. Numa época de carência da Palavra de Deus, em que faltam
respostas para a questão do sentido da vida e da história, o kérygma abre novos
horizontes de esperança. O homem, impulsionado pela esperança proveniente do
anúncio salvífico, tende a esforçar-se pela causa do Reino de Deus. Nosso
grande desafio é tornarmo-nos imitadores de Deus, amando como Jesus amou; não
podemos ficar passivamente esperando uma intervenção da parte de Deus e sim
vivermos nossa fé como esperança e caridade para amar verdadeiramente o próximo
e vencer os obstáculos que impedem uma boa convivência fraternal. Encontrando
coragem na esperança, devemos ser capazes de superar os obstáculos e, através
da prática da caridade, atrairmos as pessoas para Cristo. A celebração, por sua
vez, enquanto traz o transcende para a história, é fonte de esperança e pode
proporcionar uma ocasião privilegiada de intimidade com Deus. E, para
celebrarmos dignamente a esperança, é preciso sermos mais comunitários e menos
individualistas, servindo aos irmãos, iluminando, confortando e dando sentido à
vida. Agradecemos, enfim, a Deus por nos acompanhar sempre e manter viva nossa
esperança até que possamos desfrutar das alegrias eternas junto d’Ele.
Walter
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