A Esperança
Escatológica Jorge Pinheiro
I -- Que
princípios norteiam a pesquisa teológica?
A) O princípio arquitetônico > revelação = base e eixo da teologia > fé
objetiva.
B) O princípio hermenêutico > interpretação dos aspectos históricos da
salvação = produto da razão. Da razão ordinária, que é a universalidade do
senso comum; da razão filosófica, que produz ordenação; e da razão científica,
ligada aos fenômenos.
A utilização
de tais princípios possibilitam diferentes versões da revelação. Por que?
Porque o princípio arquitetônico depende do que colocamos como base da
estruturação geral de nosso estudo: a graça e a fé, no caso de Lutero; a
soberania de Deus, no caso de Calvino; ou o amor, a justiça, a liberdade, etc.?
E porque o
princípio hermenêutico depende do uso de uma ou de várias das múltiplas visões
filosóficas que podem ser utilizadas como instrumento de interpretação da
história da salvação. É por isso que se diz: a ideologia define a hermenêutica.
Aqui reside a dificuldade. A revelação é universal e plena, mas toda teologia é
transitória, pois reflete um momento de compreensão da revelação e da história
da salvação.
II --
Jürgen Moltmann, teólogo da esperança
Depois
de uma criativa ruptura com a modernidade, enquanto pensamento, tradição e
história, é necessário sentir de novo a alegria da esperança escatológica, para
compreender a natureza do terreno sobre o qual pisamos.
Há um momento de cisão no qual modificou-se, de modo essencial, a concepção do
que significa teologia. Esse momento foi assinalado a partir dos anos 60 com a
teologia da esperança, de Jürgen Moltmann.
Trata-se de uma reflexão prodigiosamente profética, pois enuncia, não somente a
queda do muro de Berlim, mas o processo de aglutinação vivido por alemães, em
primeiro lugar, por europeus, na seqüência, e agora muito possivelmente por
parte da humanidade. É sem dúvida, uma das elaborações mais impressionantes, se
entendermos sua abordagem epistemológica. Sugere um campo normativo, a ser
percorrido pelos movimentos e comunidades que abririam aguerridamente, a golpes
de machado, a senda pós-moderna.
A expressão abordagem epistemológica não é exagerada. Conforme, Bachelard,
"os filósofos justamente conscientes do poder de coordenação das funções
espirituais consideram suficiente uma mediação deste pensamento coordenado, sem
se preocupar muito com o pluralismo e a variedade dos fatos (...). Não se é
filósofo se não se tomar consciência, num determinado momento da reflexão, da
coerência e da unidade do pensamento, se não se formularem as condições de
síntese do saber. E é sempre em função desta unidade, desta síntese, que o
filósofo coloca o problema geral do conhecimento". G. Bachelard, Filosofia
do Novo Espírito Científico, Lisboa, Presença, 1972, pp. 8-9.
Assim,
abordagem epistemológica, aqui utilizada, refere-se ao projeto teológico, de
herdadas estruturas hegelianas e marxistas, relidas e traduzidas por ele e
Ernest Bloch. É sobre a questão da identidade histórica, entendida como
processo a realizar-se, que recai a crítica da teologia realizada por Moltmann.
Usando a leitura de Roberto Machado, diríamos com ele que "a história
arqueológica nem é evolutiva, nem retrospectiva, nem mesmo recorrente; ela é
epistêmica; nem postula a existência de um progresso contínuo, nem de um
progresso descontínuo; pensa a descontinuidade neutralizando a questão do
progresso, o que é possível na medida em que abole a atualidade da ciência como
critério de um saber do passado". Roberto Machado, Ciência e saber. A
trajetória arqueológica de Foucault, Rio de Janeiro, Graal, 1982, p. 152.
É justamente
a experiência de viver, enquanto comunidade que se realiza no futuro, que é
realçada por Moltmann. No nível antropológico, trabalha os elementos dessa
esperança, a partir da qual se produz saber e praxis cristã. Suas heranças são
translúcidas:
"Por
meio de subverter e demolir todas as barreiras -- sejam da religião, da raça,
da educação, ou da classe -- a comunidade dos cristãos comprova que é a
comunidade de Cristo. Esta, na realidade, poderia tornar-se a nova marca
identificadora da igreja no mundo, por ser composta, não de homens iguais e de
mentalidade igual, mas, sim, de homens dessemelhantes, e, na realidade,
daqueles que tinham sido inimigos... O caminho para este alvo de uma nova
comunidade humanista que envolve todas as nações e línguas é, porém, um caminho
revolucionário". Jürgen Moltmann,
"God in Revolution", em Religion, Revolution and the Future, NY,
Scribner, 1969, p. 141.
Como num
laboratório, o teólogo da esperança extrai o fato teológico de sua contingência
histórica, tratada sob condições de extrema pureza escatológica. Muito
claramente afirma a escatologia como essência da história da redenção e leva à
conclusão de que essa mesma essência seja a expressão maior da ressurreição,
enquanto metáfora da cruz de Cristo. Essa cruz repousa sobre o esvaziamento da
desesperança, enquanto praesumptio e desperatio, na relação que mantém com o
mundo.
A teologia,
vida cristã em movimento, numa permanente autoformação, advém das pulsações
criadoras da própria esperança, cujo sentido volta-se para ela própria. Essa
construção, que se nos apresenta como caleidoscópio, belo, mas aparentemente
ilógico, traz em si a força combinatória do devir cristão. Assim, a teologia de
Moltmann quebra os grilhões do presente eterno da neo-ortodoxia, e nos oferece
um conceito realista da história, que tem por base um futuro real, lançando
dessa maneira as bases para uma teologia que responda às reais necessidades do
homem pós-moderno.
"O
passado e o futuro não estão dissolvidos num presente eterno. A realidade
contém mais do que o presente. Ao desenvolver sua teologia futurista, Moltmann
realmente tem o peso considerável da história bíblica do lado dele, e faz bom
uso dela. (...) Ao enfatizar o futuro, desenvolveu um pensamento bíblico
legítimo que jazia profundamente enterrado na teologia ética e existencial dos
séculos XIX e XX". Stanley Gundry, Teologia Contemporânea, SP, Mundo
Cristão, 1987, p.167.
A teologia
de Moltmann nasce enquanto reação ao existencialismo e absorção do revisionismo
de Bloch. A descontrução do marxismo, realizada por esse filósofo, não agradou
ao mundo comunista, mas estabeleceu uma ponte, diferente daquela da teologia da
libertação, entre o hegelianismo de esquerda e o cristianismo. Substituiu a dialética
pelo ainda-não, enquanto espaço que não está fechado diante de nós, e definiu
uma antropologia que não mais está calcada no império dos fenômenos econômicos,
mas na esperança.
Os escritos
filosóficos do jovem Marx serviram de ponto de partida para o vôo de Bloch. A
alienação do homem é um fato inquestionável, não como determinação econômica,
mas enquanto determinação ontológica. Afinal, o universo em que vive é
essencialmente incompleto. Mas a importância do incompleto é que é suceptível
de complemento. Por isso, o possível, o ainda-não, o futuro traduz de fato a
realidade.
Nesse
processo estão presentes a subjetividade humana e sua potência inacabada e
permanente em busca de solução e a mutabilidade do mundo no quadro de suas
leis. Dessa maneira, o ainda-não do subjetivo e do objetivo é a matriz da
esperança e da utopia. A esperança traduz a
certeza da busca e a utopia nos dá as figuras concretas desse possível.
Para Bloch,
o homem é impelido, assim, ao esforço permanente de transcender a alienação presente,
em busca de uma ‘pátria de identidade'. É no ‘vermelho quente' do futuro que
está a razão fundamental da existência humana.
Nenhum
marxista chegou tão próximo da escatologia cristã!
"Deus
-- enquanto problema do radicalmente novo, do absoluto libertador, do fenômeno
da nossa liberdade e do nosso verdadeiro conteúdo -- torna-senos presente
somente como um evento opaco, não objetivo, somente como conjunto da
obscuridade do omomento vivido e do símbolo não acabado da questão suprema. O
que significa que o Deus supremo, verdadeiro, desconhecido, superior a todas as
outras divindades, revelador de todo o nosso ser, ‘vive' desde já, embora ainda
não coroado, ainda não objetivado (...) Aparece claro e seguro agora que a
esperança é exatamente aquilo em que o elemento obscuro vem à luz. Ela também
imerge no elemento obscuro e participa da sua invisibilidade. E como o obscuro
e o misterioso estão sempre unidos, a esperança ameaça desaparecer quando
alguém se avizinha muito dela ou põe em discussão, de modo muito presunçoso,
este elemento obscuro". Ernst Bloch, Geist der Utopie, Franckfurt, 1964,
p. 254 in Battista Mondin, Curso de Filosofia, São Paulo, Paulinas, 1987, vl.
3, pp. 246-7.
Bloch
realiza uma penetrante releitura da cosmovisão judaico-cristã. Entende o clamor
profético do mundo bíblico e da proclamação cristã não como alienação e ópio,
mas como fermentos explosivos de esperança, protestos contra o presente em nome
da realidade futuro, a utopia.
Talvez por
isso possamos dizer que nos anos 60, os caminhos de Moltmann e Bloch não apenas
cruzaram-se na universidade de Tübingen, mas abriram espaço para o mais
enriquecedor diálogo cristão-marxista que conhecemos.
É
interessante lembrar que em 1968, quando manifestações estudantis varriam
Tübingen, Heidelberg, Münster e Berlim Ocidental, grande parte dos líderes
estudantis eram oriundos das faculdades de teologia. Sua Theologie der Hoffnung
(Jürgen Moltmann, Teologia della Speranza, Queriniana, Bréscia, 1969),
publicada no início da década na Alemanha, estava na oitava edição, e no ano
seguinte, ele lançaria Religion, Revolution and the Future nos Estados Unidos.
Agora, a
partir da escatologia da esperança de Jürgen Moltmann apresentamos um rápido
esboço de sermão que tem por base o texto de Apocalipse 22.6-21.
III --
Fiel é a Palavra
Introdução
1. No Apocalipse, o futuro define o presente.
O Apocalipse inverte a nossa noção de tempo. O futuro modela e estrutura o
presente.
2. Saber
como a história termina nos ajuda a entender como devemos nos encaixar nela,
agora. Por isso, já estamos vivendo os últimos dias.
3. As visões
de João mostram a realidade do juízo divino, quando cada um de nós dará conta
de sua existência diante de Deus. Deus recompensará aqueles que, às vezes, ao
custo de sua própria vida "guardaram as palavras da profecia deste
livro".
4. Profecia
é proclamação da Palavra de Deus. E no Novo Testamento é proclamação das boas
novas.
Três blocos
de textos
10 bloco
Vers. 6 > As palavras são fiéis e verdadeiras.
Vers. 7 > É feliz quem guarda as palavras daquilo que é proclamado
(profecia) neste livro.
20 bloco
Vers. 10 > Não feche este livro. O futuro é hoje.
Vers. 11 e 12 > O futuro deve definir o que você faz. E você dará conta
disso. E receberá o troco.
30 bloco
O que Cristo diz àqueles que obedecem às palavras desse livro?
Vers. 18 > Quem acrescentar = sofrerá os flagelos
Vers. 19 > Quem tirar = fica fora. Sem acesso à árvore da vida, fora da
cidade santa e sem as benções prometidas no livro.
Conclusão
A Palavra é fiel
Vers. 20 > Jesus, a Palavra que reina, garante: Estou chegando!
Nenhum comentário:
Postar um comentário