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terça-feira, 13 de outubro de 2020

SERMÕES 151 - ABRAÃO: UMA FÉ RACIONAL ALÉM DA RAZÃO

 

VIVENDO EPIFANIAS

               ABRAÃO: UMA FÉ RACIONAL ALÉM DA RAZÃO

        

O teólogo dinamarquês Kierkgaard em seu livro “Temor e Tremor” diz que a fé em Deus muitas vezes transcendia qualquer tipo de racionalidade. Isso é facilmente provado quando pensamos que a fé dividiu as águas do Mar Vermelho, assim como dividiu as águas do rio Jordão, fazendo com que milhares de pessoas atravessassem entre as águas sem molharem seus pés. O que dizermos das muralhas de Jericó que desabaram sem que ninguém lançasse sobre elas pedra alguma. Ou ainda dos três jovens que foram lançados na fornalha ardente e saíram sem nenhuma queimadura. Não podemos deixar de fora o evento em que Jesus andou sobre as águas, ou quando curou cegos, paralíticos e ressuscitou mortos com apenas uma palavra. Todos estes milagres transcendem qualquer tipo de racionalidade.

Entretanto acredito que a disposição de Abraão em sacrificar seu filho Isaque, após uma experiência de epifania, ultrapassa todos os limites da racionalidade. Por isso creio que Abraão possuía uma fé racional além da razão. Ele era dotado de uma fé racional, uma fé sustentada em sua relação com um Deus que falava com ele de uma forma extraordinária. A realidade de falar com Deus por si só já era suficiente para leva-lo a crer em realizações além da razão. Afinal ele falava com Deus de uma forma que seus sentidos humanos não podiam negar.

Todos os outros eventos bíblicos milagrosos, penso eu, não exigiram de seus autores tamanho sacrifício. A grandeza do sacrifício de Abraão só pode ser comparada com a grandeza do sacrifício de Deus Pai que entregou seu Filho, Jesus Cristo, para ser sacrificado numa cruz por nós pecadores, e a grandeza do próprio Senhor Jesus que voluntariamente se ofereceu por nós como sacrifício. Ainda assim, a entrega de Abraão está numa proporção muito menor que a de Deus Pai e a do Senhor Jesus, pois o amor de Abraão por maior que seja por Isaque, não se compara com o amor existente na relação entre o Pai Celestial e Jesus, seu Filho.

Para que possamos compreender essa fé racional além da razão vamos ler a epifania vivida por Abraão em Gênesis 22.1-14.

1 Passado algum tempo, Deus pôs Abraão à prova, dizendo-lhe: "Abraão!" Ele respondeu: "Eis-me aqui". 2 Então disse Deus: "Tome seu filho, seu único filho, Isaque, a quem você ama, e vá para a região de Moriá. Sacrifique-o ali como holocausto num dos montes que lhe indicarei". 3 Na manhã seguinte, Abraão levantou-se e preparou o seu jumento. Levou consigo dois de seus servos e Isaque seu filho. Depois de cortar lenha para o holocausto, partiu em direção ao lugar que Deus lhe havia indicado. 4 No terceiro dia de viagem, Abraão olhou e viu o lugar ao longe. 5 Disse ele a seus servos: "Fiquem aqui com o jumento enquanto eu e o rapaz vamos até lá. Depois de adorarmos, voltaremos". 6 Abraão pegou a lenha para o holocausto e a colocou nos ombros de seu filho Isaque, e ele mesmo levou as brasas para o fogo, e a faca. E caminhando os dois juntos, 7 Isaque disse a seu pai Abraão: "Meu pai! " "Sim, meu filho", respondeu Abraão. Isaque perguntou: "As brasas e a lenha estão aqui, mas onde está o cordeiro para o holocausto?" 8 Respondeu Abraão: "Deus mesmo há de prover o cordeiro para o holocausto, meu filho". E os dois continuaram a caminhar juntos. 9 Quando chegaram ao lugar que Deus lhe havia indicado, Abraão construiu um altar e sobre ele arrumou a lenha. Amarrou seu filho Isaque e o colocou sobre o altar, em cima da lenha. 10 Então estendeu a mão e pegou a faca para sacrificar seu filho. 11 Mas o Anjo do Senhor o chamou do céu: "Abraão! Abraão!" "Eis-me aqui", respondeu ele. 12 "Não toque no rapaz", disse o Anjo. "Não lhe faça nada. Agora sei que você teme a Deus, porque não me negou seu filho, o seu único filho". 13 Abraão ergueu os olhos e viu um carneiro preso pelos chifres num arbusto. Foi lá, pegou-o e sacrificou-o como holocausto em lugar de seu filho. 14 Abraão deu àquele lugar o nome de "O Senhor proverá". Por isso até hoje se diz: "No monte do Senhor se proverá". (Gênesis 22.1-14)

         Quando falamos de epifanias, de visitações extraordinárias de Deus em nossa história, estamos falando de visitações onde percebemos claramente o agir de Deus. Entretanto estas epifanias sempre têm um propósito. Vejamos o que diz Gênesis 22.1.

 

1 – AS EPIFANIAS E SEUS PROPÓSITOS

1 Passado algum tempo, Deus pôs Abraão à prova, [...]". (Gênesis 22.1)

Eu gostaria de destacar as palavras: “Deus pôs Abraão à prova”. Somos tendenciosos a pensar que Deus nos visita de forma extraordinária somente para realizar nossas vontades, para prover a nós vitórias sobre as lutas e adversidades que este mundo dominado pelo maligno impõe sobre nós. Contudo este texto no mostra que a epifania vivenciada por Abraão não veio com o fim de trazer a ele nenhuma vitória, mas de colocá-lo a prova.

Moisés viveu uma epifania no monte Horebe, conforme relata o livro de Êxodo, capítulo três. Ele estava pastoreando o rebanho do seu sogro Jetro, quando viu uma sarça ardendo em chamas, mas sem ser consumida pelo fogo, de onde o anjo do Senhor lhe apareceu e lhe convocou para uma missão, uma tarefa para ser realizada.

O apóstolo Paulo também viveu uma epifania com Deus onde sua vontade precisou se dobrar diante a vontade de Deus. Paulo havia vivido uma grande epifania, uma visitação de Deus, que o levou arrebatado ao paraíso. Com o fim de conter uma possível soberba, Deus permite que um espinho na carne, um mensageiro de Satanás, o atormentasse. Não se sabe ao certo que espinho era esse, contudo após ter orado por três vezes pedindo a Deus que retirasse esse espinho, ele é visitado por Deus e recebe uma resposta negativa da parte de Deus, um não, conforme podemos ler 2 Coríntios 12.9a:

9a Mas ele me disse: “Minha graça é suficiente para você, pois o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza”. (2 Coríntios 12.9a) 

Deus pode nos visitar além do ordinário que estamos acostumados, mas suas visitações extraordinárias sempre tem um propósito. Este propósito pode variar, pode ser para conceder a você vitória desejada, mas também pode ser para te colocar a prova, para te convocar para uma missão, ou ainda, com o fim de tornar claro a você que Ele não fará o que lhe pediu.

Abraão, diz o texto, é visitado por Deus e colocado à prova. Vejamos a prova de Abraão.

 

2 – A PROVA DE ABRAÃO

2 Então disse Deus: "Tome seu filho, seu único filho, Isaque, a quem você ama, e vá para a região de Moriá. Sacrifique-o ali como holocausto num dos montes que lhe indicarei". (Gênesis 22.2)

Não sei como Deus falou com Abraão, mas gosto de imaginar ele ouvindo Deus como mostra os filmes bíblicos.

  Veja a cena desta epifania mostrada por este filme. Seria legal se Deus falasse conosco dessa forma, não seria?

Quando chegamos a este momento da vida de Abraão, em que Deus o coloca à prova, ele já havia experimentado diversas epifanias com Deus. Em sua primeira experiência de epifania ele recebeu promessas de Deus e um grande desafio que falamos no domingo passado. Em Gênesis no capítulo quinze e dezessete encontramos Deus reafirmando sua promessa a Abraão.

Conforme vimos no último domingo, Abraão se lançou numa jornada de fé, confiando plenamente nas promessas de Deus. Ao longo dessa jornada ele foi experimentando diversos tipos de adversidades, enfrentou diversos inimigos, caminhou por desertos, teve que abrir poços para encontrar água, mas sempre foi sendo favorecido por Deus de forma a superar todas as dificuldades. Abraão enfrentou tudo guardando no coração a promessa de que Deus o faria pai de muitos e de uma grande nação.

Deus prove em sua velhice um filho, Isaque, por meio de quem ele acreditava firmemente que Deus cumpriria sua promessa de fazê-lo pai de muitos e de uma grande nação. Contudo agora Deus vem e lhe pede para sacrificar Isaque.

Quando nos deparamos com este texto nos sentimos meio incomodados com a realidade de Deus estar pedindo para Abraão sacrificar seu filho. Contudo precisamos ressaltar que Deus estava de fato mostrando a Abraão o que estava disposto a fazer pela humanidade.

Isaque, o filho amado, era uma representação de Jesus Cristo, que seria sacrificado na cruz. Pelo que nos parece, Deus, não tinha a intenção de sacrificar a Isaque, mas apenas de fazer prova do amor e da fidelidade de Abraão.

Com certeza essa prova foi a maior luta que Abraão enfrentou em sua vida. Deus estava pedindo a ele o seu tudo. Isaque representava a promessa de Deus para sua vida. Seus sonhos de se tornar pai de muitos e de uma grande nação, gerados pelo próprio Deus, estava depositado em Isaque. Mas Isaque também era o filho a quem ele muito amava, o único filho gerado por Sara sua mulher, conforme Deus havia prometido.

Imagina o conflito na alma de Abraão. As muitas perguntas que podem ter passado por sua mente. Lembro que ele levou três dias para chegar ao monte do sacrifício em Moriá. Tempo para pensar muitas coisas. Será que Deus está desistindo de seus projetos em minha vida? Onde eu falhei com Deus para ele retirar de mim a sua bênção? Por que Deus está pedindo Isaque, o filho que Ele me prometeu? Devo sacrificar Isaque?  

Não existia uma resposta que trouxesse paz a Abraão. Se eu recusar sacrificar meu filho, me sentirei culpado e fracassado diante de Deus. Se eu sacrificar meu filho, me sentirei culpado por tê-lo matado e não o devolvido com vida a sua mãe. Parece que não tinha saída para ele, todos os caminhos pareciam de morte, levavam ao inferno, a um viver agonizante.

Abraão não tinha consciência de que o que estava fazendo era uma representação do que Deus faria por ele e por toda humanidade. Embora possivelmente essa tenha sido sua maior luta, ela não é travada com o inferno que nos atormenta exteriormente, mas com o inferno que nos atormenta interiormente. Deus é realmente Deus para mim ou não? Essa prova exigia dele uma fé racional além da razão.

Ele precisava se lançar inteiramente, estamos falando agora de uma entrega completa do seu coração, de todos os sonhos, do que lhe era mais precioso na vida. A entrega de Isaque significava também a entrega de seu casamento. Voltar sem Isaque seria possivelmente receber de Sara todo seu desprezo. Era a entrega de tudo que lhe dava prazer, sem Isaque a vida seria sem sentido. Abraão estava sendo desafiado a entregar tudo, tudo a Deus.

Durante toda sua peregrinação, Deus se revelou confiável e só restavam duas opções a Abraão, romper com Deus ou se render a Ele. O que Deus estava perguntando para Abraão através desta prova era: “Abraão você está disposto a me amar acima de tudo?”, “Você está disposto a me amar mesmo que eu tire de você Isaque?”, “Você está disposto a me amar mesmo que eu tire de você os sonhos que te prometi?”, “Você vai continuar me amando mesmo que eu faça com sua vida o que eu bem quiser?”.

A resposta de Abraão para Deus foi “sim”. Ele acordou cedo e foi para o lugar do sacrifício. Essa foi a forma dele dizer a Deus: “Eu irei continuar te amando Deus, mesmo que me tire tudo. Que tire minha esposa, meu filho, meus sonhos, meus negócios, o Senhor continuará sendo o meu Deus”.

Parece que Abraão conseguiu compreender que ter tudo, mas não ter Deus, é não ter nada. Por outro lado, não ter nada e ter Deus, é ter tudo. Ao escolher Deus, Abraão escolheu a esperança, pois onde Deus está o inferno é vencido, a morte é vencida, a esperança e a vida reinam. Onde Deus está a ordem reina, o caos desaparece, o paraíso se torna presente.

E você está pronto a entregar seu Isaque a Deus? A entregar tudo a Deus? Você continuará amando a Deus se Ele não responder mais suas orações? Se Ele retirar de você sua bênção? Se Ele permitir que você seja jogado aos leões como foram os cristãos no passado? Se Ele deixar você ser pregado numa cruz como foram os cristãos no passado?

Mas o surpreendente desta história ainda está por vir. Abraão não só disse sim, como creu que Deus tinha todo o poder para fazer o que estava além da razão. Abraão demonstrou uma fé racional além da razão.

 

3 – UMA FÉ RACIONAL ALÉM DA RAZÃO

4 No terceiro dia de viagem, Abraão olhou e viu o lugar ao longe. 5 Disse ele a seus servos: "Fiquem aqui com o jumento enquanto eu e o rapaz vamos até lá. Depois de adorarmos, voltaremos". (Gênesis 22.4,5)

Veja a afirmação de Abraão aos seus servos: “voltaremos”. Ele tinha certeza que voltaria com Isaque. Ele está subindo o monte para sacrificar Isaque, mas tinha certeza que voltaria com ele. Veja o que escreveu o autor do livro de Hebreus sobre isso (Hb 11.19).

19 Abraão levou em conta que Deus pode ressuscitar os mortos; e, figuradamente, recebeu Isaque de volta dentre os mortos. (Hebreus 11.19)

Preste atenção no que diz o texto: “Abraão levou em conta que Deus pode ressuscitar os mortos”. Ele havia vivido epifanias que o fizeram crer num Deus presente em sua história.

Abraão sabia que Deus era real e que lhe havia prometido um descendente e que através deste descendente abençoaria todas as famílias da terra e faria dele uma grande nação.

Agarrado a essa promessa e a realidade das experiências já vividas com Deus, Abraão não hesitou em subir o monte e sacrificar seu filho, porque sabia que se Deus o fez gerar um filho quando já não era possível, Ele poderia trazê-lo da morte.

Mas só ousa levantar o cutelo e entregar o seu bem mais precioso, o Isaque de sua vida, aquele que está disposto a perder sua vida nas mãos desse Deus. Esse é o paradoxo da fé cristã. Quem perde a vida para Deus ganha; quem retém a vida para si mesmo a perde.

Você está disposto a perder sua vida para Deus? (Mateus 16.24,25):

24 Jesus disse aos seus discípulos: "Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. 25 Pois quem quiser salvar a sua vida, a perderá, mas quem perder a vida por minha causa, a encontrará”. (Mateus 16.24,25)

Negar a si mesmo e seguir a Jesus é um ato de fé racional. Não é se jogar no escuro, no desconhecido. Pelo contrário! É se entregar a um Deus que vem se revelando aos homens ao longo da história, por meio de diversas epifanias, e que tem seu ápice epifânico na encarnação do Filho, Jesus Cristo, e hoje fala conosco por meio do seu Espírito e de Sua Palavra (a Bíblia).

Mas essa fé racional nos chama a crer além da razão, pois o Deus da Bíblia, o Deus que se fez homem é Deus que não conhece a palavra impossível, é Deus que não sabe o que é derrota. Ele venceu o pecado, o diabo e a morte.

Jesus te chama para ser mais que vencedor por meio dele. Ele te chama para viver a vida além da razão, a transcender este tempo, a não estar preso às coisas temporais. Jesus te chama para viver olhando para a eternidade, juntando tesouros nos céus, a caminhar neste mundo como peregrino, sabendo que os sofrimentos deste mundo nada são diante a glória que há de se manifestar.

Jesus não nos tirou do mundo infernal, cheio de maldades, não nos prometeu o paraíso para o agora, não nos prometeu isenção das dores e de toda maldade deste mundo; contudo prometeu estar conosco todos os dias, nos ajudando a suportar e a vencermos todas as lutas que este mundo tenebroso impõe sobre nós.

A nossa vitória hoje não está na derrota do inimigo, nem no milagre alcançado neste mundo presente. Ver o milagre na vida do Théo, filho do Pr. Décio e da Stella, ver o milagre na vida da Raissa, filha do Rafael e da Rosana é maravilhoso! É experimentarmos uma epifania como igreja. O milagre realizado na vida dessas crianças são milagres para nós também, não somente para os pais. Contudo essas são vitórias temporais. A nossa verdadeira vitória está em permanecermos firmes na fé em Jesus Cristo, apesar de todo inferno que nos cerca neste mundo. A nossa verdadeira vitória está em continuarmos acreditando como Abraão, mesmo morrendo, Deus nos ressuscitará dos mortos e viveremos no novo céu e na nova terra para todo o sempre. A verdadeira vitória pertence àqueles que possuem uma fé racional em Jesus Cristo além da razão.

 

REFLEXÃO FINAL

Creio que Deus está falando com você agora e que falou com você durante toda essa mensagem. Esse é o seu momento de epifania, não duvide disso. Deus apresenta a você dois desafios através desta palavra:

1.     Ele quer que você entregue seu Isaque, aquilo que possui o seu coração. Seus sonhos? Sua carreira profissional? Seu casamento? Seus filhos? Seus netos? Deus quer que você entregue no altar tudo a Ele hoje.  Ele quer saber se realmente Ele é Deus para você.

2.     Ele quer que você confie Nele como Abraão confiou, mesmo vivendo no inferno. Deus busca pessoas que creiam Nele além da razão. Crer além da razão é deixar o controle da vida, é abandonar a existência da impossibilidade e confiar na sabedoria Daquele que tem todo o poder nas mãos, aceitando toda e qualquer decisão por Ele tomada. Sem fé é impossível agradar a Deus.

 

Pr. Cornélio Póvoa de Oliveira

11/10/2020

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