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segunda-feira, 30 de novembro de 2020

SERMÕES 158 - SOLA SCRIPTURA (Somente as Escrituras)

 

IDENTIDADE 2020

SOLA SCRIPTURA (Somente as Escrituras)

 

Hoje em nossa série Identidade 2020 iremos tratar do tema “Sola Scriptura”. O lema Sola Scriptura” ou “Somente as Escrituras” é a afirmação do reconhecimento da inspiração, autoridade, suficiência, infalibilidade e inerrância das Escrituras. Diante estas afirmações a respeito das Escrituras, isto é, da Bíblia os reformadores passaram a defender que somente a Bíblia possuía autoridade como regra de fé e prática para a vida da Igreja e de seus membros.

Os reformadores no século XVI acreditavam que a autoridade das Escrituras não dependia da validação de qualquer homem, nem mesmo da validação da igreja institucional. Em outras palavras, os reformadores estavam dizendo que não era o testemunho de um homem, o Papa, nem as tradições e nem o testemunho de uma igreja, os concílios, que validavam as Escrituras, mas unicamente o testemunho do próprio Deus.

Esse conceito contrastava diretamente com a teologia da Igreja Medieval. Naquela época a autoridade papal, a tradição e as formulações dos concílios possuíam autoridade equiparável às Escrituras. Mesmo sendo perseguidos, considerados hereges pela Igreja Medieval, os reformadores continuaram afirmando que somente a Bíblia possuía autoridade como regra de fé e prática, por ser ela a revelação especial de Deus e de sua vontade ao homem.

Partindo do pressuposto de que somente as Escrituras, que hoje chamamos de Bíblia, é a única regra de fé e prática para a Igreja e seus membros, gostaria de fazer uma reflexão primeiro para compreendermos a dimensão do termo “As Escrituras” no contexto do Novo Testamento.

 

1 – A DIMENSÃO DO TERMO “AS ESCRITURAS” NO N.T.

O apóstolo Paulo escrevendo a Timóteo faz a seguinte afirmação a respeito da Bíblia.

16 Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, 17 para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra. (2 Timóteo 3.16,17)

Paulo diz a Timóteo “Toda a Escritura é inspirada por Deus...”. A quais textos da Bíblia Paulo está se referindo exatamente quando diz “Toda a Escritura”? Estaria Paulo se referindo a toda a Bíblia como a conhecemos?

A Bíblia como nós a conhecemos hoje só foi concluída por volta do ano 400 depois de Cristo. O Antigo Testamento já havia sido concluído aproximadamente 450 anos antes de Cristo, mas os Evangelhos e as Cartas Bíblicas foram escritos entre os anos 40 e 100 depois de Cristo. Por um longo período partes dos Evangelhos e das Cartas Bíblicas circularam pelas igrejas até serem reunidas e organizadas no século IV no Concílio de Nicéia, onde se estabeleceu a ordem dos livros como ainda hoje é conservada.

Quando Paulo diz “Toda a Escritura” ao jovem pastor Timóteo ele estava se referindo aos livros do Velho Testamento. Paulo, assim também Pedro, João, Tiago certamente não imaginavam que suas cartas seriam reconhecidas como inspiradas por Deus e que iriam se tornar parte das Escrituras.

Nos dias de Jesus e dos apóstolos somente o Velho Testamento era considerado inspirado por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, correção e instrução na justiça.

Pastor, o senhor está dizendo que o Novo Testamento não é inspirado? De forma nenhuma. O que estou dizendo é que o Novo Testamento é o Velho Testamento lido através da ótica da cruz, portanto é o Velho Testamento atualizado e revisado pela cruz. Por isso podemos afirmar como Paulo e estender sua afirmação também ao Novo Testamento - “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra” (2 Tm 3.16,17).

Inspirados por essa verdade, os reformadores concluíram que somente as Escrituras, Velho e Novo Testamento possuíam autoridade para determinar qualquer regra de fé e prática para a vida da Igreja e de seus membros.

Contudo acredito que as igrejas aos poucos abandonaram a Bíblia como única regra de fé e prática. Vou pontuar duas causas que promoveram este abandono no me entender.

·         PRIMEIRA CAUSA: A Não Separação da Igreja Espiritual da Igreja CNPJ

·         SEGUNDA CAUSA: As Distorções Teológicas

 

PRIMEIRA CAUSA: A Não Separação da Igreja Espiritual da Igreja CNPJ

Ao longo dos meus 20 anos de pastorado tenho observado esta dificuldade e visto muitos irmãos sofrerem pela incapacidade de fazermos a separação destas duas igrejas. A igreja estrutural e a igreja pessoas (vidas).

Jesus Cristo não estabeleceu uma igreja com CNPJ. Jesus não ordenou que construíssemos templos e nos organizássemos ao redor deles. Tampouco os apóstolos nos ordenou que construíssemos templos e nos organizássemos ao redor deles. Todo ensino de Jesus e dos apóstolos a respeito da igreja e de seu funcionamento foi transmitido na perspectiva de construirmos uma igreja espiritual, viva, dinâmica, constituída e organizada na unidade do Espírito e não de uma igreja física, constituída através de um CNPJ e organizada por meio de seus estatutos e regimentos internos.

A Bíblia não diz para construirmos templos, mas também não diz que não podemos construir templos. Os templos em si não são mal para a vida da igreja, pelo contrário podem ser grandes facilitadores para o cumprimento de nossa missão. Contudo quando líderes e liderados, pastores e membros não conseguem discernir a diferença entre a igreja espiritual da igreja CNPJ correm o risco de amarem a igreja CNPJ e rejeitarem a igreja espiritual, de servirem a igreja CNPJ e abandonarem a igreja espiritual, errando completamente o alvo proposto por Jesus Cristo.  

Quero apresentar dois problemas quando não fazemos a separação da igreja espiritual da igreja CNPJ.

 

·      O Primeiro Problema: Ocorre quando deixamos que a igreja CNPJ que está sujeita as leis dos homens determinem nossas decisões como igreja, aprisionando através de seus estatutos a liberdade do Espírito Santo, dessa forma atrapalhando e impedindo que a igreja espiritual se desenvolva no vínculo da paz promovido pelo Espírito de Deus. Quando isso ocorre certamente a Bíblia já não é a única regra de fé e prática desta igreja. Os estatutos, os regimentos internos e seus parágrafos falam mais alto do que a Bíblia, se tornando como a Lei de Moisés que impedia os judeus de experimentarem a liberdade do Espírito, verdade esta ensinada pelo apóstolo Paulo em sua segunda carta aos Coríntios (2 Co 3.14-17).

A igreja CNPJ deveria servir somente para tornar legal o encontro da igreja espiritual. Seus estatutos, regimentos internos deveriam ser feitos apenas para atender a lei civil, possibilitando a existência legal da igreja, mas jamais poderiam determinar ou influenciar as decisões da igreja espiritual, pois estas deveriam estar sujeitas somente aos ensinos de Jesus encontrados nas Sagradas Escrituras.

A igreja na era dos apóstolos e dos pais da igreja não possuía estatutos e regimentos internos como hoje, nem mesmo continha todos os escritos bíblicos que hoje temos do Novo Testamento. 

·      O Segundo Problema: Ocorre quando seus líderes se apegam mais a igreja CNPJ do que a igreja espiritual. Eles trabalham arduamente por seu desenvolvimento estrutural e organizacional, mas se esquecem da igreja espiritual, que é a verdadeira igreja. Os membros dessa igreja se tornam apenas números e meios para seus pastores, apóstolos e bispos alcançarem seus objetivos pessoais. Normalmente estes líderes estão mais preocupados em divulgar o nome de suas igrejas e tornar seus nomes grandes, do que em pastorear as vidas daqueles que estão em suas igrejas. Eles não enxergam a igreja espiritual, somente a igreja CNPJ.

Jesus em João 10.12 chama estes líderes de mercenários, lobos vorazes que estão mais preocupados com a igreja CNPJ e com o quanto arrecadam através dela, do que com as vidas que se filiaram a elas.

 

A segunda causa que promoveu o abandono das Escrituras como única regra de fé e prática foram às diversas distorções teológicas ao longo dos anos.

 

SEGUNDA CAUSA: As Distorções Teológicas

Muitas foram às distorções teológicas enfrentadas pelo cristianismo ao longo dos anos. Essas distorções teológicas sempre contribuíam para o abandono parcial e algumas vezes total das Escrituras como única regra de fé e prática.

Algumas distorções teológicas ocorreram quando algumas pessoas passaram a dar o mesmo valor que se dá as Escrituras Sagradas as profecias, revelações e outras experiências místicas. Esta é uma prática comum da Teologia Gnóstica. O resultado desse erro teológico foi o surgimento de diversas religiões, que se dizem cristãs, mas as teologias apresentadas por elas não têm coerência com a Bíblia. Desse erro surgiu a seita dos Mórmons, as Testemunhas de Jeová, a Congregação Cristã, os Adventistas e outras seitas.

Muitas igrejas evangélicas hoje influenciadas por esse mesmo erro teológico, dando valor igual ao das Escrituras às profecias, revelações e outras experiências místicas tem pregado um evangelho corrompido, distorcendo a verdade contida nas Escrituras para sustentarem práticas como: urrar como leão, transferir unção, se apoderar territorialmente do mundo espiritual, falar com demônios e deles aprender estratégias de batalha espiritual, classificar pessoas como espirituais a partir de seus dons, etc.

Outras distorções teológicas ocorreram quando algumas pessoas passaram a ler a Bíblia através de uma lente única, de um filtro somente, extraindo dela apenas aquilo que lhe agrada, que está em acordo com sua ideologia de vida. A Bíblia precisa ser lida e compreendida a partir de si mesma. A Bíblia não é um livro político, ideológico, filosófico e nem mesmo religioso. A Bíblia é um livro que conta a história de um Deus Santo que por amor aos homens construiu um caminho de salvação para a humanidade. Este caminho exigia um sacrifício para que estes pudessem reencontrar com Ele e assim se reencontrarem com a vida. No desenrolar de suas páginas ela vai detalhando como este Deus amoroso construiu este caminho de sacrifício ao longo da história da humanidade, com o fim de que todo ser humano possa conhecer este caminho e encontrar a vida eterna. No ápice dessa história nos é revelado que este Deus amoroso entregou seu Filho, Jesus Cristo como sacrifício para que nossos pecados fossem perdoados e todos os que crerem Nele, Jesus Cristo tenham vida eterna.

Quando a Bíblia é lida através de uma lente política, ideológica, filosófica ou religiosa ela pode produzir erros teológicos profundos e a uma produção teológica tendenciosa. Nos últimos anos algumas teologias surgiram no meio cristão como fruto de uma leitura tendenciosa e partidária. Entre elas:

·      A Teologia da Libertação - É uma corrente teológica que parte da premissa de que o Evangelho exige dos cristãos uma opção preferencial pelos pobres, libertando-os das injustiças sociais. A Bíblia é lida através de uma lente socialista.

·      A Teologia da Missão Integral ou Missão Holística - Esta alinhada com a Teologia da Libertação e ganhou força nos anos de 1980 com o teólogo René Padilha através da publicação de seu livro “Missão Integral”. Ele Defende que o homem precisa ser salvo espiritualmente e socialmente, não se pode separar as duas ações, uma vez que o homem é espírito e matéria.

·      A Teologia da Prosperidade - Defende que a bênção financeira e uma vida bem-sucedida socialmente é o desejo de Deus para todos os cristãos. Acreditam que uma fé sustentada por um discurso positivo, somada a doações para os ministérios da igreja irão fazer com que Deus aumente a riqueza material do contribuinte fiel. É o oposto da teologia da libertação – Lente capitalista.

·      A Teologia Liberal ou Liberalismo Teológico – É um movimento teológico que tentou tornar a Bíblia aceitável cientificamente. A Bíblia é lida como um livro escrito por homens e não por Deus. As ações divinas foram diluídas da Bíblia. – Fruto do movimento iluminista.

·      A Teologia Relativista - Um movimento recente que defende a não existência de uma verdade teológica absoluta. Para os defensores deste movimento toda teologia é fruto de seu tempo e da cultura em que estava inserida. Ela é construída a partir da compreensão bíblica, filosófica e social de seus dias, buscando responder aos questionamentos do período em que foi escrito. Portanto não serve para responder aos questionamentos de nossos dias. – Fruto da cultura relativista de nossos dias.

 

Embora alguns dos seguidores destas teologias continuem usando a Bíblia para defenderem suas posições ou justificarem suas crenças, a Bíblia não compactua com essas distorções. Talvez você esteja se perguntando: “Mas como eles encontram na Bíblia apoio para suas heresias?” Isso acontece porque eles leem a Bíblia de forma fragmentada, sem considerar toda sua lógica construtiva, buscando tão somente defender suas posições.

Em meio a tantas distorções teológicas penso que a exortação de Paulo a Timóteo se torna ainda mais relevante para os nossos dias, pois estamos vendo a igreja abandonando o lema “somente as Escrituras”, por falta de conhecimento da mesma, e se agarrando a mitos e filosofias vãs. Diante esta verdade Paulo diz a Timóteo:

2 Pregue a palavra, esteja preparado a tempo e fora de tempo, repreenda, corrija, exorte com toda a paciência e doutrina. 3 Pois virá o tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, sentindo coceira nos ouvidos, segundo os seus próprios desejos juntarão mestres para si mesmos. 4 Eles se recusarão a dar ouvidos à verdade, voltando-se para os mitos. (2 Timóteo 4.2-4)

Acredito que o tempo citado por Paulo chegou. As pessoas hoje não suportam a sã doutrina. Elas buscam um evangelho que agrade o seu coração, que lhes façam sentir paz e que lhes dê a sensação de serem poderosas e vencedoras. Buscam por um evangelho que lhes aceitem como são e estão sem exigir mudanças; que lhes abracem sem esperar transformação; que as acolham e aceitem passivamente a manutenção da prática de seus pecados como algo normal.  Elas preferem dar ouvidos aos mitos a abraçarem a verdade. Nessa busca em agradarem aos seus próprios desejos elas se propõem até mesmo a reescreverem a Bíblia, pois a consideram um livro insuficiente e desatualizado para os nossos dias.

 

CONCLUSÃO

De acordo com a teologia reformada, nenhuma voz, na igreja de Cristo, pode se elevar em igualdade ou acima das Escrituras Sagradas. Somente as Escrituras é uma afirmação de que somente ela tem a revelação que nos conduz a salvação, que nos reconcilia com Deus. E ela afirma que essa salvação só é encontrada em Jesus Cristo.

Jesus Cristo é o cabeça da igreja, e ele a governa segundo os preceitos estabelecidos nas Escrituras. Nenhum líder, nenhuma denominação cristã, nenhum concílio, nenhum costume, nenhuma tradição, nenhum estatuto, nenhum regimento interno tem valor normativo para a igreja cristã. Somente a Bíblia o tem porque somente ela é INSPIRADA, soprada por Deus; INERRANTE, sem erros; INFALÍVEL, é confiável; AUTORITATIVA, possui autoridade; SUFICIENTE, possui o necessário para o ensino, repreensão, correção e instrução na justiça.

 

Pr. Cornélio Póvoa de Oliveira

22/11/2020

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