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quarta-feira, 24 de julho de 2013

CIDADES 3 - A CIDADE MEDIEVAL

A cidade Medieval.

 

Autores: Fábio Costa Pedro e Olga M. A. Fonseca Coulon.História: Pré-História, Antiguidade e Feudalismo, 1989

As invasões germânicas e a progressiva ruralização do Império Romano a partir dos séculos IV e V transformaram o comércio europeu numa atividade econômica secundária em relação à agricultura. A insegurança e a tendência à auto-suficiência dos domínios senhoriais diminuíram o ritmo e a quantidade das trocas. As antigas cidades romanas que sobreviveram às invasões perderam sua função mercantil e manufatureira e permaneceram apenas com função religiosa de sede de bispado, ou política, abrigando a corte de reis e condes.
Nessa época de inicio da Idade Media, o comércio era realizado por mercadores "sirios", designação que incluía todos aqueles provenientes da parte oriental do antigo Império Romano que ia da Grécia ao Egito, incluindo os judeus. Esses mercadores comercializavam produtos exóticos de luxo, como especiarias, perfumes, tecidos finos, couros trabalhados, papiros azeite, tâmaras e figos.
No período carolíngio, surgiram mercadores europeus e cristãos que se dedicavam ao comercio de gêneros agrícolas e Produtos artesanais como cereais e objetos de madeira e de ferro. Existiam também os mercadores, servidores especializados dos reis, condes, bispos e abades que percorriam os domínios comprando e vendendo a produção excedente e negociando os artigos orientais.
O comercio regional na Europa Medieval deu origem aos "portus” localizados ao longo das vias fluviais, utilizadas por serem mais rápidas e seguras que as péssimas e mal-conservadas estradas, e às "feiras", encontros periódicos de produtores e mercadores realizados numa data fixa a cada ano. "A feira junto à abadia de Saint Denis realizava-se em outubro, após a vindima'' (Duby). A atividade comercial era vista com desconfiança, apesar de ser reconhecida como importante e necessária para os reis, os nobres e o povo em geral.


A Igreja via o mercador como "um escravo do vicio... um amante do dinheiro", e  portanto, um pecador. Na sociedade feudal,   A riqueza não era para ser aumentada e somente era reconhecida como fruto da herança. 0 trabalho deveria ser suficiente para manter a condição em que cada um nascera. Assim, o lucro si não era condenável quando fosse "uma retribuição justa pelo trabalho que tinha dado".   O comércio estava submetido ao controle dos soberanos. A legislação carolíngia proibia, por exemplo, todo comercio noturno, com exceção da venda de alimentos. Condes e bispos deveriam estar presentes quando das trocas de escravos, cavalos, artigos de ouro e prata, a fim de evitar a comercialização de artigos roubados. Os mercadores pagavam impostos em troca da proteção dos reis, que os consideravam seus vassalos.
O comércio medieval persistiu mesmo durante as invasões dos séculos IX e X, quando a pirataria árabe aumentou os riscos das trocas entre Ocidente e Oriente. Desenvolveu-se largamente a partir do século XI, em função do crescimento demográfico e agrícola da Europa Ocidental contribuindo Para a recuperação econômica das cidades e para o aumento do numero de mercadores, dando origem a uma classe social nova, a burguesia.   As cidades italianas se especializaram na comercialização de produtos orientais de luxo que iam buscar em Bizâncio e Alexandria, para revender na Europa. 0 comercio com os árabes trouxe a prosperidade de Nápoles Bari, Salerno, Amalfi, Gaeta e principalmente Gênova e Veneza que se tornaram importantes centros comerciais, manufatureiros e bancários da Europa Medieval.      

AS CIDADES E A BURGUESIA  

Até o século XI, as cidades medievais estavam reduzidas às funções religiosas ou administrativas, abrigando apenas a residência de um bispo ou de um rei. A intensificação da vida agrícola e comercial  no Ocidente estimulou o seu crescimento e trouxe o aparecimento de novos centros urbanos, localizados ao longo das principais rotas comerciais da Itália, da Alemanha, dos Países-Baixos e da França.     Burgos e Comunas  
Nos períodos do ano em que as estradas se tornavam intransitáveis devido à chuva ou à neve, os mercadores procuravam parar no cruzamento de grandes rotas em portos fluviais ou marítimos, ou junto a uma antiga cidade ou castelo fortificado. Essa permanência logo fazia surgir um bairro mercantil ou manufatureiro – o burgo - ao lado do castelo feudal ou da catedral. A principio, o burgo era apenas "um emaranhado de vielas, cloacas e pocilgas", espremido entre muralhas e portões que se fechavam à noite.
Nele concentravam-se mercadores e artesãos dos diversos ofícios, o que incentivava as trocas com as aldeias dos camponeses visto que os centros urbanos necessitavam de matérias primas e de alimentos.   Os burgos, nascidos próximos aos domínios castelos ou catedrais, não tardaram em procurar se libertar do jugo dos senhores feudais, obtendo sua autonomia através da compra da Carta de Franquia,  mediante uma indenização paga ao conde ou barão, ou pela guerra.
Surgia assim à comuna no inicio baseada em princípios de lealdade e igualdade entre seus habitantes, o que estabelecia sensível contraste com a sociedade rural, em que prevalecia a rígida hierarquia social entre senhores e servos. As comunas contavam com milícias próprias e o governo era exercido pela burguesia, independentemente dos senhores feudais.  
As cidades aumentaram aos poucos sua penetração no campo, incentivando o desbravamento de novas terras de cultivo em torno delas e atraindo camponeses e artesãos, além de elementos da nobreza e de monges fugidos dos mosteiros. Para os camponeses, a cidade significava a liberdade, pois a servidão não existia no solo urbano; dai afirmar-se na época que "o ar das cidades liberta".  
De um simples local de trocas, um mercado, as cidades foram se transformando em centros manufatureiros especializados no artesanato de lã, linho, tapetes, couraças, elmos, vestuário, vitrais para as catedrais, etc. As regiões mais fortemente urbanizadas eram as liga das às grandes rotas comerciais da Europa Medieval e localizadas em zonas de grande produção agrícola.   As cidades italianas, além de desenvolverem o comércio inter nacional de artigos de luxo, criaram uma forte indústria têxtil e naval (trabalhos em madeira para cascos, mastros, velas, cordames), alem da ourivesaria, de atividades bancárias e de seguros marítimos. Na região de Flandres desenvolveu---e um importante centro têxtil, destacando-se as cidades de Gand Bruges Ypres, etc.    

As corporações de ofício ou guildas  

Nas cidades, a produção era realizada pelos artesãos que se reuniam em corporações de oficio ou guildas, Em cada corporação existiam os mestres, os oficiais e os aprendizes de determinada profissão, que fabricavam e comercializavam os artigos necessários ao consumo da cidade e das propriedades senhoriais vizinhas. Cada mestre tinha um numero variável de aprendizes e o número de mestres guardava certa proporção com as necessidades da comunidade.  
As corporações de oficio atuavam na defesa de seus membros e através de regulamentos controlavam os preços mínimos e máximos, a venda e a qualidade dos produtos, o número de trabalhadores e o horário de trabalho, impedindo invenções isoladas, concorrência entre seus membros e produtos de cidades vizinhas.  

A burguesia  

Nas principais cidades da Itália e dos Países-Baixos os mestres e os mercadores das grandes corporações de oficio ou "artes maiores (lãs, sedas, peles, remédios) se transformaram numa elite econômica e política - a alta burguesia - que se sobrepunha aos membros das”artes" menores (chapeleiros, ferreiros, carpinteiros, curtidores ar pequenos negociantes e lojistas) - a pequena burguesia - e à massa de trabalhadores urbanos assalariados, sem proteção das corporações de ofício.              
A alta burguesia se tornou proprietária de companhias de comercio, bancos, lojas, navios, terrenos urbanos, instalações industriais e de entrepostos para armazenagem de mercadorias orientais e das demais regiões da Europa dominando um mercado cada vez mais amplo. Devido ao controle das atividades bancárias do comércio internacional e da produção de determinados artigos essenciais como o alúmem e o sal, essa burguesia acumulou grandes lucros, dando origem ao capital mercantil.   Os empresários e mercadores apoderam-se do governo das cidades, usando-o para adquirir privilégios e fazer leis em seu benefício. Como exemplo, podemos citar as grandes famílias burguesas que dominaram as cidades italianas, organizadas como república independentes ou comunas: os Médicis, em Florença, os Sforza, em Milão, etc.  
A burguesia das cidades procurou se integrar ao mundo rural e feudal, adquirindo terras e palácios, casando-se com membros da aristocracia, comprando títulos de nobreza, aceitando cargos e participando das cortes dos reis, que pouco a pouco foram recuperando o poder político.   A Igreja cristã, que antes do século XI via com maus olhos as atividades mercantis e ensinava "ser difícil não pecar quando se tem  por profissão comprar e vender" passou a reconhecer a utilidade dos mercadores e banqueiros, tornando-se mais tolerante e aceitando, como legitimo, o direito de lucrar e de cobrar juros devido às dificuldades e riscos enfrentados na profissão.  
Como todo homem medieval, o burguês estava impregnado de profunda fé, observando os dias religiosos e participando de cerimônias solenes. Na Itália, era comum se destinar parte dos lucros de uma sociedade comercial a Deus, com doações em dinheiro para a Igreja e para os pobres, "representantes" de Deus na terra.
A burguesia e o alto clero foram responsáveis pelo embelezamento das cidades, com construção de pontes, monumentos, palácios e catedrais, incentivando e protegendo artistas e literatos. As catedrais góticas, edificadas como penitência e garantia de salvação da alma,  se tornaram símbolo e orgulho da população, local de festas religiosas e ponto de encontro dos cidadãos para suas assembléias.   A partir do século XI, "graças a sua nova agricultura, à abundância de braços para o trabalho e para a guerra, ao comercio e as suas cidades, a Europa cristã tornara-se uma comunidade de homens e de negócios, unidos por uma fé vista igualmente com fervor e com o pragmatismo necessário para não estorvar os negócios.” (SILVA,-Francisco C.Teixeira.Sociedade Feudal. São Paulo, Brasiliense, 1984, p. 38.)  


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