2ª Parte: QUE ESTÁS NOS CÉUS – Lc
11.1-4 / MT 6.9-13
Introdução:
Hoje iremos tratar da expressão QUE
ESTÁS NOS CÉUS – no grego: ὁ ἐν
τοῖς οὐρανοῖς – ho (art. def. nominativo masculino singular - o, isto,...) en
(preposição - em. no) tous (art. definido dativo plural masculino) ouranois
(substantivo - céu).
Primeiramente
gostaria de dizer que esta expressão não se encontra no Evangelho de Lucas, mas
aparece no Evangelho de Mateus. Como se trata da mesma oração, resolvi
considerar as palavras de Mateus e por isso vamos analisar o que Jesus quis
ensinar com a expressão “que estás nos céus”.
A
oração de Lucas é apresentada em uma ocasião diferente, posterior a de Mateus.
Em Lucas ela é ensinada após o regresso dos setenta, depois da segunda viagem
pela Galiléia; ao passo que em Mateus ocorre antes da chamada dos doze, que
acontece, alguns meses, antes da nomeação dos setenta.
O que Jesus desejou
nos ensinar com a afirmação que o Pai “está no céu”?
É evidente que a
afirmação de que nosso Pai está no céu, por Jesus, nos dá direção, nos aponta
um local para olharmos, nos apresenta um lugar de referência para que possamos
nos encontrar com Deus e conosco mesmos. Contudo, Jesus não está
falando de um lugar geográfico dentro do nosso mapa mundi. Céu é todo lugar onde
o reinado de Deus é vivenciado.
A realidade que o nosso Pai está no céu, nos ajuda a
reconhecermos a natureza e o propósito real de nossa existência - de onde
viemos e por que existimos. Esta realidade deve afetar a nossa cosmovisão a
respeito da vida. Hoje eu quero destacar três dimensões afetadas por esta verdade
que nosso Pai está no céu.
1)
A Dimensão Terrena /
Física / Humana / Temporal
2)
A Dimensão Ética
(princípios e valores / desapego deste mundo)
3)
A Dimensão Espiritual
(Adoração / Céu / Destino final)
1)
A Dimensão Terrena /
Humana
O fato de nosso Pai estar no céu, implica que Ele é um Pai que
ultrapassa as dimensões terrenas, que me faz olhar além de mim mesmo, dos meus
limites. Toda criação é caracterizada pela limitação, pela finitude. Por
exemplo: somos limitados em nosso espaço geográfico (não podemos estar em mais
de um lugar ao mesmo tempo), somos limitados em nosso conhecimento (não temos a
resposta de todas as coisas), somos limitados em nossa capacidade de amar e se
relacionar (conseguimos nos relacionar profundamente com no máximo 15 pessoas),
somos limitados em nossa capacidade de criar (toda nossa criação surge de algum
objeto já existente) e somos limitados em nossa existência (todos nós um dia
nos encontraremos com a morte). Só podemos vencer a morte, quando nos rendemos
a Jesus Cristo.
Entretanto Deus Pai não está preso a nenhuma de nossas
limitações, porque Ele transcende a dimensão terrena. Por que o Pai está no céu
sou obrigado a ampliar a minha dimensão terrena, a minha cosmovisão nas
diversas áreas da vida. Por exemplo:
●
A dimensão familiar nos é ampliada –
(Ilustração: na praça com o grupo da
Jocum).
Dizer que o Pai está no céu é dizer
que Deus é Pai de todos, de todas as raças, de todas as classes, de todas as
tribos, em fim de todos que reconhecem Seu Filho Jesus como Senhor de suas
vidas (Jo 1.12 – Mas, a todos quantos O receberam, deu-lhes o
poder de serem feitos filhos de Deus; a saber: aos que crêem no seu nome).
O céu onde o Pai habita é morada para todos,
pretos e brancos, pardos e amarelos, judeus e gregos, ricos e pobres... não
existem mais distinções, não existem mais raças, nem religiões, não existem
fronteiras, todos se tornam um: um só povo, uma só raça, filhos de um único
Pai. O céu é o lugar onde a unidade das raças, das classes, dos sexos, das
ideologias, se tornam reais.
●
A dimensão do Reino de Deus nos é
ampliada – Somos
tendenciosos a pensar que o Reino de Deus se limita a nossa igreja, a nossa
casa, a nossa vida, ao espaço que conseguimos visualizar. Entretanto o reino de
Deus vai além do que conseguimos ver com nossos olhos. O Reino do Pai não está limitado aos meus limites, ao meu espaço geográfico, o Reino do Pai se estende por toda
terra e além da terra, porque nosso Pai... está no céu, e Ele é Senhor dos
céus; e do céus governa todo universo e sobre todos os homens (Dt 10:17 – Pois o
SENHOR vosso Deus é o Deus dos deuses, e o Senhor dos senhores,...).
Uma
vez que o governo de Deus se estende além de nosso mundo, além de nossas
políticas sociais e econômicas, Deus não pode ser aprisionado ou comprado pelos
homens.
Como Pai que está
no céu, Ele não pode ser manipulado pela política governamental dos homens,
pelas leis que governam este mundo tenebroso e corrupto. A realidade que o Pai
está no céu, nos assegura que nosso Pai sempre nos tratará e julgará de maneira
justa, e que no tempo certo Ele julgará os reinos da terra, ao lado de Jesus
Cristo, o Rei dos reis, a quem um dia teremos que prestar conta de tudo. Por
estar no céu e ser do céu Ele é santo, justo e incorruptível.
A partir da compreensão de que Seu Reino se estende sobre
tudo e todos, devemos viver a ética do Reino do Pai que está no céu,
independente dos sofrimentos que possamos vir a passar, pois sabemos que tudo
está sob seu controle. Um dia Ele implantará definitivamente Seu Reino sobre a
Terra e nós os que cremos, em Jesus Cristo, reinaremos com Ele.
● A
dimensão do amor é ampliada –
(Lc 10.30-37 – a parábola do
samaritano). Por
meio dessa parábola, Jesus nos ensina que o amor deve ultrapassar todos os
preconceitos e todos os conceitos teóricos sobre o mesmo, porque o amor só é
real quando se manifesta de maneira prática, concreta.
Não
podemos amar apenas de palavras, mas de fato e verdade. Não devemos amar
somente aqueles que nos amam, pois para Deus essa é uma prática que até os
ímpios praticam. Deus espera que amemos além de nós mesmos, além de nossos
conceitos e preconceitos, além de nossas fronteiras, de nossos círculos de
amizades e de irmandade.
A dimensão do amor é ampliada também por conta de nossa filiação celestial,
que nos valoriza como pessoa. Ter um Pai no céu significa que somos dignos do
amor de Deus, não por nossos méritos pessoais, mas por meio do sangue de
Cristo. A valorização do nosso ser não está pautada no que fazemos ou de onde
viemos ou ainda sobre o que conquistamos neste mundo, mas no fato de que Deus
sempre desejou ter conosco uma relação familiar, Ele decidiu isso, e Jesus
tornou isso possível.
O mesmo amor que Deus dedica a mim, Ele oferece a você e a toda pessoa
que você possa imaginar. Portanto, eu não tenho o direito de recusar amar o
outro, por que o Pai que está no céu convidou o outro para ser meu irmão e por
Ele sacrificou o que tinha de melhor, Cristo Jesus. Eu sou chamado a amar além
de mim mesmo quando entendo que meu Pai está no céu, porque Seu Filho Jesus se
identificou com o menor de todos os homens (Mt 25.34-36 aos da direita disse: benditos de meu Pai – Mt 25.41-43 aos da
esquerda disse: afastai-vos de mim”).
Perguntas
para reflexão:
I.
Como você tem lidado com as pessoas de seu
relacionamento? Você as vê como objeto do amor de Deus? Você trata todas as
pessoas com igualdade? Você está pronto para ampliar seus laços familiares com
a grande diversidade de filhos que Deus tem? Peça a Deus que te ajude a amar o
rico e o pobre da mesma forma, o branco e o negro com igualdade, o crente e o
ímpio tentando ajuda-lo a se aproximarem cada vez mais de Cristo.
II.
Você tem vivido de forma consciente que
o Reino de Deus começa em você, mas se estende muito além de você? Você está
disposto a viver a ética do Reino do Pai, mesmo sabendo que ela te levará a
sofrer? Ore para que Deus o ajude a permanecer fiel a Ele diante as demandas
que este mundo lhe impõe. Que o ajude a viver os princípios de Sua Palavra
diante a pressão de nossa sociedade utilitarista, consumista que trata todos
como objeto de consumo e quando não como concorrentes que precisam ser
vencidos. Que você possa deixar marcas do Reino de Deus onde colocar as plantas
dos seus pés.
2)
A Dimensão Ética
(princípios e valores / desapego deste mundo)
Uma vez que minha cosmovisão da vida é ampliada pelo
olhar que faço através do Pai que está nos céus, meus valores e minhas atitudes
precisam acompanhar esta mudança.
O mundo em que vivemos é dominado por uma cultura
consumista e utilitarista. A estrutura desta cultura consumista e utilitarista
está construída sobre o pensamento de que o propósito principal do homem é ser
feliz. Tendo como pressuposto a ideia de que o homem foi criado para ser feliz,
a ética pessoal ou social se tornou relativa, isto é, conveniente a situação. A
ética muda conforme muda o meu valor de felicidade. Por exemplo: Se eu sou
empregado tenho um tipo de ética, se eu me torno o patrão minha ética é outra.
Quando vou comprar um carro eu tenho uma ética diferente de quando vou vender
um carro. Minha ética se baseia na busca da minha felicidade e todos se tornam
instrumentos para alcançar meu alvo.
Entretanto ao olhar para o céu, e ver o Pai, percebo que minha
vida não pode estar fundamentada na busca da minha felicidade, mas em honrar o
Pai que está no céu.
(Colossenses 1:16 – Porque nele foram criadas todas as coisas que há nos
céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam
principados, sejam potestades. Tudo foi criado por ele e para ele).
Meus valores e minha ética não podem mais permanecerem
fundamentados nos valores éticos desta cultura, mas fundamentado sobre a
realidade da razão da minha existência – existo para glorificar a Deus – e não
para ser feliz.
A consciência de que
nossas vidas vieram à existência para glorificar a Deus deve nos conduzir a uma
decisão interior que afetará toda nossa agenda exterior. Afetará nossa visão
sobre nossa profissão, nosso relacionamento familiar, nosso relacionamento com
a sociedade e com toda criação. Essa consciência deve ser tão forte em nós ao
ponto de sacrificarmos nosso bem estar e nossa felicidade para que as marcas do
Pai que está no céu sejam vistas por meio de nossas vidas.
Perguntas para
Reflexão:
I.
Quais são os valores que ditam suas escolhas
do dia-a-dia? São os valores de nossa cultura consumista e utilitarista que tem
a felicidade como o propósito principal do homem?
II.
Você
vive de forma a abrir mão de sua felicidade para glorificar a Deus?
3)
Dimensão Espiritual (Adoração
/ Céu / Destino final)
Esta é outra área afetada pelo conhecimento de que Deus, nosso
Pai, está no céu.
·
A compreensão sobre a adoração é ampliada – O
Pai não pertence a nossa dimensão terrena, portanto não está preso a nenhum
dogma, a nenhum credo, a nenhum sistema religioso criado pelos homens. Ele não
pode ser manipulado por rituais e nem comprado por dinheiro algum. O que muitas
igreja e religiões por ai tentam fazer é conquistar Deus como se pudessem
comprá-lo com oferendas e boas obras. Tudo que o homem pode oferecer a Deus é
nada, tudo que podemos oferecer a Ele é terreno, é passageiro, é vazio de vida.
Não podemos nos esquecer que Deus é espírito e importa que o adoremos em espirito. Por isso está escrito que “Deus procura verdadeiros adoradores que O adorem em espírito e em verdade” (Jo 4.23).
Tudo
que existe de vida em nosso mundo foi gerado pelo próprio Deus, e é sustentado
por Ele mesmo; portanto só podemos oferecer uma coisa a Deus, o nosso ser, mas
Deus, só aceita o nosso ser quando é oferecido a Ele de forma integral. Não
adianta oferecer pela metade... não se pode viver uma espiritualidade apenas contemplativa, isto é, sem se envolver com a
verdade, sem se relacionar com o mundo real, com pessoas reais, a qual Ele
criou para Sua glória; da mesma forma não podemos viver uma espiritualidade apenas verdadeira, isto
é, em dialogo com o mundo real a nossa volta, vivendo relacionamentos com
pessoas reais, praticando boas obras, mas desprovida de um relacionamento
pessoal com Deus, de uma busca de Deus por Deus. Somos chamados a uma
espiritualidade que ultrapassa os limites terreno. Como disse Paulo (Cl
3.1, 2) - buscai as coisas lá de cima,
onde Cristo está assentado, pensais nas coisas celestiais, não nas que são
terrenas.
·
Nossa
compreensão sobre o céu é ampliada - O céu onde habita Deus Pai a um primeiro momento pode nos
parecer infinitamente distante, e devemos nutrir este
sentimento porque nos faz percebermos que somos pequenos demais diante do Pai.
Que somos frágeis demais diante seu poder e glória. Perceber o céu como um lugar distante nos ajuda a
reconhecermos que precisamos de humildade para nos aproximarmos de Deus, e que esta distância só pode ser superada
pela graça manifestada por meio do Filho Jesus, o Deus que se fez carne, e que
se tornou o caminho para chegarmos ao Pai (Jo 14.6 – Eu sou o
caminho, a verdade e a vida...).
Mas por outro lado
quando buscamos o Pai, por meio de Jesus, logo percebemos que o céu é
extremamente próximo. Tão próximo que Deus é capaz de ouvir o clamor de cada um
de nós. Mesmo que este clamor seja inaudível, mesmo que seja apenas uma lágrima
sutil que sai dos nossos olhos, mesmo que este clamor seja um sussurro de dor
que emana das áreas mais ocultas do nosso intelecto ou do porão do nosso
coração. Deus está tão perto de nós que é capaz de ouvir.
·
A compreensão da vida
eterna nos é ampliada - Sem o conhecimento de que
Deus é nosso Pai, e de que Ele está no céu, a eternidade nos parece apenas uma
realidade abstrata, inexistente, intangível, inalcançável, pois somente quando
nos relacionamos com Deus Pai, por meio de Seu Filho Jesus Cristo, é que a
realidade das coisas invisíveis se tornam visíveis a nós. (1 Coríntios 2:14 - Quem não tem o Espírito não aceita as coisas
que vêm do Espírito de Deus, pois lhe são loucura; e não é capaz de
entendê-las, porque elas são discernidas espiritualmente).
A partir deste
relacionamento com o Pai que está no céu, vislumbramos nossa terra pátria, e
passamos a olhar para a vida eterna não como um conceito, um sonho desejado,
mas como uma realidade atingível, por meio da fé em Cristo Jesus.
Ao oramos “Pai nosso, que está no céu” evocamos a morada do nosso Pai, o céu, reconhecemos ser “o
céu” a nossa pátria e o nosso destino, porque o Filho desceu do céu para nos
fazer subir com Ele por meio de Sua cruz e Sua ressurreição.
Talvez você esteja se perguntando: onde é o céu? A questão sobre o céu que vem à tona, é
que o céu não é visto como um mero lugar físico, palpável, mas sim, um lugar
onde se alcança a máxima intimidade e proximidade com Deus, onde se vive um relacionamento
intenso e profundo com Deus e o seu Filho. Como se tem apropriadamente
observado, "Não é no céu que encontramos Deus, mas em Deus que encontramos
o céu". Não é nos nossos arredores que o céu se encontra, mas em Deus
encontramos o céu.
Perguntas para
Reflexão:
I.
Em que tem se baseado sua relação com
Deus? Você o busca a partir de seus interesses próprios ou você o busca pelo
prazer de estar com Ele? Sua espiritualidade tem sido vivida somente “pela
verdade”, desprovida da adoração, da contemplação, dos valores dos céus? Ou sua
espiritualidade tem sido vivida somente “pela espiritualidade contemplativa”
que busca o Reino do Pai que está nos céu, mas não dialoga com o mundo real,
não pratica o amor as pessoas reais que o cercam? Deus deseja te ajudar a viver
uma espiritualidade equilibrada, onde se busca as coisas celestiais, onde se
caminha a cada dia tendo o céu como o alvo, mas que vive as dimensões
celestiais “aqui e agora”, que faz com que o Reino de Deus se estenda um pouco
mais neste mundo dos homens.
II.
Você tem vivido como se a eternidade
fosse uma realidade para você? Onde está seu coração? Quais são seus grandes
sonhos? O que faz com os recursos que possui? O que faz com a influência que
possui?
III.
Você tem se encontrado com Deus e
desfrutado do céu com Ele?
Conclusão
Final:
A oração do discípulo nos
faz ir muito além de nós mesmos, ela desconstrói tudo o que entendemos por
mundo terreno e espiritual. Ela estilhaça nossa religiosidade, esmaga nossa
espiritualidade, nos chamando para vivermos além de nós mesmos. Ela nos convoca
para olharmos a partir dos olhos do Pai que está nos céus.
Muitos desejam controlar Deus, se
tornarem seus proprietários, aprisioná-los na dimensão de seus dogmas
religiosos ou de suas denominações eclesiásticas. Assim como Davi, desejam
construir casas terrenas para Deus, esquecendo-se porem que nós, é quem fomos
criados por Ele, e não Ele por nós.
A realidade de que
nossas vidas só encontram sentido se forem vividas para glorificar a Deus afetará
toda nossa agenda de vida. Nosso bem estar, nossa felicidade se torna secundários,
uma vez que nossa prioridade é a realização da vontade de Deus, que é o
estabelecimento do Seu Reino sobre o mundo dos homens.
O céu é nosso destino final, o
nosso local de encontro com Deus em Sua plenitude. Entretanto o céu está
reservado somente para àqueles que se renderem totalmente a Cristo Jesus,
deixando que Ele seja Senhor de suas vidas. O céu é uma realidade concreta
somente para àqueles que ampliarem sua cosmovisão da vida a partir de um
relacionamento profundo com o Deus Pai. O céu é morada para àqueles que
romperem com esta cultura consumista e utilitarista imposta por nossa
sociedade, e viverem na prática do dia-a-dia a ética do Pai que está no céu,
que pautarem sua agenda de vida nos valores do Reino de Deus.
Pr. Cornélio Póvoa de Oliveira
17/04/2014
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