A
Exposição do Sentido Interno da Palavra
Exemplos de
exposição do sentido interno ou espiritual por meio da ciência das
correspondências
1- Primeiro
exemplo: A CIDADE SANTA
1.1- A primeira passagem cujo sentido interno vamos considerar é o primeiro
versículo do capítulo 21 do livro do Apocalipse, onde lemos:
"E levou-me em espírito a um grande e alto monte, e mostrou-me
a grande cidade, a santa Jerusalém, que de Deus descia do céu".
1.2- Que significa esta cidade santa, que
também é chamada a Esposa do Cordeiro? Certamente não é uma cidade material.
Consideremos o que foi Jerusalém e logo se tornará claro o que representa a
referida cidade. Jerusalém foi a capital da terra de Canaã, porém teve maior
importância por ser o único lugar onde era permitido ao povo israelita realizar
os atos do culto. Em Jerusalém, os escribas e fariseus copiavam as Escrituras e
as estudavam, formulando suas doutrinas. Logo, é perfeitamente compreensível
que Jerusalém represente o culto e as doutrinas do povo israelita. Jerusalém
era o lugar onde se formulava a doutrina de Deus e chegou a ser símbolo, por
isso, da doutrina da Igreja. Dessa forma, a santa cidade da Nova Jerusalém, a
que se refere o versículo que examinamos, é a representação das doutrinas
celestiais que o Senhor predisse, em Sua vida mortal, que seriam reveladas
posteriormente aos homens.
1.3- Se aceitarmos essa idéia, logo
compreenderemos a descrição da cidade: os "muros" significam a defesa
da doutrina, para conservar puras as suas verdades; as "portas"
significam os ensinamentos que, em primeiro lugar, atraem aqueles que buscam as
verdades e os habilitam a entrar na glória de seus segredos celestiais; e as
"ruas" significam os caminhos da vida daqueles que ingressam ali.
1.4- Na Palavra, uma cidade representa,
portanto, o conjunto de doutrinas para a vida, seja essa doutrina falsa ou
verdadeira. É o que se vê também no Apocalipse, a respeito de outras cidades
mencionadas:
"E jazerão os seus corpos mortos na praça da grande cidade que
espiritualmente se chama Sodoma e Egito, onde o seu Senhor também foi
crucificado" (11:8).
Ora, João sabia muito bem que o Senhor não tinha
sido crucificado em Sodoma nem no Egito. Não foi por deslize que escreveu isso
no Apocalipse, e sim por uma razão Divina, pois a cidade que
"espiritualmente se chama Sodoma e Egito" é a representação de um
princípio ou de uma doutrina específica de vida.
1.5- Já vimos que, em toda a Palavra, a
montanha significa uma exaltação do sentimento, isto é, um amor (bom ou mau) da
vontade. Assim, o fato de João ter sido levado em espírito a "uma grande e
elevada montanha" significa que ele foi transportado ao terceiro céu onde
se acham aqueles que estão no amor proveniente do Senhor e, por Ele, na
doutrina da verdade genuína. A doutrina foi vista em forma de cidade porque a
"cidade" significa a doutrina, e a Igreja é Igreja pela doutrina e
pela vida segundo a doutrina. Ela também foi vista como cidade para que fosse
descrita por sua muralha, suas portas, seus fundamentos e por diversas medidas."
2-
Segundo exemplo: A GRANDE BABILÔNIA
2.1- Voltemos, agora, nossa atenção para uma
das cidades mencionadas no Antigo Testamento - a grande Babilônia - e
examinemos a seguinte passagem da Palavra:
"Ah! filha de Babilônia, que vai ser assolada; feliz aquele que
pegar em teus filhos e der com eles nas pedras" (Salmo 137:8,9).
2.2- Que concluímos dessa passagem? São tais
palavras de um Deus de infinito amor? Contêm uma mensagem do céu? Sim, amigo,
contêm uma mensagem das mais necessárias.
2.3- É regra universal que os homens julgam
ser tratados de acordo com os seus próprios sentimentos. Por isso, quando Deus
se dirige a um povo cruel, Suas palavras são recebidas como se Ele as tivesse
proferido com crueldade; e quando Se dirige a um povo orgulhoso, Suas palavras
são percebidas como palavras de orgulho. Os judeus eram um povo cruel e amavam
a crueldade. Assim, quando JEHOVAH lhes falava, eles interpretavam Suas
palavras com um espírito característico, embora, a fim de que a Palavra contivesse
também o Amor e a Sabedoria Divina, Deus tivesse provido para que, no seu
íntimo, nela se encontrasse a sabedoria dos anjos.
2.4- Vejamos, nos versículos que estamos
considerando, se é possível descobrir o significado da cidade que se chama,
espiritualmente, Babilônia. Babilônia foi a cabeça do primeiro império mundial
- governou autocraticamente segundo a vontade de seus potentados e não de
acordo com um sistema de leis. Os desejos e caprichos dos reis de Babilônia
tomaram o lugar das leis e da justiça nas terras por eles subjugadas. Babilônia
passou, assim, a simbolizar o desejo pelo domínio autocrático - o amor de
dominar segundo o capricho do próprio desejo e não segundo a Lei Divina. Esse
amor de dominar pode-se manifestar sob várias modalidades. Pode ser exercido
pelos reis e príncipes contra seus súditos, por um pai de família contra a
esposa e os filhos, por uma mulher contra suas amigas, por um patrão contra
seus empregados e em muitas outras circunstâncias. Quando, em qualquer desses
casos, uma pessoa impuser sua vontade às outras, sem respeitar o direito e a
justiça, estaremos diante do amor da dominação simbolizado pela antiga cidade
de Babilônia.
2.4- Se esse amor de domínio, se esse
exercício da tirania se apodera do homem, prende-o de tal modo, que ele
dificilmente poderá escapar. Por isso, é de suma importância desarraigar do
coração das crianças tão nocivo sentimento. O versículo em questão diz:
"Ah! filha de Babilônia, que vai ser assolada; feliz aquele que pegar em
teus filhos e der com eles nas pedras". Ora, sabendo que a
"cabeça" significa os princípios que se tem adotado e que a
"pedra", na Palavra, significa a verdade, por aí se vê que uma cabeça
em que se aninhem as maquinações da tirania deve ser "rebentada"
contra as pedras, ou seja, as idéias provenientes do amor de dominar devem ser
esfaceladas por uma confrontação com as verdades. É isto, então, que este
versículo quer dizer espiritualmente, segundo a significação de
"Babilônia", "cabeça" e "pedras". Agora podemos
compreender a mensagem do sentido interno: felizes são aqueles que desmontam,
por meio de verdades genuínas, os princípios do amor de dominar simbolizados
pelos filhos de Babilônia.
3-
Terceiro exemplo: a velhice de Pedro
3.1- Voltemo-nos, agora, para o Novo Testamento,
em cujas páginas se encontram, muitas vezes veladas como veios de metal sob a
terra, preciosíssimos ensinamentos.
3.2- Vejamos o significado simbólico da
seguinte passagem do Evangelho de João:
"Na verdade, na verdade, te digo que, quando eras mais moço, te
cingias a ti mesmo, e andavas por onde querias; mas, quando já fores velho,
estenderás as tuas mãos, e outro te cingirá, e te levará para onde não queiras.
E disse isto significando com que morte havia ele de glorificar a Deus. E, dito
isto, disse-lhe: Segue-me. E Pedro, voltando-se, viu que o seguia aquele
discípulo a quem Jesus amava, e que na ceia se recostara também sobre o Seu
peito. Vendo Pedro a este, disse a Jesus: Senhor, e deste, que será? Disse-lhe
Jesus: Se eu quero que ele fique até que eu venha, que te importa a ti?"
(João 21:18-22).
3.3- Os doze apóstolos do Senhor, assim como
os doze filhos de Israel, representavam os princípios gerais que formam a
doutrina da Igreja. Pedro e João, sendo os principais discípulos, simbolizavam,
respectivamente, os dois princípios capitais da Igreja: a fé e a caridade. Do
próprio sentido literal do Novo Testamento podemos concluir que Pedro
representa a fé, pois, quando o Senhor pediu a Seus discípulos uma declaração
de fé, foi Pedro quem a deu:
"Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo" (Mateus 16:16).
Pedro, em grego, quer dizer "pedra",
nome que lhe foi dado pelo Senhor por uma razão muito especial. Disse-lhe o
Senhor:
"Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra
edificarei a Minha igreja..." (Mateus 16:18).
A fé é como uma pedra sobre a qual a Igreja está
fundada, assim como uma rocha é o alicerce sobre o qual o templo é construído.
3.4- João representa o amor ou as boas obras,
o que também deduzimos de passagens do Novo Testamento. Tudo aquilo que João
escreveu nos dá testemunho do amor que lhe tinha o Senhor e do amor que um
cristão fiel deve sentir pelo seu próximo. É porque representa tal amor que ele
é chamado, nos Evangelhos, o discípulo amado.
3.5- Aqueles que procuram compreender a
Palavra de Deus hão de sentir necessidade de uma interpretação clara da parte
do Capítulo 21 de João, acima transcrita, de modo a não deixar dúvidas sobre a
declaração ali contida. Certamente, a morte de Pedro foi uma tragédia, porém a
predição de sua morte, feita pelo Senhor, foi uma tragédia maior que a da
desaparição de um homem. E isso porque Pedro não representava apenas um homem,
mas a fé da Igreja Cristã. A pergunta que o Senhor dirigiu, por três vezes, a
Pedro: "Amas-me?" e a recomendação que lhe fez, dão a entender que o
amor daqueles que Pedro representa poderia esfriar e que eles poderiam deixar
de apascentar as ovelhas do rebanho do Senhor.
3.6- Quem quer que raciocine sobre o assunto
pode concluir imediatamente que a recomendação feita a Pedro "Apascenta as
Minhas ovelhas" era dirigida a todos os que tivessem de propagar a fé da
Igreja Cristã. E a passagem dá-nos a entender que havia perigo de que esta fé
corresse o risco de não ser ensinada em espírito e em verdade! "Quando já
fores velho, outro... te levará para onde não queiras" significa que,
quando perdesse o espírito de juventude, a Igreja Cristã seria desviada pelos
interesses mundanos e pelas ambições. Pedro (representando a Igreja) seria
cingido por outro e levado para onde não queria ir. A Igreja seria desvirtuada,
e o "outro" que a desviou representa os homens que formularam credos
não contidos na doutrina pregada por Jesus Cristo. Desviada do caminho da
Verdade, a Igreja passou a exigir que os homens aceitassem novos credos, embora
ela já não fosse guiada pela luz da Verdade.
3.7- "Se eu quero que ele (João) fique
até que eu venha, que te importa a ti?" quer dizer que aqueles
representados por João (amor), ou seja, aqueles que estivessem na caridade,
seriam, entretanto, resguardados pelo Senhor até que Ele voltasse novamente
para estabelecer, agora plenamente, a Sua Igreja. João representa todos os que
têm amor genuíno ao Senhor e que obedecem à Sua Palavra, ainda que em assuntos
de fé - como a natureza da Divina Trindade, a maneira da salvação e a natureza
da ressurreição - possam estar em ignorância. A velhice de Pedro corresponde,
pois, ao declínio e à falta de fé na Igreja Cristã.
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