A Igreja Que Sonhamos e Que Deus Quer Que Sejamos
Uma igreja que celebra, contempla e se
consagra a Deus em plena adoração, que testemunha com fervor do amor de Cristo
aos perdidos , que integra seus membros numa dinâmica vida espiritual baseada
na prática do amor fraternal, que prima por expressar o singular caráter de
Jesus Cristo ao mundo pela maturidade dos membros de sua comunidade, os quais
se fortalecem e servem mutuamente pelo uso intransferível de sua habilidade
carismática, não são apenas as características da igreja que sonhamos, na
verdade trata-se da identidade da igreja que Deus quer que sejamos e que pelo
poder do Espírito Santo podemos chegar a ser.
Introdução
Quem dentre nós já não fez uma imagem
mentalizada daquilo que gostaríamos que nossa igreja local fosse em sua prática
ministerial ? Uma igreja em que as características acima não lhes seja um
retrato fiel ? Com certeza, muitos de nós já sonhamos com nossa igreja local
tendo esta identidade. Uns há que já imaginaram sua igreja com uma Escola
Bíblica Dominical com um expressivo número de matriculados. Há aqueles que se
contassem com 200 alunos matriculados na Escola Dominical estariam realizando
um sonho que há muito alimentam e que certamente os deixaria "orgulhosos"
de pertencerem a uma igreja assim. Outros há que a imaginam com um culto
noturno onde toda sua bancada estivesse repleta de adoradores que juntos,
todos, entoassem com ardor e alegria contagiantes hinos e cânticos de
celebração à santidade, majestade, graça e amor de nosso Deus, trazendo
regozijo e leveza a seu espírito adorador.
Outros também já sonharam
contemplando-a com um repleto grupo de jovens saindo às ruas, distribuindo
folhetos, fazendo pregação da Palavra ao ar livre, testemunhando com ousadia de
sua fé cristã, convencidos de que não há uma fé semelhante sobre a face da
terra, vociferando a seus amigos e até inimigos que em sua igreja local o
Senhor reina e que aqueles que não são membros dela ainda não sabem o que estão
perdendo. Há aqueles ainda que, comprometidos com uma doutrinação firme, anelam
por ver os membros de sua igreja local distinguindo o que é teológicamente
correto daquilo que não passa de heresia e modismo religioso e que traz
subjacentes as mesmas, letais mentiras satânicas. Há aqueles também que já
mentalizaram sua igreja conduzindo dezenas e até centenas de jovens ao altar
matrimonial onde gozem e conheçam o que é a benção de ter um lar cristão.
E o que falar daqueles que com uma
visão missionária e ministerial grandiosa já não sonharam com sua igreja tendo
vários e diversificados ministérios ? Ministério como alguns voltados para
menores abandonados, prostitutas, universitários, alcoólatras, viciados em
drogas, dramaturgia, coral, grupos de louvor musical, institutos bíblicos,
atletas de Cristo, etc. Mas quão grande é a decepção e frustração de muitos de
nós quando saímos do mundo dos sonhos e voltamos à realidade e nos deparamos
com uma igreja diametralmente oposta àquela que mentalizamos, imaginamos,
sonhamos e que Deus espera e quer que sejamos. Em vez de uma Escola Dominical
com 200 alunos, como sonhado, nossa realidade nos amargura quando olhamos no
relatório e constatamos que não passamos dos mesmos matriculados dos últimos
sete anos, evidenciando a falta de progresso naquela que muitos consideram o
carro chefe do propósito de edificação da igreja local.
A tormenta aumenta quando nos deparamos
com um culto noturno de uma assistência que não chega ao número ensejado de
pessoas, pois os irmãos não convidam seus amigos e vizinhos para dele
participarem, e o que é pior, a celebração feita não cativa, não contagia e nem
alegra, tendo a sensação muitas vezes, em meio a estes cultos, que se
estivéssemos em um funeral seria bem mais vibrante, pois lá pelo menos estariam
rolando algumas piadas e cafezinho com bolachas. Na verdade, o próprio ambiente
de culto dificulta qualquer convite à pessoas não crentes à sua participação.
Você entra em desespero quando percebe
que sua mocidade não é dinâmica, mas letárgica, fria, e descomprometida, onde
seu único compromisso é o de terem satisfeitos os seus caprichos, que por serem
tão infantis e banais ofendem e irritam os mais velhos da igreja; e que em vez
de serem jovens testemunhadores são mimados e querem ser servidos e não
servidores como você sonha. Você até pensa em desistir da fé quando descobre
que na verdade a grande maioria de seus jovens e de tantos outros irmãos não
passa de uma legião de "ocos espirituais" e que estão mais
preocupados com seu próprio mundo, para não dizer ventre, do que ver os
propósitos de Deus ministrados e realizados em suas vidas. Mediante tudo isso
até dúvidas de que sua igreja seja uma igreja, de fato, você começa a nutrir.
Se o que acabo de descrever lhe ofende ou descreve seus sonhos ou realidade
sobre a natureza de sua igreja local, não se irrite e nem se desespere.
Como membro de uma mesma igreja,
durante onze anos, e seu pastor durante seis, vivenciei os dois lados. Viajava
em sonhos imaginando que minha igreja local fosse dinâmica, mas me angustiava
com a realidade de sua letargia, frieza e descompromisso no viver e
compartilhar de sua fé. Entretanto, em árduos, às vezes tumultuosos, e
conflitivos seis anos como pastor de uma pequena igreja vi meu sonho se
realizando em realidade paulatinamente. Confesso que ele não chegou ao ponto
que minha imaginação muitas vezes me fez transportar, mas deixaria qualquer
pastor em estado de "realização ministerial" ao ver até onde Deus nos
conduziu. E isso, mesmo desvirtuando-nos em muitas ocasiões de seus propósitos
claramente revelados. Sofremos, choramos, nos angustiamos, mas crescemos. Mas o
crescimento que a igreja experimentou em meu ministério, no de outros que me
antecederam e experimentará no dos que hão de me suceder, não foi e nem será
obra do acaso ou fortuito. Resultou e resultará antes de uma compreensão de
quem Deus é e de como Ele quer Sua igreja. Isto é, o crescimento se dá quando a
igreja aceita o fato de que Deus é quem efetua o seu crescimento e que nós
podemos, como membros dela, ter a benção de ser seus instrumentos para isso.
Dentre as muitas coisas que nos foram
necessárias aprender, em nosso processo de retomada do crescimento
eclesiástico, e não foram pouco as vezes em que isso veio através da dor,
estava a imperativa iniciativa de demover de nossas mentes e corações o que não
se coadunava com a vontade revelada de Deus em sua Palavra. Para que a saúde
espiritual retornasse, e com ela chegasse a retomada do crescimento de nossa
comunidade, pois desde que houvéramos nascido tínhamos crescido. tínhamos que
renovar nossa mentalidade pela Palavra de Deus, como soleniza-nos o apóstolo
Paulo em Romanos 12:1-2. É que em nosso processo histórico de ministério
eclesiástico, deixamo-nos enfermar por males que atrofiaram e impediram nosso
crescimento e amadurecimento durante alguns anos.
E se em vez de ficarmos procurando um
culpado para o retrocesso em nosso processo de crescimento, como ficamos
fazendo durante significado tempo, tivéssemos diagnosticado os males, e juntos,
cada um cooperado, dando o máximo de si a Deus, não teríamos perdido tanto e
muitos de nossa geração que deixamos de alcançar em função disso, teriam sido
alcançados com o evangelho de Cristo através de um ministério bem mais sadio de
nossa igreja local. Descobrimos também que o caminho do crescimento sadio não
oferece atalhos, mas deve ser trilhado pelos trilhos absolutos dos princípios
de Deus. São os infalíveis e universais princípios revelados na Palavra de Deus
que qualquer igreja local precisa compreender e incorporar, caso queira crescer
e ser a igreja que sonha e que Deus deseja que venha a ser.
E qualquer igreja local que paute sua
identidade e seu ministério na teologia bíblica tem reais possibilidades de
crescer o crescimento que vem de Deus. Não podemos querer ser uma igreja
modista, cuja fé varia e oscila de acordo com as circunstâncias da vida e da
sociedade humana. Afinal de contas, antes de ser um fenômeno social, a igreja é
estritamente de caráter teológico. E uma má compreensão disso pode vir a ser o
caos, como de fato tem sido em muitos casos contemporâneos. Decididamente se
não for para sermos a igreja que o Senhor quer e espera que sejamos, é melhor
desistirmos e cada um ir para sua casa e cuidar de seu mundo restrito,
aguardando apenas o dia de acertarmos nossas contas com o Senhor da igreja. Em
Atos 2:42-47 e 4:32-37 encontramos as características da igreja que sonhamos e
que Deus quer que sejamos. E o melhor é que nós, pela graça de Deus, também
podemos ser uma igreja com aquelas características, acredite! Vejamos estas
características:
Desenvolvimento
I. Primeira Característica: Uma Igreja
Edificada Em Sua Fé - Atos 2:42a
O texto acima sugere que a igreja em
Jerusalém era uma igreja fortalecida em sua fé, sólida no que cria e no que
fazia. Este fortalecimento era oriundo de sua perseverança na doutrina dos
apóstolos (Cf. Atos 2:42 a). Isto é, seu apego e orientação baseados na
doutrina dos apóstolos lhes dava a característica de uma igreja fundamentada na
Palavra de Deus a eles revelada. Isto significa que a Palavra de Deus era o seu
manual de crença e conduta, o que nos impõe algumas implicações ministeriais
práticas. Por exemplo, se cada crente não estiver desejoso de conhecer mais
sobre Deus e de Sua Palavra, valorizando com sua presença, atenção, esmero e
cuidado os programas da igreja que lhes proporcionam firmeza na Palavra de
Deus, ou mesmo pessoalmente como autodidatas, caso sua igreja não lhes
proporcionem tais programas, estarão demonstrando que não querem construir e
fazer parte de uma igreja fortalecida em sua fé.
Antes estarão revelando que seus
propósitos em relação a sua igreja local diferem daquilo que Deus quer para
ela, visto não se importarem com seu fortalecimento doutrinário. E neste
sentido serão muito mais uma pedra de tropeço e escândalo do que instrumentos
que desejam ser usado na edificação da comunidade de seus irmãos em Cristo,
mesmo que neguem isto com toda sorte de argumentos. Além é claro de se tornarem
presa fácil de heresias sedutoras, enganadoras e destruidoras da genuína fé
cristã. Afinal, não é a Palavra de Deus que nos equipa para toda boa obra (Cf.
2 Timóteo 3:16-17) ? Só na firmeza da Palavra de Deus e por sua aplicação, pelo
Espírito Santo, uma igreja local é edificada e tem o caráter de Cristo formado
plenamente em si (Cf. Atos 20:28-32 com Efésios 4:11-16).
Na verdade, todo que se diz crente mas
não submete-se a autoridade das Escrituras é instrumento de Satanás para
impedir que a igreja seja fortalecida em sua fé (Cf. 1 Coríntios 5:1-13 com
Romanos 16:17-18). Não foi à toa que o apóstolo Paulo instigou o jovem pastor
Timóteo a centrar seu ministério na proclamação da Palavra de Deus (Cf. 2
Timóteo 4:1-5). O mesmo apóstolo ressaltara aos crentes em Corinto que não
pensara em apoiar a fé deles em outra coisa senão na Palavra de Deus (Cf, 1
Coríntios 2:1-5). E qualquer igreja local que queira crescer sadiamente não
pode ignorar este princípio, principalmente nestes dias em que o hedonismo
religioso é prevalecente em muitos círculos evangélicos e o evangelho tem sido
encarado mais como um produto de consumo capitalista que se molda ao gosto
daqueles que o consomem. Edificar a igreja na Palavra de Deus, incutindo pela
sã doutrina, a noção exata de quem Deus é e o que faz em sua criação, é
extremamente revolucionário na atual conjuntura evangélica.
E se para nos solidificarmos como
igreja sadia, temos que perpassar pelo boa doutrinação dos membros de nossa
igreja, como nos demonstra a eclesiologia bíblica, temos que nos colocar na
contra mão da tendência eclesiástica de nossos dias, que prima pela superficialidade
da sã doutrina e que tem legado ao mundo uma imensa geração de "ocos
espirituais", preocupados mais com seu próprio ventre do que com a glória
de Deus. Isto é, a tendência atual é a de que os crentes fiquem bem consigo
mesmos do que mesmo venham a ter o caráter de Cristo como marca de sua
maturidade cristã.
II. Segunda Característica: Uma Igreja
Integrada Em Sua Fé (Atos 2:42b, 44-45 e 4:32-35)
O texto clássico de Mateus 28:19-20
deixa claro que aqueles que forem feitos discípulos de Cristo devem ser
batizados em nome do Pai, Filho e Espírito Santo e serem ensinados a guardar
tudo quanto Jesus tenha ordenado. A referência ao batismo aqui implica muito
mais que mera descida às águas. Quando a ordem batismal é associada ao
imperativo de discipulado nos mandamentos de Cristo, como neste texto, o
batismo sobressai-se ao mero significado de imersão aquática. Ele passa a
significar a integração do novo convertido na vida da igreja local que o levou
ao conhecimento da salvação em Cristo. Significa torná-lo participante ativo na
interação de vida que há entre os nascidos de novo.
Significa recebê-lo como novo
integrante da família dos nascidos de Deus e dedicar-lhe os cuidados
necessários a um recém nascido para que se desenvolva, amadureça, cresça e se
reproduza. Que os novos convertidos ganhos pela igreja em Jerusalém eram
integrados de forma plena na vida comunitária daqueles crentes é evidenciado
tanto em Atos 2:42b, que assevera sua perseverança na comunhão, quanto em Atos
2:44-45 e 4:32-35, que descrevem a natureza desta comunhão, que estendia-se aos
níveis das necessidades básicas e materiais uns dos outros, e não apenas em
comunhão espiritual. Ou seja, aquela igreja tinha uma vida cristã muito mais
carismática, como um organismo vivo, do que uma vida institucionalizada, como
uma associação de pessoas com interesses comuns.
A falta de uma plena integração dos
novos convertidos à família da igreja local, para que desenvolvam sua salvação
alcançada em Cristo, com o auxílio dos irmãos mais antigos e maduros na fé, tem
sido um dos maiores dramas de muitas comunidades cristãs de nossos dias. Ou
seja, os novos convertidos saem pelas portas do fundo das igrejas na mesma
proporção em que entram pelas da frente. O êxodo tem sido proporcional a
entrada. Mas se uma igreja local quer crescer sadiamente ela terá que fazer a
integração plena de seus novos convertidos. Isto envolve uma plena comunhão da
vida que os crentes têm em comum como mesma herança de Deus Pai em Cristo,
através do Espírito Santo. Com isso, quero dizer que não só podemos ser uma
igreja que cresce na comunhão, integrando seus novos convertidos e presenciando
a interação de vida abundante entre seus membros, como temos a
"obrigação" de fazê-lo pois as armas para isso já nos foram dadas por
Cristo.
Isto é, a nova natureza e o Espírito
Santo são uma realidade na vida dos crentes em Cristo, o que os potencializa a
serem o novo homem que expressa a imagem do Filho de Deus (Cf. Gálatas 5:16-23
com Romanos 8:29-30). A igreja é essencialmente uma assembléia de novas
criaturas que juntas vivem o evangelho, expressando ao mundo o caráter que
estão desenvolvendo em Cristo pelo Espírito Santo, para a glória de Deus Pai.
Uma igreja local organizada, portanto, que agregue pessoas nascidas do Espírito
Santo, e que estejam dispostas a juntas viverem sua fé com base nesta vida
comum, tem apenas que organizar e/ou reformular suas estruturas eclesiásticas
para que a integração e troca de vida lhe seja possibilitada com mais
freqüência, intensidade e vivacidade do que o que tenha vivido até então.
III. Terceira Característica: Uma
Igreja Evidenciada Por Sua Fé - (Atos 2:47 e 8:1-5)
As igrejas locais tem marcas
características que as distinguem uma das outras, tendo determinadas
particularidades que evidenciam sua natureza e ministério. Em alguns casos
estas marcas evidenciam enfermidades, revelando uma identidade distorcida e um
ministério quebrado. Tal é o caso da igreja em Corinto, que apesar da abundante
riqueza carismática (Cf. 1 Coríntios 1:7) lhe faltava a evidência maior do
fruto do Espírito Santo, o amor (Cf. 1 Coríntios 13). A igreja em Jerusalém por
outro lado era reconhecida pela autenticidade de sua fé, por sua lealdade ao
Senhor Jesus Cristo, pela beleza de suas relações pautadas no amor cristão
fraternal, por isso, como diz Lucas em Atos 2:47 contavam "com a simpatia
de todo o povo" e "acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam
sendo salvos". Jerusalém era uma igreja que por encarnar o real sentido do
termo "igreja" impactou a sociedade de sua época com um testemunho
avassalador. Ou seja, a igreja em Jerusalém transpirava, respirava e
evidenciava Jesus Cristo.
Propalavam-no como o único Senhor e
Salvador capaz de dar sentido a vida de quem quer que nEle cresse. E qualquer
igreja local cujo testemunho não evidencie, com vidas, que em Cristo há poder
de transformação não logrará muito êxito, sendo quase certo seu definhamento
como comunidade cristã. Isto é, nenhuma igreja local se expandirá se não
testemunhar com vida transformada o evangelho de Cristo. Não há expansão
eclesiástica sem evangelização eclesiocêntrica, fundamentada e pautada no
conteúdo do poderoso evangelho de Cristo. A evangelização é pela igreja, por
isso é eclesiocêntrica, mas seu conteúdo deve ser estritamente crístico e não
humanístico.
Este era o diferencial na evangelização
de muitas igrejas nos primórdios da era apostólica. É necessário sermos
autênticos e fundamentados em nossa fé, leais ao Senhorio de Cristo custe o que
custar, embelezados em nossas relações pela prática do amor fraternal, como
eram os fiéis da igreja em Jerusalém, caso queiramos um testemunho
evangelístico de real impacto. Potencial para conseguirmos galgar uma realidade
semelhante a deles ? Deus já nos dispôs desde que sobre a igreja desceu o
Espírito Santo, dando-lhe poder e graça para que fosse sua testemunha pelos
quatro cantos da terra (Cf, Atos 1:8). Viver para tornar cada espaço que ocupo
num ambiente onde Cristo seja conhecido e levar cada pessoa com quem me
relaciono a contemplar Jesus Cristo em minha vida, deve ser a razão mor de
minha existência como cristão.
IV. Quarta Característica: Uma Igreja
Equipada Em Sua Fé (Atos 2:42c e 6:1-6)
O apóstolo Paulo em carta escrita aos
crentes de Éfeso assevera-nos que apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e
mestres são concedidos por Cristo à igreja para que equipem os santos, para que
estes desempenhem a obra do ministério (Cf. Efésios 4:11-12). Esta assertiva de
Paulo contrapões-se a tendência clericalista de ministério prevalecente em
muitas igrejas contemporâneas. Na verdade, o texto de Efésios, ladeado por 1
Pedro 4:10, revela-nos a verdade de que cada crente é um ministro de Deus na
igreja. Não há a tão comum e propalada dicotomia pastor e leigo na obra
ministerial. O que há, de acordo com a eclesiologia bíblica, são variedades
funcionais e diversificações ministeriais (Cf. Romanos 12:3-8) mas nunca
hierarquia sacerdotal, pois todos na igreja são sacerdotes de Deus, não havendo
nenhum crente que não o seja (Cf. 1 Pedro 2:9-10). Por isso todos os crentes
tem pelo menos uma habilidade carismática com a qual deve e pode contribuir na
edificação de sua igreja local (Cf. 1 Coríntios 12:7 com 14:12).
A tão notificada rede ministerial, que
organiza diferentes e diversificados ministérios eclesiásticos baseados nos
dons espirituais dos membros da igreja, não é nenhuma novidade revolucionária,
antes já constituíra-se princípio e prática ministerial nas igrejas apostólicas
(Cf. 1 Coríntios 12:4-6). O fim último no desenvolvimento da salvação do crente
é que ele venha a ter a imagem de Cristo (Cf. Romanos 8:29-30) e que se
constitua em um ministro ativo da graça de Deus na comunidade eclesiástica (Cf.
1 Pedro 4:10 com Efésios 4:11-16). Havia uma nítida preocupação por parte dos
apóstolos, especialmente por parte de Paulo, em que os líderes das igrejas
ocupassem-se em equipar os crentes para o desempenho de seu sacerdócio real
(Cf. 2 Timóteo 2:1-2). Conosco não pode ser diferente!
Que a igreja em Jerusalém era uma
igreja equipada em sua fé, com pleno desenvolvimento do sacerdócio universal de
seus crentes, se vê na narrativa de Lucas em Atos. No capítulo 8:1-5, por
exemplo, o médico amado registra a intensa perseguição ocorrida em Jerusalém,
ressaltando que os dispersos anunciavam a Palavra de Deus por onde passavam. Em
Atos 11:19-21 ele relata a conversão de alguns gentios da Fenícia, Chipre e
Antioquia, ganhos justamente em função da pregação feita por aqueles dispersos
da perseguição sobrevinda a Estevão. Em Atos 13:1 já vemos uma igreja
organizada em Antioquia com notáveis profetas e mestres, dentre eles Saulo, e
Barnabé. Quem fundara aquela igreja ? Os apóstolos ? Certamente que não. Sua
fundação se dera pelo testemunho dos crentes dispersos. Se deu pelos leigos,
diríamos em nossa cultura eclesiástica clericalista. Uma igreja que deseja
crescer sadiamente primará por uma liderança capacitadora, onde a função de seu
pastor, profeta, evangelista, missionário e mestre seja a de equipar os santos
para o desempenho da obra ministerial, exatamente como prescreve a teologia
paulina (Cf. Efésios 4:11-12). Isto porque cada membro é um ministro, tendo uma
habilidade particular e peculiar que deve ser exercida somente por ele, e isto
para o benefício geral da comunidade cristã.
V. Quinta Característica: Uma Igreja
Animada Em Sua Fé (Atos 2:42d, 46-47)
Lucas registra em Atos 2:46-47 que os
crentes da igreja em Jerusalém "diariamente perseveravam unânimes no
templo, partiam pão de casa em casa e tomavam suas refeições com alegria e
singeleza de coração, louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o
povo...". Eis o retrato de uma igreja verdadeiramente animada em sua fé,
alegre e exultante por ter o Deus que tem, um Deus inigualável em todo seu ser
e obra. Sua adoração alegre, singela e jubilosa contagiava, ao ponto de se
tornarem simpáticos de todo o povo. E isto sem precisar deformar ou diminuir o
conceito de Deus e de sua mensagem ao homem, como muitas igrejas contemporâneas
fazem para atrair público. A igreja é antes de tudo a comunidade dos
verdadeiros adoradores de Deus, que dEle fazem sua única possessão e razão de
ser, ter e fazer.
É a comunidade daqueles que o
magnificam com celebração cultual jubilosa e alegre, que a Ele se conforma pela
contemplação de sua majestade e que a Ele se consagra em obediência a sua
vontade. É imprescindível a uma igreja que queira crescer sadiamente, o
entusiasmar-se em sua fé, vivendo-a como a única e verdadeira fé, com fogo e
paixão cativantes. É preciso estar entusiasmado com a comunidade local de
crentes a que se pertence. É preciso concebê-la e vivê-la como a mais
espetacular comunidade cristã existente sobre a face da terra, a comunidade na
qual desejemos que todos nossos amigos e parentes façam parte, por ter o Deus
da Bíblia como seu Deus. Uma comunidade onde a oração (o diálogo com Deus) nos
seja uma experiência inspiradora e o cultuá-lo uma experiência tremendamente
"gostosa".
Igrejas onde a relação com Deus não se
caracteriza como "gostosa", sendo encarada mais pela ótica da
"obrigação religiosa", tendem a ser fábricas de neuróticos e
angustiados. Fazem de Deus o terrível policial que lhes está a espreita de um
erro para castigá-los. Não vêem nEle aquele em quem podem confiar e abrir seu
coração para que seja moldados segundo seu querer. A igreja em Jerusalém era
animada em sua fé porque sabia quem era o Deus que tinha e o que Ele, como seu
Deus, esperava de seus membros. Quanto a nós a razão não pode ser diferente,
nossa animação deve se fundamentar naquilo que Deus é e não somente por aquilo
que Ele pode fazer por nós ou em nós. Compreendendo que temos o Deus que
aborrece o pecado, temos que nos dedicar à santidade. Sabendo que temos o Deus
cuja estrutura é o amor, não devemos semear o ódio, mas hemos que nos amar da
mesma forma como Ele em sua Trindade manifesta amor (Cf. João 17:24). E, sendo o
Deus que expressa seu caráter e multiforme sabedoria pela igreja, é mister
deixar-mo-nos moldar pela imagem de seu Filho, que em nós o Espírito Santo está
desenvolvendo, para que, como o Deus de toda glória, seja exaltado em nossas
vidas com uma adoração verdadeira.
Conclusão
A igreja dos nossos sonhos,
fortalecida, integrada, evidenciada, equipada e animada na prática de sua fé,
não nos é nenhuma utopia eclesiástica. Antes é uma realidade perfeitamente
possível quanto plausível. Temos tanto comprovação histórica desta
possibilidade, como no caso das igrejas apostólica, e mais especificamente a
igreja em Jerusalém, quanto temos também a certeza teológica pela
universalidade dos princípios eclesiásticos bíblicos, que estão a disposição de
qualquer comunidade local de crentes em Jesus Cristo. Em muitos casos, o que
falta para a materialização desta igreja dos sonhos é uma renovação dos
conceitos pela Palavra de Deus, conforme Romanos 12:1-2. É preciso renovar a
mentalidade eclesiástica, demovendo da mente e da prática ministerial, aquilo
que não se coaduna com a natureza bíblica do caráter e ministério da igreja.
Deus não planejou a igreja para ser uma
instituição de cunho sociológico irrelevante, como às vezes se pensa e se vê na
prática de muitas delas. Ele planejou a igreja para que expresse seu caráter no
mundo, que evidencie seu ser e obra em Cristo, mediada pelo Espírito Santo. Não
podemos deixar a igreja perder sua identidade e se desvirtuar de seu triplo
ministério: o teológico, no qual se relaciona com Deus, crescendo em sua plena
adoração; o sociológico, no qual se relaciona com o mundo, testemunhando-lhe
das boas novas de salvação que há em Jesus Cristo em sua evangelização; e o
eclesiológico, no qual integra seus convertidos pela prática do amor fraternal,
edifica-os nos valores de Cristo, neles desenvolvendo a imagem do Filho de Deus
pela mediação do Espírito Santo e aplicação da Palavra de Deus e ministra graça
mutuamente entre seus membros, visando o desarrolo completo e maduro do
ministério cristão pelos propósitos de integração, edificação e ministração,
respectivamente.
Pode ser que para galgarmos o ápice da
igreja que queremos, sonhamos e que Deus deseja que sejamos, tenhamos que
reformular ou reorganizar nossas estruturas eclesiásticas, demovendo inclusive
aquilo que já se constituiu como seu marco tradicional, mas que, mesmo tendo
ganho o status de "tradicional", não se enquadra como propósito ou
prática eclesiástica legítima. Recomeçar é sempre mais difícil que começar, mas
para concertarmos os erros é preciso se saber onde se errou ou se tem errado.
Nenhuma enfermidade é curada se não for primeiro diagnosticado sua causa para
aplicação da terapia adequada e eficaz. Da mesma sorte em relação a igreja. É
ponto pacífico descobrir as causas de seus males para a partir disso, então,
empreendermos a terapia adequada e eficaz contra cada um destes males. Só
assim, não há dúvidas, de que a saúde retornará e permitirá o desenvolvimento
equilibrado da igreja como organismo vivo que é.
Uma igreja fortalecida em sua fé; que
integra seus membros em uma vida comunitária pautada pela prática do amor
cristão fraternal; que testemunha sem medo sua nova vida em Cristo; em que seus
membros mutuamente ministram graça visando seu desenvolvimento; e que anima-se na
adoração a Deus, em celebração de sua majestade, em contemplação de sua
santidade e em consagração à sua vontade, são características que evidenciam a
boa saúde de uma comunidade cristã. De igual modo, a ausência delas também
evidenciam sua enfermidade e deformidade, necessitando de terapia urgente, caso
contrário a morte prematura, antes do amadurecimento e envelhecimento será
certa como dois mais dois são quatro. E com enfermidades letais, o que mais se
espera de uma igreja ela não conseguirá. Isto é, saúde para poder se
reproduzir. Que Deus nos seja misericordioso e nos ajude a ser a igreja que Ele
quer que sejamos. E que nós, com humildade e decisão deixemo-lo agir para que
tenhamos a igreja que queremos.
AUTOR DESCONHECIDO
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