O CRISTÃO E A ESPIRITUALIDADE (1 parte)
Série: Juntos Podemos Mais
O nosso tema de
hoje é “O Cristão e a Espiritualidade”. Nossa espiritualidade como cristãos
quando vivida de forma correta e em unidade com o Corpo de Cristo produzirá uma
grande influência sobre a sociedade humana. Todas as vezes que a Igreja de
Cristo experimentou um avivamento ela provocou grandes mudanças na sociedade
onde estava inserida. Mas por que não temos visto esta influência sobre nossa
sociedade brasileira, sobre nossa pátria, uma vez que 80% de nossa população é
cristã?
Eu acredito que
isso se deve por três razões: A primeira
razão por causa da dicotomia que
recebemos da teologia católica, onde o mundo foi separado em sagrado e profano,
secular e espiritual. Falamos sobre isso no último domingo. A segunda razão por causa da institucionalização da igreja. Passamos a amar as
nossas instituições eclesiásticas mais do que o próprio Reino de Deus.
Trabalhamos mais em prol de nossas instituições do que em prol do Reino de
Deus. Discutimos e brigamos por tradições organizacionais rígidas e inflexíveis
que são totalmente baseadas nos modelos de organizações humanas e por isso
sujeitas a erros e as limitações do tempo, uma vez que os comportamentos e as
estruturas sociais humanas se transformam de geração em geração, e assim
limitamos através da institucionalização rígida e fria de nossas igrejas a
própria ação do Espírito Santo. A
terceira razão por causa de nossa teologia contemporânea que é mais voltada
para o bem-estar do ser humano em sua individualidade do que com seu
compromisso com Cristo e Seu Reino neste mundo.
Estas três
razões têm no meu entender produzido uma espiritualidade enfraquecida, egoísta,
incapaz de influenciar a sociedade humana, pois ela não é capaz de oferecer
gestos de sacrifícios, isto é, gestos que produzam beneficios para o outro e
perdas para si mesmo.
Na busca de uma reflexão sincera a respeito de nossa espiritualidade, precisamos primeiro definir o que compreendemos de espiritualidade, por isso iremos iniciar nossa reflexão definindo o conceito geral de espiritualidade.
1 – O CONCEITO GERAL DE ESPIRITUALIDADE
A espiritualidade pode ser definida
de maneira geral como uma "propensão humana a buscar significado para a
vida por meio de conceitos que transcendem o tangível, ou à busca de um
sentido ou de uma conexão com algo maior que si próprio". Você
percebe que o conceito de espiritualidade de maneira geral está ligado com a
ideia de você superar a si mesmo – transcender o tangível, ter um sentido de
vida maior que a si próprio, ou um conectar-se com algo maior que a si mesmo.
Em nossos dias a
espiritualidade não está mais condicionada somente ao campo religioso. Alguns
autores da sociologia defendem a existência de uma espiritualidade no ateísmo.
Para estes o ser humano está aberto para o ilimitado, em busca de uma
harmonização de sua vida com as demais vidas do planeta, uma experiência de
existência com os demais seres vivos. Algo mais intelectual do que exotérico.
A Organização
Mundial de Saúde (OMS) vem aprofundando investigações sobre a espiritualidade
enquanto constituinte do conceito multidimensional de saúde; atualmente, o
bem-estar espiritual vem sendo considerado mais uma dimensão do estado de
saúde, junto às dimensões corporais, psíquicas e sociais. Não é uma defesa de
uma fé em si, mas o reconhecimento de que a saúde espiritual afeta
positivamente ou negativamente as demais dimensões da vida do ser humano.
Entretanto nós
cristãos temos um conceito mais relacional a respeito de Espiritualidade. Vamos
definir o conceito cristão de espiritualidade.
2 – O CONCEITO CRISTÃO DE ESPIRITUALIDADE
Quando falamos
de espiritualidade dentro do nosso meio cristão, acredito que muitas imagens
passam nas nossas cabeças. Para alguns, espiritualidade está ligada com as
manifestações dos dons espirituais: falar em línguas, profetizar, ter visões,
etc. O que leva alguns a pensarem que as igrejas pentecostais sejam mais
espirituais que as nossas igrejas chamadas popularmente de tradicionais.
Para outros,
espiritualidade está ligada as expressões sentimentais: dar gritos de “glória a
Deus”, pular igual pipoca, girar até ficar tonto, se arrepiar todinho, cair na
unção, e outras manifestações psíquicas. Estas acreditam que a espiritualidade
está na liberdade das expressões sentimentais. Isto se tornou muito comum nas
igrejas neopentecostais. Estes tipos de manifestações também são muito comuns
nas religiões afro-brasileiras (Candomblé, Umbanda, Xangô, etc.).
Para outros,
espiritualidade está ligada a fidelidade: dizimar, ofertar, participar
ativamente de todas as atividades da igreja. Para estes a espiritualidade é compreendida no
cumprimento aos rituais, na obediência as leis. Estes veem no legalismo a
espiritualidade.
Ainda há aqueles
que consideram espiritualidade viver a vida como um monge: não ouvem músicas
seculares, não vão ao cinema, não bebem vinho e muito menos cerveja, não fazem
sexo por prazer, somente para procriar. Espiritualidade para estes só é
possível vivendo fora do mundo. Confundem o ser santo com viver fora do mundo.
Existem ainda aqueles
que acreditam que a espiritualidade cristã está ligada a proclamação pública da
fé em Cristo Jesus ou ao fato de possuir um grande conhecimento bíblico. Em
fim, há muitos conceitos de espiritualidade dentro do meio cristão. Mas, o que é de fato uma espiritualidade
cristã a luz da Bíblia?
Espiritualidade
cristã é o encontro do ser humano com seu Criador, Jesus Cristo, na cruz. Essa
espiritualidade só se torna real na vida do ser humano quando ele se rende ao
amor de Jesus e O reconhece como o único Senhor de sua vida. A espiritualidade
cristã só pode ser vivida e experimentada através do poder regenerador do
Espírito Santo, conforme lemos em João 3.5-7.
5 Respondeu Jesus: "Digo-lhe
a verdade: Ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer da água e do
Espírito. 6 O que nasce da carne
é carne, mas o que nasce do Espírito é espírito. 7 Não se surpreenda
pelo fato de eu ter dito: É necessário que vocês nasçam de novo. (João 3.5-7)
Portanto a
espiritualidade cristã não nasce do esforço humano, mas da rendição humana a
voz do Espírito Santo. Ela não é fruto das boas obras, mas da graça de Deus
revelada em Seu Filho Jesus Cristo. Entretanto uma vez nascidos de Deus pelo
poder regenerador do Espírito Santo somos convocados a desenvolvermos nossa
espiritualidade, conforme lemos em Filipenses 2.12,13.
12 Assim, meus amados, como sempre
vocês obedeceram, não apenas em minha presença, porém muito mais agora na minha
ausência, ponham em ação a salvação de vocês com temor e tremor, 13 pois é Deus quem efetua em vocês tanto o querer quanto
o realizar, de acordo com a boa vontade dele. (Filipenses
2.12,13)
Quando o
apóstolo Paulo diz “ponham em ação a salvação de vocês”, ele está dizendo
“aperfeiçoem a espiritualidade de vocês”, “desenvolvam a espiritualidade de
vocês”.
Diante desta
fala do apóstolo Paulo, eu acredito que seja importante diferenciarmos
espiritualidade de religiosidade. Devemos desenvolver nossa espiritualidade e
não nossa religiosidade, nem nossa religião.
Espiritualidade é
algo inerente do nosso ser, pois fomos criados por Deus a sua imagem e
semelhança. Somos seres espirituais necessitados da graça de Deus. Existe um
grito em nossa alma por um encontro com nosso Criador. A espiritualidade é esta
dimensão humana que antecede às religiões.
As religiões vieram
a existir pegando as expressões de espiritualidade de determinados grupos e as
transformando em conjuntos de doutrinas, crenças, símbolos, tradições, ritos e
hierarquias afirmando que aqueles que as cumpre serão religados a Deus. A religiosidade
é o indivíduo buscando se religar a Deus através da religião.
Nós cristãos não
anunciamos uma religião e nem incentivamos uma experiência religiosa, nós
pregamos um encontro com um Deus vivo e pessoal, este encontro é o ponto de partida
da espiritualidade cristã, e toda espiritualidade cristã é construída na
relação do crente com Deus.
Portanto o
desenvolvimento de nossa espiritualidade implica no desenvolvimento de nossa
relação com Deus, isso implica em um processo de maturidade.
Vejamos como
podemos desenvolver nossa espiritualidade, nossa maturidade espiritual.
3 – DESENVOLVENDO A ESPIRITUALIDADE
Creio que seja
relevante ressaltar que uma espiritualidade madura, desenvolvida, saudável não
consiste simplesmente pelas manifestações dos dons espirituais, nem
simplesmente pelas manifestações psíquicas estereotipadas no meio evangélico,
assim também como não consiste simplesmente na obediência de alguns ritos ou
mandamentos.
Todas estas
ações podem fazer parte de uma espiritualidade madura, mas elas sozinhas não
caracterizam uma espiritualidade madura. Isso porque a espiritualidade não
pode ser desmembrada em partes, ela precisa abranger todas as dimensões da
vida. Há muitas pessoas que oram em português, em línguas estranhas, jejuam,
são dizimistas, praticam boas obras, dão gritos de “Glória a Deus”, mas não são
espirituais aos olhos de Deus.
Ser espiritual
no contexto cristão é viver a espiritualidade em Cristo de forma racional e
emocional ao mesmo tempo em todas as áreas da vida. Ser espiritual na visão
cristã, bíblica é ser humano como Cristo. Jesus nunca perdeu o domínio de sua
razão e de suas emoções. Mesmo quando agia no sobrenatural, ele tinha o
controle de sua mente, de seu corpo e de suas emoções. Quanto mais espirituais
nos tornamos, mais humanos e parecidos com Cristo nos tornamos.
Acredito que uma espiritualidade desenvolvida é
altruísta enquanto uma espiritualidade infantil é egoísta. Todos nós iniciamos
nossa espiritualidade de forma egoísta, partimos de uma espiritualidade
infantil, e na medida, que nossa relação com Deus se desenvolve nossa
espiritualidade também vai se desenvolvendo e se tornando cada vez mais
altruísta.
Infelizmente
muitos cristãos mesmo tendo muitos anos de conversão permanecem numa
espiritualidade infantil. Não passaram pelo processo de amadurecimento. Por
isso é importante compreender que as práticas que apresentaremos para o
desenvolvimento de sua espiritualidade não pode estar desassociadas das demais
dimensões de sua vida. O desenvolvimento espiritual só é possível em conjunto
com o desenvolvimento intelectual e emocional. Quando falo aqui de um
desenvolvimento intelectual ou racional não estou falando de um saber
acadêmico, mas de uma compreensão da vida. O desenvolvimento emocional implica
em saber dominar suas emoções diante as muitas variáveis que a vida pode
apresentar. Na linguagem Paulina é ter domínio próprio.
O
desenvolvimento de nossa espiritualidade é na verdade o desenvolvimento de
nossa santidade. Vejamos algumas que práticas podem nos ajudar a desenvolver
nossa espiritualidade.
Ø Oração
17 Orem continuamente. (1 Tessalonicenses 5.17)
A oração é feita
por muitos mais como um instrumento para mudar o coração de Deus. Por meio dela
apresentamos a Deus nossos desejos e ficamos aguardando que Ele faça o que
pedimos. Ás vezes isso acontece, mas nem sempre.
Contudo deveríamos
orar mais com o fim de buscar o saber de Deus, de nos relacionarmos com Ele e
através deste diálogo sermos transformados por Seu saber, e assim alinharmos a
nossa vontade a Dele.
C.S. Lewis,
escritor da famosa série do cinema “As Crônicas
de Nárnia”, quando questionado sobre a importância da oração disse: “Deus
não precisa da minha oração. Sou eu quem preciso dela. A oração me aproxima de
Deus, revela minha dependência, minha fome e sede por Sua vontade, seu Reino,
sua pessoa. A oração muda principalmente a mim — minha visão de Deus, do
próximo, das circunstâncias.”
Ø
Solitude
63 Certa tarde, saiu (Isaque) ao campo para
meditar (Gênesis 24.63)
Quando falamos
de solitude estamos falando de meditação. A meditação bíblica não trata de algo
exotérico, não se refere a ficar no silêncio tentando se conectar com o
universo. Nem tampouco trata de ficar filosofando a respeito da vida ou de
Deus. Meditar na bíblia é buscar Deus de forma contemplativa, se abrindo para
compreender sua revelação.
Enquanto na
oração eu me abro a Deus por meio das palavras, na solitude eu paro para ouvir
a Deus e contemplá-lo em Sua formosura.
Ø
Comunhão
44 Todos os que criam mantinham-se unidos e
tinham tudo em comum. (Atos 2.44)
Manter-se unido
e ter tudo em comum é fundamental para o desenvolvimento de nossa
espiritualidade. Uma espiritualidade que não é centrada no outro, que não é
altruísta, é uma espiritualidade infantilizada e egoísta. (Hoje à noite pretendo
tratar mais sobre a diferença de uma espiritualidade infantilizada e egoísta de
uma espiritualidade madura e altruísta)
Ø
Missão
15 E disse-lhes: "Vão pelo mundo todo e
preguem o evangelho a todas as pessoas. (Marcos 16.15)
Enquanto nos
encontramos fazendo missões somos desafiados em todas as dimensões da vida.
Estes desafios colaboram das mais diversas formas para o desenvolvimento de
nossa espiritualidade.
Nossa conduta ética é muitas
vezes colocada a prova no trabalho, na escola, nos negócios, nas relações
pessoais. Nossa paciência é constantemente testada no transito, no elevador, na
fila do caixa, no tratar com aqueles que pensam diferente de nós.
Os desafios da missão nos leva a
necessidade de orarmos, meditarmos, buscarmos a comunhão dos irmãos para com
eles aprendermos e encontrarmos apoio para continuarmos sendo cristãos no mundo
e nos desenvolvendo espiritualmente.
REFLEXÃO
FINAL
Quero concluir
ressaltando que ser espiritual aos olhos de Deus não é simplesmente praticar
obras pertencentes ao campo religioso. Uma pessoa espiritual é aquela que é parecida
com Jesus, pois Ele foi o ser humano perfeito, conectado com Deus e com todas
as dimensões da vida humana.
Por isso
entendemos que não são as atitudes religiosas, sejam elas do contexto
pentecostal ou tradicional que definem sua espiritualidade, mas sim, viver da
maneira que você foi criado por Deus para viver, se deixando ser guiado
pelo Espírito Santo em uma vida prática com Deus dentro deste mundo tenebroso
em que nos encontramos, como Jesus viveu.
Pr. Cornélio Póvoa de Oliveira
20/06/2021 (manhã)
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