O CRISTÃO E A ESPIRITUALIDADE (2 parte)
Série: Juntos Podemos Mais
Daremos continuidade a nossa reflexão da manhã “O
Cristão e a Espiritualidade”. Hoje de manhã falamos sobre o conceito geral de
espiritualidade e também o conceito cristão de espiritualidade. Vimos também
algumas práticas necessárias para o desenvolvimento de nossa espiritualidade.
Hoje à noite iremos mostrar a diferença entre uma espiritualidade infantil e
uma espiritualidade madura.
Vamos iniciar nossa reflexão apresentando as características de uma espiritualidade infantil.
1 – CARACTERÍSTICAS
DE UMA ESPIRITUALIDADE INFANTIL
Hoje pela manhã falamos que espiritualidade
cristã é o encontro do ser humano com seu Criador, Jesus Cristo, na cruz. Esse
é o ponto de partida da espiritualidade cristã. Essa espiritualidade só se
torna real na vida do ser humano quando ele se rende ao amor de Jesus e O
reconhece como o único Senhor de sua vida.
Quando nós
cremos em Jesus Cristo recebemos o Espírito Santo de Deus e a vida de Deus
passa a ser presente em nós. Dessa forma nós que nos encontrávamos mortos
espiritualmente somos vivificados pela presença do Espírito Santo de Deus em
nós. A Bíblia chama esta experiência de novo nascimento. A espiritualidade
cristã só pode ser vivida e experimentada através do novo nascimento, conforme
lemos em João 3.5-7.
5 Respondeu Jesus: "Digo-lhe
a verdade: Ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer da água e do
Espírito. 6 O que nasce da carne
é carne, mas o que nasce do Espírito é espírito. 7 Não se surpreenda
pelo fato de eu ter dito: É necessário que vocês
nasçam de novo. (João 3.5-7)
Uma vez nascido do Espírito o cristão começa o processo
de desenvolvimento de sua salvação, de sua espiritualidade ou ainda de sua santidade.
Veja bem estamos falando de um processo de desenvolvimento.
A nossa vida espiritual não se inicia já madura, pelo
contrário ela se inicia infantilizada. Assim como não nascemos adultos na vida
natural, também não nascemos na vida espiritual. Existe um processo que precisa
ser trilhado para alcançarmos a maturidade espiritual. Este processo inclui
práticas como oração, meditação, comunhão, missão que colaboram para o
desenvolvimento espiritual quando praticadas juntamente com as outras dimensões
da vida humana – o intelecto, o corpo físico e a alma.
Nossa relação com Deus é espiritual, mas também é
intelectual, física e emocional, conforme lemos em Mateus 22.37.
27 Ele respondeu: "‘Ame o
Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de
toda a sua alma, de todas as suas forças e de todo o seu entendimento’...
(Lucas 10.27)
A nossa espiritualidade ela começa quase que totalmente verticalizada,
ela é uma relação exclusiva com Deus e totalmente dependente da ação de Deus em
nós. O Espírito Santo de Deus é quem nos faz tomar conhecimento do pecado, da
justiça e do juízo de Deus. Ele inicia um processo de transformação de nossa
mente por meio da Palavra de Deus. Nesta fase de nossa infância espiritual nos
descobrimos como seres humanos e descobrimos o amor imensurável de Deus por
nós.
O próximo ainda não faz parte da nossa espiritualidade,
da nossa existência como ser humano. Nesta fase ainda nos vemos como seres individualizados;
assim como Adão e Eva passaram a se ver depois de terem comido o fruto da
árvore do conhecimento do bem e do mal. Nesse aspecto nossa espiritualidade se
inicia de forma egoísta onde minha relação com Deus existe centrada e
construída basicamente a partir das minhas necessidades, dos meus sentimentos. Ainda
estou me relacionando com Deus em busca de preencher o vazio existencial de
minha alma. Não nos sentimos responsáveis pela vida do outro. Não nos sentimos
responsáveis pelo meio ambiente onde estamos inseridos. Não nos percebemos como
unidade com as demais pessoas.
Nossas orações são voltadas para as nossas necessidades
e para os nossos anseios. Oramos por aquilo que afeta a nossa dimensão pessoal
com ser humano. O nosso “eu” ainda fala alto na relação com Deus. A nossa busca
por Deus e pelo poder de Deus tem mais a ver com o nosso desejo de experimentar
Deus do que com revelar o amor de Deus ao mundo.
A nossa relação com a comunidade também é voltada para o
nosso próprio “eu”, pois nos relacionamos inicialmente com os irmãos com o fim
de recebermos deles alimento espiritual e bênçãos espirituais. Nesse sentindo a
nossa relação com a comunidade também é uma relação egoísta, voltada em busca
de nossas necessidades. Precisamos crescer, precisamos amadurecer
espiritualmente. Existem muitos crentes com dez, vinte, trinta anos na igreja
que ainda continuam na infância espiritual.
Vejamos as características de uma espiritualidade
madura.
2 –
CARACTERÍSTICAS DE UMA ESPIRITUALIDADE MADURA
Creio que ninguém no mundo tem dúvida de que Jesus
possuía uma espiritualidade madura, perfeita. Até mesmos outras religiões
reconhecem essa verdade. Assim sendo iremos analisar a espiritualidade de Jesus
e dela extrairmos marcas de uma espiritualidade madura.
Na medida em que desenvolvemos nossa relação com Deus e
que todo o nosso ser vai sendo colocado sob o domínio do Espírito Santo, vamos
aos poucos nos tornando mais como Jesus, isso significa que vamos nos tornando
humanos como Jesus, possuidores de uma espiritualidade semelhante a de Jesus.
A espiritualidade de Jesus possui marcas muito claras,
não estou falando de práticas que colaboram para a vida espiritual, como
oração, jejuns, meditação, etc. (que fique claro que estas praticas colaboram
para o sustento de nossa espiritualidade e devem ser praticadas), mas estou
falando de uma cosmovisão de vida que determina o nível de espiritualidade. A
espiritualidade de Jesus, no meu entender, não é determinada pelo tempo que ele
dedicava as orações, jejuns e meditações, mas por sua compreensão da vida como
um todo.
Eu vou tentar apontar algumas destas marcas, visando nos
ajudar a percebê-las, mesmo entendendo que não é bom separar algo que pertence
a um todo. Quando fazemos isso, temos uma forte tendência de enxergarmos as
coisas de forma fragmentada e não inteira. Acho que esse é o grande erro da
teologia sistemática. Muitos pastores se relacionam com um Deus fragmentado.
Eles se relacionam com algumas características de Deus e não com o Deus todo.
· Primeira marca
de uma espiritualidade madura: Amor a Deus e ao Próximo
O amor ao Pai é evidenciado no amor ao próximo. A
relação de amor de Jesus com o Pai O levou a encarnação e a morte na cruz pela
humanidade.
A Bíblia nos ensina que não se pode amar a Deus sem amar
ao próximo. No texto que lemos de Lucas 10.27 percebemos que o primeiro
mandamento é amar a Deus, mas o texto nos mostra que aquele que ama a Deus é chamado
para amar o próximo.
27 Ele respondeu: "‘Ame o
Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todas as suas
forças e de todo o seu entendimento’ e ‘ame o seu
próximo como a si mesmo’" (Lucas 10.27)
· Segunda marca
de uma espiritualidade madura: Vida Comunitária
Como eu disse, uma coisa está amarrada a outra. Jesus
ama profundamente o Pai e junto com o Pai ele ama toda criação. Ele ama você
profundamente, mas ele me ama profundamente também, por isso nos fez para
vivermos em comunidade com Ele, num unidade harmônica.
Deus ao criar o ser humano, ele o fez a sua imagem e
semelhança e soprou sobre as narinas do homem o fôlego de vida, isto significa
que a vida do Espírito de Deus foi soprada em nós e assim nos tornamos almas
viventes. Nascemos conectados com Deus na criação e Deus nos deu a capacidade de
gerarmos vida, de procriarmos.
Geramos vida a partir de nós, isto é, a vida gerada está
atrelada as nossas vidas e assim estamos todos conectados uns aos outros. Não
existe vida humana independente. Somos uma grande comunidade, porque Deus
projetou assim. De tal forma o que um fez produziu efeito sobre todos, conforme
lemos em Romanos 5.19.
19 Logo, assim como por meio da
desobediência de um só homem muitos foram
feitos pecadores, assim também, por meio da obediência de um único homem muitos serão feitos justos. (Romanos 5.19)
Deus nos vê de forma comunitária. Ele nos trata de forma
comunitária. Isso não significa que Deus não nos vê individualmente, mas que
seus planos e ações neste mundo são para a comunidade humana e não para um
indivíduo humano, pois ele ama todo ser humano. Ele deseja o bem de todos e não
somente daqueles que estão próximos dele.
Jesus enxergava assim e vemos isso claramente no texto
de Lucas 8.19-21.
19 A mãe e os irmãos de Jesus
foram vê-lo, mas não conseguiam aproximar-se dele, por causa da multidão. 20 Alguém lhe disse: "Tua mãe e teus irmãos estão lá
fora e querem ver-te". 21 Ele lhe respondeu: "Minha
mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a praticam".
(Lucas 8.19-21)
Jesus não desprezava sua família, mas ele sabia que a
vida se estende além de sua família, além de seus discípulos. Quando Jesus orou
por seus discípulos, ele orou também por aqueles que viriam a crer Nele. Você
já orou por alguém que ainda nem nasceu?
Na medida em que crescemos espiritualmente o Espírito
Santo vai nos conduzindo a uma vida em comunidade e a espiritualidade infantil,
que tem seu início centrada em nós, e por isso a chamo de uma espiritualidade
egoísta, não necessariamente por ser má, mas por ser voltada apenas para uma
relação vertical, onde me vejo como o filho único de Deus Pai, vai se
transformando numa espiritualidade madura e consequentemente voltada para o
próximo, para a comunidade. Meu horizonte se amplia e isso afeta minha oração e
minha responsabilidade com as demais vidas.
· Terceira marca
de uma espiritualidade madura: Altruísmo
O amor do Pai levou Jesus a nos amar profundamente de
forma que ele abre mão de sua glória, de seu poder, de sua riqueza para que nós
pobres pudéssemos ser ricos, para que nós pecadores pudéssemos ser
justificados, para que nós impuros fossemos revestidos com sua glória, é isso
que Paulo está dizendo em 2 Coríntios 8.9.
9
Pois vocês conhecem a graça de nosso
Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, se fez pobre
por amor de vocês, para que por meio de sua pobreza vocês se tornassem ricos. (2 Coríntios 8.9)
Jesus se sacrificou por todos. Ele abriu mão de seus
interesses pessoais por amor a nós seres humanos.
Uma espiritualidade madura é aquela que é altruísta,
capaz de um gesto de benefício em prol do outro, implicando em perda para si
mesmo. A morte de Jesus beneficiou a todos nós, mas trouxe sobre Ele
sofrimento.
Sacrificar é abrir mão de algo, com o fim de beneficiar
outro, quando abrir mão lhe custa algo valioso. Quando se abre mão de algo, mas
isto não lhe custa nada, você não sacrificou nada. Uma espiritualidade adulta é
altruísta, como Jesus o foi. A si mesmo se entregou por nós.
REFLEXÃO FINAL
Essas marcas de espiritualidade madura encontradas em Jesus
Cristo, eu penso que só foram possíveis por causa da cosmovisão que Jesus
possuía a respeito de si na relação com o Pai, com a humanidade e com o mundo
criado.
Acredito que se buscarmos ter uma relação madura com o
Pai, o Espírito Santo desenvolverá em nós uma cosmovisão a respeito de nós na
relação com o Pai e com o mundo, como a cosmovisão de Jesus, teremos a mente de
Cristo, e então alcançaremos uma espiritualidade madura.
O reflexo de uma
espiritualidade madura se mostrará em nossas orações, meditações, jejuns, mas principalmente
na forma como lidamos com o nosso próximo e com o mundo criado.
Nossas orações não estarão mais centradas em nós e no
circulo de relações próximos a nós. Quando orarmos por emprego para os nossos
filhos, iremos nos lembrar que existem em nosso país milhares de pessoas
desempregadas. Então abriremos mão de orar por nós e pediremos para Deus prover
trabalho remunerado para todos. Quando nos sentirmos injustiçados, nos
lembraremos que muitos também assim se sentem, e oraremos por eles e não por
nós. Quando formos orar pelos nossos irmãos que estão com covid-19, nos
lembraremos que o mundo está com covid-19, e oraremos pelo mundo e não somente
por nós. Nossa relação horizontal se estenderá. Nos veremos na dor e na alegria
de cada ser humano.
Nos veremos responsáveis pela intercessão do mundo e não
apenas pelo nosso circulo familiar e relacional. Continuaremos orando por nós,
por nossos filhos, por nossos familiares, mas não conseguiremos deixar de orar
pelo mundo, pois nos sentiremos responsáveis por todos, porque a vida do
Espírito nos conecta com todos. Assim como Jesus compreenderemos que nossa
família é todos que confessam a Jesus Cristo como Senhor de sua vida e que o
desejo de Deus é alcançar todos os homens com seu amor.
A relação entre nós irmãos e com as demais pessoas será dominada
por um sentimento altruísta. Estaremos sempre prontos a considerar o outro com
maior honra. Estaremos sempre dispostos a perder algo para que o outro ganhe.
Teremos o mesmo sentimento de Jesus. Ele não fez nada por ambição egoísta ou
por vaidade. Assim devemos proceder uns com os outros, assim devemos proceder
em todas nossas relações (Fp 2.3-5).
3 Nada façam por ambição egoísta
ou por vaidade, mas humildemente considerem os outros superiores a si mesmos. 4 Cada um cuide, não somente dos seus interesses, mas
também dos interesses dos outros. 5 Seja a atitude de vocês a mesma
de Cristo Jesus, (Filipenses 2.3-5)
Cuide não somente dos seus interesses, mas também dos
interesses dos outros. Maior prova de que Jesus fez isso é a cruz. Ele morreu
cuidando dos nossos interesses.
Cuidar dos interesses dos outros é sermos solidários uns
com os outros. Essa semana perdemos nosso irmão Rafael Mendes. Ele viveu de
forma solidária. Ele buscou melhorar como pôde a vida de outros. Precisamos
agora ser solidários a sua família. Ajudá-los no que precisarem e apoiá-los
através das orações, mas também visitando-os, estando presente com eles. Assim
também com as demais famílias de nossa igreja que perderam seus entes queridos.
Quem destas famílias você visitou de nossa igreja? Você visitou a família de
seus amigos que veio a falecer neste tempo de covid-19? Ao menos ligou para
saber como estão, para oferecer a eles uma oração.
Cuidar dos interesses dos outros é viver de maneira
sustentável também. É assumir a responsabilidade com o mundo criado e com as necessidades
das demais pessoas no mundo. É pensar em que mundo você estará deixando para a
futura geração. É orar por eles hoje, como Jesus orou por nós e morreu por nós
antes mesmo que viéssemos a existir. É ser altruísta hoje para que a futura
geração encontre um mundo melhor.
A Bíblia nos ensina a vivermos comunitariamente. Jesus nos
fez um com todos os povos, de todos os tempos. A lógica da revelação de Deus
para a vida é a vida em unidade, solidária, altruísta. A lógica da vida em Deus
é se alegrar vendo o outro feliz.
Portanto uma espiritualidade madura é marcada por uma
atitude altruísta diante de Deus e diante o mundo criado. Vamos buscar com todo
o nosso ser viver uma espiritualidade como Cristo viveu. Se você deseja isso,
você só precisa morrer para si mesmo e começar a ver o mundo através dos olhos
de Deus. Deus te abençoe!
Pr. Cornélio Póvoa de Oliveira
20/06/2021 (manhã)
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