A DIMENSÃO DA
IGREJA COMO POVO DE DEUS NA TEOLOGIA BÍBLICA
Esta
monografia é de conclusão de curso no período de 1996-1999, no STL -Seminário
Teologia de Londrina, hoje, STAGS - Seminário Teológico Rev. Antonio de Godoy
Sobrinho da IPI.
Irani
José Costa
INTRODUÇÃO
O presente trabalho não tem
nenhuma pretensão de esgotar um assunto tão rico e fascinante, mas apenas abrir
uma discussão mais ampla e objetiva quanto à recuperar essa dimensão da Igreja
como Povo de Deus.
Entendemos que a categoria da
Igreja como povo de Deus serve de elemento aglutinador dos fiéis e, que implica
num status jurídico de pertença onde todos podem ter acesso a uma vida
digna, à terra, à uma identidade legitimada pela comunidade e, a caminho da
construção de uma nova sociedade, uma comunidade alternativa, diferenciada.
Veremos que o Antigo Testamento
mostra o chamado de Abraão, e a formação do povo de Deus que se confirmou na
aliança de Javé com Israel elegendo-o dentre os povos, para fazer dele o seu
povo.
Como também no Novo Testamento,
veremos que a Igreja, através de Cristo, é o novo Israel de Deus. Mediante
Cristo todos poderiam fazer parte: judeus e gentios, surgindo o verdadeiro povo
de Deus. E, como resposta a essa pertença e nova identidade, a Igreja desempenhará
a missão recusada por Israel de ser bênção, e abençoar todos os povos mediante
a obediência.
Mais, mostrar que a Igreja como
povo de Deus pode e deve ser uma comunidade de eleitos para adorar a Deus,
servindo ao próximo; que vive em comunhão fraterna e solidária com os seus, que
acolhe os excluídos, que proclama as mensagem libertadora de Cristo mediante a
instrumentalização do Espírito Santo que os torna, verdadeiramente, povo de
Deus.
O exame de um tema como o nosso necessariamente
nos obrigou a penetrar na obra de outros escritores, e, como já disse Alan
Richardson, até mesmo o anão enxerga longe quando encontra um gigante que lhe
permite instalar-se sobre seus ombros.
A DIMENSÃO DA IGREJA COMO POVO DE
DEUS NA TEOLOGIA BÍBLICA
I - A NOÇÃO DE ISRAEL COMO POVO
DE DEUS NO ANTIGO TESTAMENTO
A linha principal da tradição do
Antigo Testamento revela que Deus escolhe das muitas nações que existem no
mundo um único povo, que seja sinal de salvação, pois, na medida em que cumpre
sua missão, as nações vão aprender deste povo de Deus (Is 2.1-4).
A iniciativa é divina. A eleição
e chamado de Abraão são inteiramente frutos da ação proposital de Deus. Abraão
era um arameu de ascendência pagã (Gn 11.26-29) e originário de uma família
idólatra (Js 24.2), logo, ele não poderia reivindicar qualquer mérito na
escolha de Deus.
1.1 - A Dimensão de Israel como
Povo de Deus começa com um homem: Abraão
1.1.1 - O Chamado de Abraão
Em termos bíblicos, Javé, em sua
sabedoria infinita e soberania inquestionável, acolhe e escolhe um único povo,
para fazer dele sinal de salvação. Esse fato começa com uma família: em Abraão
(Gn 17.1-8), num clã, num grupo, num povo pequeno.
Assim, no começo da história de
Israel, não se encontram grupos, tribos etnicamente homogêneas. Pelo contrário,
deparamos famílias, grupos e tribos de origens bem diferentes, que eram
denominados pelo termo Hapiru, que se referia às pessoas sem filiação
familiar no sentido sociológico. Eram estrangeiros, cativos e escravos e de status
inferior dentro de um reino. A família do patriarca Abraão enquadrava-se nessas
características. Vivia em semi-desertos e estepes. Limitava-se a ocupar áreas e
caminhos onde haviam poços de água suficiente para o rebanho.
É neste contexto de peregrinação
que Javé convoca Abraão:
"O Senhor disse a Abraão:
Parte da tua terra, da tua família e da casa de teus pais para a terra que eu
te mostrarei. Eu farei de ti uma grande nação e te abençoarei. Tornarei grande
o teu nome. Tu seja uma bênção. Eu abençoarei os que te abençoarem, e quem te
injuriar, eu o amaldiçoarei: em ti serão abençoadas todas as famílias da
terra." (Gn
12.1-3)
Portanto, em Gn 12 encontramos a
resposta de Deus para a dispersão humana (Gn 11.1-9). A eleição e o chamado de
Abraão são manifestações da graça de Deus para com um povo, mas visando todos
os povos da terra.
1.1.2 - Aliança é estendida aos
seus descendentes: Israel
Através do chamado de Abraão, sua
fé e obediência ao chamado de Javé nasce o povo de Israel e, por conseguinte, a
aliança de Javé com o patriarca abrange e se estende a toda a sua descendência -
o povo de Israel.
Da mesma forma que Abraão, seus
descendentes (Êx 6.7; Lv 26.12; 29.12; II Sm 7.24; 11.4.) deveriam lembrar-se
constantemente de que sua eleição e chamado não se baseavam em seus próprios
méritos, mas na iniciativa de Deus em amá-los e chamá-los dentre as nações (Dt
7.6-8).
Javé elegeu seu povo como
instrumento a seu serviço para anunciar
a salvação aos povos de toda
terra e conduzir assim o mundo inteiro no reconhecimento da glória de Deus. A
escolha de Israel como povo de Deus tinha como objetivo testemunhar a glória do
Deus criador, libertador e redentor de todas as nações.
Assim, conforme a teologia
bíblica, Deus impõe sua soberania ao escolher um povo. É a pedagogia divina que
começa com um pequeno grupo, e, no entanto, inclui o mundo inteiro, isto é,
através do exemplo daqueles que foram chamados primeiro.
O vocábulo am (povo)
contrapõe-se ao de goi, designado ao povo de Israel que o diferencia dos
outros, e que se torna o objeto da eleição generosa de Javé. Os termos
correspondentes no Novo Testamento e na versão dos Setenta são os de lao,j e e;q noj,
com idêntica
diferença de sentido. A natureza de Israel como povo se traduzem perfeitamente
pela expressão lao,j q eou/ ou, simplesmente por sua forma
arcaica lao,j .
Todavia, ser povo de Deus (~
[ ;
- am) não deve levar ao egoísmo religioso ou inclusive à xenofobia; somente
pode haver uma configuração autêntica de obediência à fé e ao serviço para a
salvação dos povos. Não se vive para si mesmo, senão somente para Javé e, deste
modo, para outros povos (
y w g - goyim). Assim, esta eleição e
este chamado podem ser entendidos não como um mero privilégio, mas como uma responsabilidade
para com as nações da terra.
Nesta predileção se concentra
toda a dignidade religiosa de Israel. Javé é o seu Deus e Israel é seu povo.
Israel toma consciência de ser povo eleito, de sua unidade nacional e
religiosa, de sua missão de ser sinal para todos os povos, desde o momento em que Javé interveio sobre a
escravidão do Egito:
"Por isso dize aos filhos de
Israel: Eu sou o Senhor. Eu vos farei sair das corvéias do Egito.
Libertar-vos-ei da sua servidão. Eu vos reivindicarei com poder e autoridade. Tomar-vos-ei
como meu povo, e para vos eu serei Deus. Conhecereis que sou eu, o Senhor,
que sou vosso Deus; aquele que vos faz sair das corvéias do Egito". (Grifo nosso). (Êx 6.6-7)
Neste mesmo sentido se entende e
confirma a idéia da aliança:
"Para vós outros olharei, e
vos farei fecundos, e vos multiplicarei, e confirmarei a minha aliança convosco
(...) porei o meu tabernáculo no meio de vós, e a minha alma não vos
aborrecerá. Andarei entre vós e serei o vosso Deus, e vós sereis o meu
povo". (Lv
26.9-12)
Israel, portanto, tornou-se o
povo escolhido dentre todos os outros povos, era propriedade exclusiva de Javé.
Israel tornou-se o lao,j de Javé, com o qual Deus fez uma
eterna aliança que se assenta, do início ao fim, na fidelidade de Javé. Seu conteúdo
será eternidade irrevogável (Êx 32.13; Lv 26.42; Dt 4.31). Esse povo, segundo
Stenzel, realiza assim o seu dogma nacional, o indissolúvel complexo
étnico-religioso de ser o povo de Deus.
Mas a eleição não se destina a
criar uma casta senhorial auto-suficiente e autólatra, mas missionários a serem
enviados ao mundo e a dar testemunho (Is 43.10; 49.6; 60.3; Jr 1.5). R. P.
Shedd argumenta que "a missão de Israel às nações tinha por objetivo atraí-las
ao Deus de Israel, para que assim aprendessem a obedecer e a adorar ao Deus
verdadeiro e crer nele". O desejo de Javé era fazer cumprir a promessa
feita à Abraão. Sua meta era fazer de Israel um sinal elevado de visitação e
bênção a todos os povos: "para a salvação dos muitos pelos poucos, dos
orgulhosos e poderosos pelos fracos e oprimidos" .
Assim, podemos afirmar que a
eleição e o chamado do povo de Deus no Antigo Testamento têm sua base na
iniciativa divina, no propósito de que através deste povo outros sejam
alcançados e abençoados. O modo através do qual Israel viria a ser usado é
desenvolvido ao longo da história da salvação. Em Gênesis 12 podemos encontrar
em forma embrionária a natureza e propósito do povo de Deus no mundo.
1.1.3 - O Fracasso da Aliança: Desobediência
e Apostasia
No entanto, infelizmente, Israel
não obedeceu, não cumpriu a missão pelo qual Javé o designara de ser luz para
as nações (Is 42.6). A história de Israel nos mostra que, ao invés de tornar o
nome de Deus conhecido e temido entre os povos da terra, Israel profanou aos
olhos de todas as nações (Ez 36.22-23). Ele se afastou de Deus para a presença
dos ídolos (Jr 5.19; 18.15; Ez 14.5-6). Seus líderes e juízes tornaram-se corruptos,
favorecendo o rico e oprimindo o pobre (Is 3.14-15; Am 22.6-8; 5.7, 10-12; Mq
3.1-4,9-11). A desigualdade econômica e social prevaleceu (Is 5.8; Am 4.1; Mq
2.1-5). Seus pastores eram falsos (Mq 3.5-8,11).
O profeta Oséias fala da
apostasia presente de Israel e de sua salvação escatológica. Oséias foi
instruído a chamar um de seus filhos de "não-meu-povo", pois o Israel
rejeitado não era mais o povo de Deus, e ele não era mais o seu Deus (Os 1.9;
Am 3.2).
"Só no profeta Oséias é que
Israel, por sua apostasia de Iahweh, perde inteiramente de forma provisória o
caráter de povo de Deus: torna-se "não-povo"(Os. 1.9). Mas Oséias
expressa a um só tempo a esperança de que num tempo posterior, Iahweh voltará
receber Israel como meu povo."
(2.25)
A resposta de Israel não
corresponde à ação de Deus em seu favor. É uma história de fracasso e de
traição, de queda e de infidelidade: uma história de pecado. Assim, Israel
aprofunda a sua crise, tanto política quanto religiosa que resulta na queda do
Estado como juízo e castigo pela conduta e pecados do povo. Mesmo diante do
chamado de Deus para o arrependimento, Israel gradualmente se esqueceu da sua
natureza particular como povo de Deus e do seu propósito para servir entre as
nações.
Entretanto, e no mesmo contexto
do anúncio de punição que emerge nos escritos proféticos o tema do "remanescente".
O profeta declara: "Eis que os olhos do Senhor Deus estão contra este
reino pecador, e eu o destruirei de sobre a face da terra; mas não destruirei
de todo a casa de Jacó, diz o Senhor" (Am 9.8).
Assim, quanto maior o
distanciamento de Israel, tanto maior era a esperança em um novo Israel,
formado de novo por Deus:
"Hei de dar-lhes um coração
leal; porei neles um espírito novo; eu lhes tirarei do corpo o seu coração de
pedra e lhes darei um coração de carne, para que caminhem segundo minhas leis,
guardem os meus costumes e os cumpram. Serão para mim um povo e eu serei para
eles Deus." (Ez
11.19-20; cf. 14.11; 36.28; 37.23; Jr 7.23; 24.7; 30.22; 32.37-40)
1.2 - A Expectativa de um Novo
Povo Escatológico
O que era para ser desfrutado
como posse presente torna-se agora, depois do fracasso do povo da aliança,
aspiração de promessa para o futuro. Israel, Povo de Deus, torna-se um conceito
escatológico: Javé tornar-se-á de novo o Deus de Israel, voltará a ser o povo de
Javé; o Fim dos Tempos restaurará de novo o começo dos tempos; Javé libertará
de novo Israel, salvá-lo-á, e conquistá-lo-á; terá misericórdia do seu povo e
perdoar-lhe-á os seus pecados. Serão chamados filhos do Deus vivo (Os 1.10).
Serão um novo povo e um espírito novo. O Espírito do Senhor será derramado por
sobre o povo (Jl 2.28-32) e a circuncisão do coração tomará o lugar da
circuncisão da carne (Jr 4.4; 24ss; Dt 30.6).
Portanto, a expectativa
escatológica rompe a barreira nacionalista e a nova comunidade escatológica: a
Igreja toma para si o conceito de Povo de Deus baseada pela fé no Senhor Jesus
Cristo. Ao mesmo tempo, o grupo dos discípulos é prefiguração daquilo que o
Israel escatológico, reconstituído em todos seus membros, deve ser um dia.
É o que veremos a seguir, agora,
sob a perspectiva bíblica no Novo Testamento.
II - A NOÇÃO DA IGREJA COMO POVO
DE DEUS NO NOVO TESTAMENTO
2.1 - A dimensão da Igreja como
povo de Deus começa com um homem: Jesus Cristo
O ministério de Jesus era
dirigido a Israel e desejava reuni-lo e fazer dele o verdadeiro povo de Deus e,
mesmo na sua morte, manteve sua missão vinculada para com Todo-Israel.
A constituição dos doze é uma das
indicações de que Jesus se dirige a Israel. O grupo dos discípulos não foi concebido
como substituto ou sucessor de Israel, mas devia estar aberto e orientado para
Israel. Ele deveria prefigurar o Israel escatológico; ele deveria representar,
como sinal, aquilo que em si deveria ter acontecido em Todo-Israel.
2.1.1 - A Aliança é estendida aos
seus descendentes: a Igreja
Após o evento morte/ressurreição
de Cristo, os discípulos de Jesus, compreendem-se como o verdadeiro Israel, não
só como o verdadeiro mas, ao mesmo tempo, como o novo Israel. O fundamento era
a fé mediante a experiência pessoal no ressuscitado. Para os que criam, tinham
como cumpridas em Cristo as promessas do Antigo Testamento.
Para Lohfink, essa
autocompreensão mostra-se primeiramente no seu comportamento. Os
discípulos deixam a Galiléia e vão para Jerusalém. A razão é escatológica.
Estavam convencidos de estarem no meio dos acontecimentos finais e, conforme a
fé judaica, os acontecimentos finais tem início em Jerusalém.
Outro fato era quanto à questão
do batismo (At 2.38-42). O batismo é pensado como sacramento escatológico para
Israel: diante do fim iminente, o povo de Deus deve ser selado para poder
subsistir no juízo do Filho do Homem. Ainda um terceiro fenômeno destaca a
autocompreensão da comunidade primitiva, o círculo dos doze é completado por
eleição (At. 1.15-26). Os doze são testemunhas escatológicas contra Israel.
Lohfink complementa: a
reconstituição escatológica de Israel, começada por Jesus, está sendo
continuada pela comunidade pós-pascal dos discípulos em fidelidade a Jesus.
A Igreja que consiste tanto de
judeus como de gentios tornou-se os ramos da oliveira - o povo de Deus - o
verdadeiro Israel. Chama-se a si mesma a "Ekklesia de Deus" (I
Co 15.9; Gl 1.13). No grego, etimologicamente, ekklesia significa
reunião pública, assembléia, reunião da comunidade política. No entanto, a
versão das Setenta, em muitas passagens, traduz o termo qahal, isto é, a
reunião do povo da aliança do Antigo Testamento por ekklesia. É
compreendida como o verdadeiro povo de Deus. Os cristãos quando se chamam a si
mesmos de "Ekklesia" de Deus, devem ter-se compreendido como o
verdadeiro Israel.
Mesmo depois da abertura para a
aceitação de gentios e pagãos incircuncisos, a idéia de ser povo de Deus é
mantida. Todas as comunidades que professam sua fé no Cristo ressurreto, mesmo
as comunidades em que os cristãos vindos do paganismo eram em maior número se
consideram a si mesmas como povo de Deus.
Na primeira epístola de Pedro, o
autor, referindo-se à Igreja de Cristo, concede títulos aos cristãos que são
tomados diretamente do modo como se descreve o povo de Deus no Antigo
Testamento (Êx 19.5-6; 23.22. Is 43.20; 61.6). Os cristãos assumem tais títulos
como o novo Israel de Deus e, o autor da carta, sintetiza os privilégios e as responsabilidades
do novo povo de Deus:
"Vós, porém, sois raça
eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a
fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa
luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que
não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia." (I Pe 2.9-10)
Observando a comunidade cristã
primitiva, cônscias de sua pertença à Igreja como povo de Deus, podemos
constatar que esta testemunhava não apenas pela proclamação (At 2.1-41), mas
também pelas suas obras, comportamento e estilo de vida (At 2.44-47). A
conseqüência disso é que a comunidade cristã contava com a simpatia de todo o
povo, e o Senhor acrescentava, dia a dia, os que iam sendo salvos (At 2.47).
2.2 - A Noção de Paulo sobre a
Igreja como povo de Deus:
O apóstolo São Paulo trabalhou e
aprofundou a questão teológica deste termo: Igreja, povo de Deus e atribuiu-o
aos cristãos vindos do paganismo como "descendência de Abraão" (Rm 4,
Gl 3). Todos os que crêem em Cristo, são os verdadeiros descendentes de Abraão,
portanto, o verdadeiro povo de Deus. A teologia paulina não privilegia nenhuma
etnia: os benefícios e privilégios de Israel valem para todos o que crêem em
Cristo: Abraão é seu pai (Rm 4.12); são herdeiros (Gl 3.29; são filhos da
promessa (Gl 4.28); são os eleitos (Rm 8.33); são chamados (Rm 1.6s); são os
amados (Rm 1.7); são os filhos de Deus (Rm 8.16; Gl 3.26).
Na teologia paulina, esses
conceitos eram atribuídos ao contexto da idéia de povo de Deus. Aqueles que
professam sua fé em Cristo estão sob a nova aliança do fim dos tempos (2 Co
3.6); refletem a glória do Senhor, o que antes, acompanhava e beneficiava
apenas o povo de Israel (2 Co 3.8); são templo de Deus, habitação do Espírito
Santo (1 Co 3.16); são a plantação de Deus (1 Co 3.5-9); são o edifício de Deus
(1 Co 3.9); são os verdadeiros cincuncisos (Fl 3.3), pois a mesma se dá no
coração e pelo Espírito (Rm 2.29).
É evidente que Paulo não trata a
Igreja como o verdadeiro Israel, expressa-o indiretamente, trata-o como "Israel
segundo o Espírito", o mesmo vale para os outros autores dos escritos do Novo
Testamento (Tg 1.1). Esse passo teológico já foi dado no século primeiro pelos
autores dos evangelhos: "Por isso vos afirmo que o Reino de Deus vos
será tirado e confiado a um povo que produza seus frutos." (Mt 21.43;
8.12; Lc 20.16)
Portanto, já não mais se fazia
necessário fazer parte da nação judaica para tornar-se povo de Deus, apenas fé em Jesus Cristo era condição
suficiente para isso. Agora, todos aqueles que crêem, quer judeus, quer
gentios, fazem parte do novo povo de Deus.
2.2.1 - A vinculação do Israel
com a Igreja:
O apóstolo Paulo não desqualifica
o Israel descrente na sua função histórico-salvífica, por isso elaborou uma
teologia perene que vincula a igreja com a sinagoga (Rm 9-11). Por exemplo:
Foi devido ao fracasso de Israel
que a salvação alcançou as outras nações (11.11);
O fracasso de Israel serve como
advertência à Igreja. Assim como Deus não poupou a Israel, também não poupará a
Igreja descrente. (11.20-22);
A Igreja pode aprender com Israel
sobre a fidelidade de Deus. (11.29; 11.1; 11.12; 11.26s).
Despertar o ciúme de Israel para
que, assim como a Igreja, alcancem a fé. (11.11-14).
Conclui-se, portanto, que a
vinculação entre Israel e a Igreja é permanente, mostrando que a Igreja sem
Israel nem sequer pode existir e, mais ainda, a Igreja perderia sua identidade
se se esquecesse de sua relação contínua com Israel.
2.3 - A práxis concreta da Igreja
como povo de Deus
Em Gl 3.28 e 1 Co 12.13, o apóstolo
Paulo elenca algumas das características que devem nortear a Igreja como
comunidade que toma para si o conceito de povo de Deus:
1. "Não há mais judeu nem
grego". A
condição religiosa do ser humano já não era mais impedimento para fazer parte
da comunidade de fé. Todos podem ser integrados ao povo de Deus, colocando,
assim, em evidência a unidade do povo de Deus.
2. "Não há escravo nem
livre". A
condição sócio-política dos homens em nada influencia a questão da salvação. As
diferenças entre escravo e livre, na comunidade dos salvos, não significava
nada (Fl 16).
3. "Não há homem nem
mulher".
Mostrava que era nas comunidades domésticas que as barreiras eram rompidas e se
tornavam irrelevantes, em favor da nova vinculação de todos a Cristo.
Compreende-se daí que todos os
fiéis constituem o sujeito social da Igreja: os fiéis desta vertente não podem
mais se satisfazer com o papel de "objeto" e funções ministeriais de direção,
todos se tornam sujeito destacado do agir eclesial. Agora, a realidade eclesial
abrange e integra todos os fiéis, sem diferenciação alguma, como Povo de Deus.
Portanto, podemos concluir este
capítulo compreendendo que o conceito da "Igreja como Povo de Deus" expressa
bem o caráter universal e missionário da Igreja; Deus suprime na nova aliança o
corte entre o único povo eleito de Israel e os muitos povos gentios, ao reunir para
si um "povo dentre os povos". Essa reunião só se realiza, portanto,
como acontecimento permanente da missão e da auto-superação deste povo uno rumo
ao muitos povos e culturas. Para a Igreja, a missão não deve se tornar
conseqüência da comunhão entre os seus, mas ambas as tendências básicas constituem
somente em recíproco condicionamento, a verdadeira identidade do povo de Deus.
I - A DIMENSÃO DA IGREJA COMO
POVO DE DEUS NA TEOLOGIA SISTEMÁTICA
Considerações preliminares
A Igreja é povo de Deus e corpo
de Cristo. Ao reconhecer essa imagem, a Igreja confirma seu vínculo com a
tradição veterotestamentária, relembrando os símbolos que giravam em torno das
idéias de eleição e aliança.
Assim, a categoria da Igreja como
povo de Deus está fundamentada pela Sagrada Escritura no que concerne às
idéias: eleição, aliança, serviço e missão de Deus entre os homens.
O estudo dos textos do Antigo e
Novo Testamento estabelecem características históricas visíveis e concretas, referidas
ao povo de Deus, de que foram elegidos para testemunhar a presença de Deus na
história dentro de um propósito de redenção universal.
A Igreja, eleita e vocacionada,
foi escolhida para proclamar às nações os atos redentores de Deus, por
intermédio de seu filho Jesus Cristo. "A igreja tem por missão
despertar, acordar, preocupar, mostrar os caminhos, exortar e estimular
constantemente."
Portanto, evidencia-se a relevância
de tratar o tema a que nos propomos, pois, as distorções quanto à compreensão
são inúmeras.
A Igreja, assim como o povo de
Israel, é uma comunidade de eleitos, não havia méritos que a qualificasse para
entrar em aliança com Deus, a iniciativa foi unilateral, procede de Javé; não
está condicionada somente aos organismos institucionais e não se sujeita ao
espírito humano; sua vida provém do fato de sua eleição: sua linhagem é santa,
sua missão está a serviço do Reino do céus.
Estas dimensões, derivadas de sua
eleição, demonstram, ao mesmo tempo, seu caráter humano e transitório de
comunidade. Assim, a Igreja é também uma instituição de membros pecadores e
falhos; sua pureza e santidade se mesclam com a existência de falsos profetas,
que, embora realizando as obras de Cristo estão muito distantes de seu
espírito; ela não é o Reino e por isso sua missão e serviço podem converter-se
até mesmo num pseudo-cristianismo.
A Igreja, diferente do povo de
Israel, é uma comunidade constituída exclusivamente por vínculos religiosos;
sua estrutura não supõe e nem exige uma continuidade num plano ético, cultural
ou social com nenhum povo da terra, senão que está aberta ao todo, à plenitude,
à pluralidade das nações.
Por outro lado, este universalismo
não contempla as peculiaridades específicas de cada povo, com os carismas dos
seus membros e de suas formas religiosas. Ademais, a Igreja é a forma
escatológica da intervenção de Deus na história do ser humano por intermédio da
ação ministerial de Jesus, presente na terra como realizador perfeito do amor
da Trindade ao gênero humano.
A imagem de povo nos apresenta
aspectos familiares e profundos da realidade eclesial; descreve a Igreja em sua
dimensão tanto mística como social e temporal; na mística, quando os membros se
agrupam em torno de Cristo presente nos sacramentos e no acontecimento da
proclamação de Sua Palavra; a dimensão temporal e social se manifestam no
destino da Igreja, em sua peregrinação para o Reino de Deus.
Para o reformador João Calvino, a
Igreja deveria ser uma comunidade onde houvesse o estímulo e o encorajamento
para o exercício da fé e da obediência, e sua qualidade maior deveria ser
norteada pela "comunhão dos santos", mesmo que implicasse uma
vivência em meio a lutas, privações e perseguições.
Calvino fazia distinção entre
Igreja visível e invisível. A igreja visível é aquela que podemos conhecer,
ver, apalpar, ou melhor, uma assembléia visível de pessoas que se reúnem num edifício
especial, que pertencem a certa paróquia ou diocese. A igreja deveria possuir
os seus ofícios; pastor, professor, presbítero e diácono, que deveriam colaborar
na manutenção da disciplina eclesiástica. Assim a igreja, deveria cuidar e ter
o controle da moral e dos costumes. A igreja invisível é composta pelos eleitos
e fundamentada pela Palavra de Deus e os sacramentos. É o conjunto de todos na
terra que têm fé em Cristo, onde a comunhão interna é compartilhada por todos
os que possuem fé comum e a mesma esperança.
Lutero, por seu turno, entende a
Igreja não propriamente como Povo de Deus, mas como a comunhão dos crentes ou "comunhão
dos santos" como aparece no Terceiro Artigo do Credo Apostólico. Refletindo
a unidade da fé, compartilhada por todos da comunidade. Portanto, a pertença à
Igreja é uma questão de fé. E essa comunhão entre os fieis era fruto do
Espírito Santo, assim, desqualificava qualquer conceito institucional para Igreja.
Lutero entendia a Igreja como uma união mística, espiritual e invisível.
Conceito novo e revolucionário para o seu mundo.
Para Lutero, as características
da Igreja eram: batismo, Ceia do Senhor e a proclamação da Palavra da Deus. A
igreja existe pela Palavra e em torno da Palavra de Deus e, através dos
sacramentos, o Espírito Santo opera e reúne os cristãos no mundo todo.
A história é concebida,
teologicamente, como a resposta divina ao drama humano. Essa resposta se dá em
diferentes níveis, dentre eles o acontecimento de Cristo - nascimento, seu
ministério, sua morte, sua ressurreição - constituem a fase final mais sublime.
Todo o relato bíblico coincide
com os acontecimentos da vida, morte e ressurreição do Senhor e os primeiros
cristãos foram homens e mulheres convertidos pela pessoa de Cristo que,
posteriormente, expressaram sua fé em termos doutrinários. Calvino ao comentar
Gálatas 3.26, afirma que "todos quantos crêem nele é dado o privilégio
de serem feitos de Deus. Como? Pela fé em Cristo."
No entanto, a revelação e a vida
de Deus não se limitam ao mundo cristão, a Igreja é concebida como comunidade
de fé, mas também como um povo, na história, como instituição que se integra
aos planos de salvação de Deus a toda a humanidade.
Desta forma, a Igreja está no
vértice da história da salvação e dos seres humanos, evidenciado pela ação de
Deus sobre o mundo e, mais especificamente, no povo de Israel por ser este sua
continuação e sua perfeição. A ênfase do livro dos Atos dos Apóstolos aponta
para os desígnios de Deus sobre Israel e sobre o Messias como etapa final da comunicação
de Deus com os homens.
Assim, a perspectiva da revelação
progressiva de Deus na história se concebe nas narrações de ambos os testamentos.
A chamada de Deus para fazer de Abraão um povo de sua propriedade (Gn 12.1-8;
17.1-8); a fé do Patriarca (Gn 15.6); a revelação à Isaque e Jacó (Gn 26.1-6;
28-10-12); a aliança com esse povo (Êx 19.1-8; 20.1-20); o preparo do povo
pelos profetas para a espera do Messias.
Jesus é para a comunidade cristã
primitiva o cumprimento das esperanças de Israel (Lc 2.29-32; At 4.11-12). A
Igreja surge como a continuação e culminação das esperanças messiânicas do povo
eleito. Assim, a igreja representa uma nova economia de graça e salvação em Jesus Cristo e, também,
o Israel escatológico, elevada à dimensões cósmicas, em que culminam todas as
intervenções salvíficas de Deus na história.
Na epístola aos Efésios, podemos
ler:
"Vocês, portanto, já não
são estrangeiros, nem hóspedes, mas concidadãos do povo de Deus e membros da família
de Deus. Vocês pertencem ao edifício que tem como alicerce os apóstolos e os
profetas... Em Cristo, toda construção se ergue, bem ajustada, para formar um
templo santo no Senhor. Em Cristo, vocês também são integrados nessa construção,
para se tornarem morada de Deus, por meio do Espírito". (2.19-20;22)
Este tema está fortemente
arraigado no espírito de Paulo, que dele fez um símbolo interpretativo do
crescimento da comunidade cristã, uma realidade a ser edificada à maneira como
a Igreja é compreendida no ministério de Jesus.
3. Povo de Israel e Igreja de
Deus
Depois de percebermos a ação de
Deus na história dos seres humanos, convém que tratemos de especificar as
relações existentes entre o povo de Israel e a Igreja, como comunidade
continuadora das promessas daquele povo.
Em primeiro lugar, nos termos "povo
de Deus" e "Israel", nos escritos neotestamentários, é
praticamente impossível evitar a ambivalência. Em alguns momentos, como em At
26.17, a Igreja parece situar-se em um plano superior ao povo e aos gentios; em
outros, como em Rm 15.7-12, se descreve como formada tanto pelo povo eleito
como pelos gentios.
Em segundo lugar, o conceito de
povo neotestamentário é unitário; em nenhuma parte existe uma contraposição
radical entre Israel e a Igreja. Existe uma continuidade entre os dois
testamentos, o mesmo Deus revela seus desígnios de amor ao mesmo povo.
Nesse contexto, R. Schnackenburg
admite que existe uma certa tensão entre Israel e a Igreja. De um lado, Deus
não revogou suas promessas à Israel e a Igreja é a continuação legítima, na
história da salvação cujo processo começou na criação de Israel, que Deus
elegeu para ser seu povo; por outro lado, a Igreja é uma criação nova, uma
entidade espiritual originada pelo sangue de Jesus, composta por muitos povos,
na qual participam todos, judeus e gentios, homens e mulheres, escravos e
livres, segundo a distribuição dos carismas pelo Espírito.
Assim, sintetizando este item,
por exemplo, a interpretação de Hans Küng, complementa que:
"A Igreja é, sempre e em toda
a parte, todo o Povo de Deus, toda a Ecclesia, toda a comunidade de crentes.
Todos são a estirpe eleita, o sacerdócio régio, o povo santo. Todos os membros
deste Povo de Deus são chamados por Deus, justificados em Cristo, santificados
no Espírito Santo. Nisto todos são iguais, dentro da Igreja."
Uma grande questão que fica
aberta a muitos questionamentos e interpretações é quanto ao relacionamento da
Igreja com o Reino de Deus. Para os cristãos dos primeiros séculos, o Reino foi
sempre considerado escatológico. Uma oração primitiva do segundo século
continha: Lembra-te, ó Senhor, da tua Igreja, para... ajuntá-la como um
todo, em sua santidade, dos quatro cantos da terra, para entrar no teu reino,
que tens preparado para ela.
No período patrístico, Santo
Agostinho de Hipona identificou o Reino de Deus com a Igreja. A partir da
Reforma Protestante, embora em uma forma modificada a identificação de um com o
outro foi perpetuada. João Calvino (1509-1564), um dos sistematizadores da
teologia reformada utilizou a passagem do Evangelho de Mateus, 13.47-50, como
argumento bíblico, com o propósito de fundamentar o princípio da identificação
da Igreja com o Reino de Deus.
Tais conceitos relacionados com o
Reino e a Igreja, e a relação existente entre os mesmos, são trabalhados e
desenvolvidos por Ladd, quando afirma:
"A missão de Jesus foi a de
inaugurar uma era de cumprimento como evento antecipado de uma consumação
escatológica, e, se num sentido real, o Reino de Deus, em sua missão, invadiu a
história humana, ainda que de um modo inesperado, segue-se que aqueles que
recebem a proclamação do Reino são considerados não apenas com o povo que iria
herdar o Reino escatológico, mas como o povo do Reino há no tempo presente e, consequentemente,
em algum sentido da palavra, a Igreja."
Além disso, essa relação entre o
Reino de Deus e a Igreja pode ser demonstrada nas atitudes de Jesus. Em
primeiro lugar, Jesus não assumiu o seu ministério com o propósito de iniciar
um novo movimento, reconheceu a Israel, a quem o pacto e as promessas foram
dados, como os naturais "filhos do Reino" (Mt 8.12; 10.5-6). Sua
missão foi a de proclamar ao povo de Israel que Deus estava agindo naqueles
dias a fim de cumprir as suas promessas e conduzir Israel ao seu verdadeiro
destino.
O segundo fato é que Israel
rejeitou a Jesus e a sua mensagem a respeito do Reino. A proclamação do Reino e
a chamada ao arrependimento caracterizavam o ministério de Jesus desde o
início, mas o evangelhos registram o conflito e a rejeição de Israel à mensagem
que culminou na sua morte.
Um outro aspecto, o terceiro
fato, é significativo. Embora Israel como um todo rejeitou a oferta do Reino
feita por Jesus, um grupo remanescente abraçou a fé no Cristo, tornando-se o
verdadeiro Israel e os representantes da nação como um todo, portanto, os
discípulos de Jesus são os recipientes da salvação messiânica, o povo de Deus,
o povo do Reino, o verdadeiro Israel.
O fato de que Jesus considerou o
círculo daqueles que receberam a sua mensagem como sendo os filhos do Reino, o
povo peculiar de Deus, como o verdadeiro Israel de Deus, que assumiram o lugar
da nação rebelde, no entanto, os discípulos de Jesus pertencem ao Reino; mas
eles não são o Reino.
Essa aparente contradição pode
ser explicada. Em primeiro lugar, o NT não iguala os cristãos com o Reino.
Jesus não equaciona os discípulos com o Reino. Muitas passagens apontam para a relação
inseparável entre a Igreja e o Reino, mas não a sua identidade (Mt 13.38-43;
16.18-19); os missionários pregavam o Reino de Deus, não a Igreja (At 8.12;
19.8; 20.25; 28.23-31). Assim, a Igreja constitui-se no povo do Reino, nunca no
próprio Reino.
Em segundo lugar, o Reino gera a
Igreja. Aqueles que aceitaram a mensagem e o cumprimento da esperança
messiânica do VT foram constituídos como o novo povo de Deus, os filhos do
Reino, o verdadeiro Israel, a Igreja incipiente. Assim a entrada no Reino
significa participação na Igreja, mas a entrada na Igreja não significa,
necessariamente, entrada no Reino.
Em terceiro lugar, a missão da
Igreja é dar testemunho do Reino. Ela não pode edificar o Reino ou mesmo
tornar-se Reino, mas pode proclamar os atos redentores de Deus em Cristo em
favor da criação e das criaturas, como se lê no evangelho de Mateus, tanto
judeus como gentios (Mt 8.11-12).
Em quarto lugar, a Igreja é
considerada como sendo a agência do Reino. Os discípulos foram considerados
como agentes instrumentais do Reino, pelo fato de as obras do Reino terem sido
realizadas por eles como se fossem realizados pelo próprio Jesus. Pregavam o
Reino mas também curaram os enfermos e expulsavam demônios (Mt 10.8; Lc 10.17).
Assim, a Igreja torna-se o instrumento do Reino de Deus na proclamação da
Palavra e na batalha contra os poderes satânicos.
Por fim, a Igreja é a guardadora
do Reino. O conceito veterotestamentário tinha Israel como o guardador do
Reino. Desde o chamamento de Abraão e a entrega da Lei, o domínio e o governo
de Deus podiam ser experimentados somente através da lei, e, Israel, sendo a
guardiã da lei, mantinha o Reino de Deus em custódia.
Assim, diante disso tudo, podemos
concluir este capítulo reafirmando que na pessoa de Jesus, o reinado de Deus manifestou-se
em um novo evento redentor. A nação de Israel rejeitou a proclamação deste
evento divino, mas aqueles que o aceitaram se tornaram os verdadeiros filhos do
Reino. A ekklesia torna-se a guardadora do Reino, em lugar dos
israelitas.
Portanto, a Igreja não somente
testemunha a respeito do Reino, mas também se constitui em instrumento do
Reino, à medida que este manifesta o seu poder neste era presente, ela é também
a guardadora do Reino. Hans Küng, conclui: "A Igreja não é o Reino de
Deus, mas levanta para ele os olhos, aguarda-o, ou melhor, vai ao seu encontro
como povo peregrino e prega-o ao mundo como seu arauto".
A DIMENSÃO DA IGREJA COMO POVO DE
DEUS NA TEOLOGIA LATINO-AMERICANA
Considerações Preliminares
É um dos fatos marcantes de nossa
era que no contexto latino-americano começa surgir uma reflexão que leva em consideração
justamente a realidade sofrida, injusta e oprimida em que vive a maior parte da
população deste continente. A Igreja, corpo de Cristo, não está isenta destas
injustiças, pelo contrário, pelo seu espírito pacífico e resignado, não oferece
resistência, nem alternativas práticas eficientes que desmontem e desmascarem
as intenções implícitas e explicitas destas estruturas injustas,
extratificadoras e desumanas da nossa sociedade.
Como conseqüência dessa profunda
crise, quando a Igreja latino-americana inicia seu processo de reestruturação,
ao mesmo tempo, ocorre uma desestruturação mundial das formas tradicionais de pensamento
e de crenças e, muitas vezes, a caótica procura de novas formas e estruturas
que respondam a esses anseios. A Igreja afastada e, sempre, na defensiva
durante séculos, torna-se agora uma parte da busca do homem hodierno e, como "Povo
de Deus" toma posição frente a uma sociedade sem vínculos afetivos,
fragmentada e totalmente alienante. Como a Igreja poderá ser e fazer diferença
nesta sociedade pós-moderna?
A Igreja latino-americana
encontra-se num momento novo. Nunca se produziu tanta reflexão
bíblico-teológica como agora. E, entretanto, sua identidade teológica, sua
práxis precisa ser elaborada, pois ainda não existe. A Igreja precisa manter
seus dogmas e sua verdade, no entanto, deve traduzi-la para o homem moderno e,
ao mesmo tempo, participar do próprio desenvolvimento desta cultura pós-moderna
e influenciá-la.
Sejam quais forem as verdades que
a Igreja proclame, o Povo de Deus deve distinguir-se sempre como a comunidade
de homens e mulheres que confessem o Senhorio de Jesus Cristo, que vivam sob a
proteção e inspiração do Santo Espírito e se comprometam como membros e assumam
seu compromisso e sua missão em prol do Reino de Deus. Deixará de ser Igreja
quando Jesus não for mais reconhecido como o Senhor, como o modelo-mor para a
vida humana e a história. A Igreja primitiva distinguia-se por sua confissão de
que "Jesus Cristo é o Senhor" tanto na sociedade quanto nos cultos.
No entanto, a missão da Igreja
não se esgota com o querigma. Deve reconhecer sua responsabilidade de
trabalhar e esforçar-se em todos os níveis e sentidos em prol do Reino de Deus
na terra. O Reino torna-se um acontecimento que se manifesta através das ações
seculares. Mais, a Igreja deve sempre ser uma comunidade empenhada num
compromisso integral com as tarefas da diaconia. Torna-se uma parte do
trabalho essencial da Igreja e um aspecto de sua tarefa missionária. Através do
serviço no e para o mundo, a Igreja apressa, efetivamente, o dia em que todos
os homens serão levados ao reconhecimento de que a verdadeira pregação do
Evangelho teve um efeito relevante na vinda final do Reino.
À luz do Novo Testamento a Igreja
possui três dimensões, as quais são possibilidades de expressar o modo pela
qual a Igreja realiza o seu ministério e cumpre a sua missão. A tríade neotestamentária
tem sido chamada pelos teólogos como Querigma (proclamação da Mensagem Cristã);
Diaconia (serviço no e para o mundo) e Koinonia (o caráter fraterno e solidário
do Povo de Deus).
No entanto, essa tríade não pode
ser entendida como aspectos distintos, antes, se complementam, refletindo uma
única realidade: o caráter integral da obra redentora da Igreja no desempenho
de sua missão.
Os elementos que aqui colocamos
como dimensões da Igreja, Martinho Lutero as chama de marcas da igreja, "notae
ecclesia". Ele lista sete marcas, sob categorias diferentes de nossa
exposição. No entanto, nossa opção é pela tríade pois abarca e abrange todas as
categorias elencadas pelo Reformador.
O termo "querigma" significa
"mensagem". Logo, a Igreja é chamada para proclamar uma mensagem. A sua
mensagem consiste na proclamação ao mundo daquilo que Deus tem feito pelo homem
em Jesus Cristo.
Bonino avança nessa distinção da tarefa da Igreja, quando
afirma: "A Igreja, isto é, a comunidade daqueles que abraçam uma tarefa
histórica na liberdade do perdão e da santificação de Deus, não pode existir a
não ser na celebração, proclamação e testemunho concretos dessa liberdade."
Esta função de anunciar é
fundamental e a torna diferente de tudo mais. A mensagem que ela proclama é uma
mensagem de libertação e de chamado à maturidade. Os textos bíblicos do Novo
Testamento apontam para a mensagem que a Igreja tem que proclamar: Jesus
Cristo. A Boa Nova é a libertação que Cristo trouxe e oferece aos homens que
nele crêem.
O lugar da pregação e do ensino
na Igreja se deduz facilmente do que já foi dito. Eles são essenciais para a
vida eclesiástica porque são instrumentos poderosos para comunicar o evangelho
que se encontra no âmago da vida da Igreja e para tornar efetivo este
evangelho, também, dentro da Igreja.
No entanto, a proclamação da
Palavra não está confinada às quatro paredes do templo, nem é monopólio da
liderança da Igreja. A palavra de Deus não é mais propriedade da instituição,
não está mais presa sob a velha ortodoxia alienante e desfigurada. A Igreja é
Povo de Deus. Todos participam. Todos podem participar do serviço de ensinar,
todos são enviados à missão, todos são responsáveis pela comunidade, todos
devem se santificar, "todos somos irmãos" (Mt 23.8).
Boff expressa esta idéia da
seguinte maneira: "(...) uma Igreja do povo, com os valores do povo, em
termos de linguagem, expressão litúrgica, religiosidade popular, etc."
A Igreja não se limita apenas à
Palavra de Libertação, mas também deve juntar-se a Cristo em sua obra de
libertação do homem. Isto é "diaconia" ou serviço. Harvey Cox ao
conceituar diaconia, o faz afirmando: "A diaconia se refere, realmente,
ao ato de curar e reconciliar, de tratar as feridas, de ligar o abismo e de
restaurar a saúde do organismo." A Igreja não se restringe à
proclamação da chegada do Reino, tem a função, também, de anunciar os seus
benefícios. O ministério de Jesus estava imbuído de um projeto que envolvesse o
homem integral, quando proclamou:
"O Espírito do Senhor
está sobre mim, pelo que me ungiu para pregar boas novas aos pobres, enviou-me
a proclamar libertação aos cativos e restauração de vista aos cegos, para pôr
em liberdade os oprimidos e apregoar o ano aceitável do Senhor." (Lc
4.18-19)
O Cristo vai à frente, e, a
Igreja não tem outra alternativa senão a de seguir o mestre. Servi-lo é
juntar-se à sua obra de libertação no mundo. A diaconia, portanto, está
envolvida no ato de tornar a Palavra de Deus em ação libertadora. No entanto,
diaconia não é meramente um serviço social, mas ela significa, sobretudo, que
toda a comunidade cristã é uma comunidade chamada a servir. Assim, a tarefa da
Igreja é a de ser diáconos do mundo, que se submetem e se entregam à luta pela
libertação, saúde, educação, dignidade e integridade do homem e do mundo.
Portanto, a proclamação sem a
diaconia é abstrata e vazia. A diaconia sem a proclamação não faz sentido.
Jesus Cristo evangelizava curando e curava evangelizando.
Esta dimensão da vida da Igreja
tem seu próprio valor intrínseco, de acordo com o exemplo e a mensagem de
Jesus, mas também possui um valor instrumental no fortalecimento do Povo de
Deus para seu ministério no mundo.
Assim, Paulo retrata esse
princípio afirmando que a Igreja é um corpo com muitos membros, todos
vivificados pelo mesmo Espírito e cada qual com sua função. Não existe nenhum
membro não carismático, vale dizer, ocioso, sem ocupar um determinado lugar na
comunidade: "cada membro está a servido do outro membro" (Rm
12.5). Assim, o verdadeiro serviço do Povo de Deus aflora quando homens e
mulheres colocam o que são, o que têm e o que podem a serviço de Deus e dos
irmãos. Referem ao Espírito Santo seus dons e os fazem frutificar como dádivas
de Deus.
A palavra koinonia, grega,
é geralmente traduzida, na ótica latino-americana, por "comunhão", "fraternidade",
"solidariedade". H. Cox diz que a fraternidade é o "aspecto
da responsabilidade da Igreja que exige uma demonstração visível daquilo que a
Igreja está dizendo no querigma e apontando na sua diaconia".
Karl Barth fala da Igreja como sendo
"a demonstração da intenção de Deus para toda a humanidade". Assim,
a Igreja é mais do que uma simples esperança. Ela é o lugar onde a esperança já
se tornou realidade, onde o futuro já assumiu uma forma concreta.
Leonardo Boff afirma que a
Igreja, Povo de Deus, é configurada por "comunidades de batizados, de
fé, esperança e amor, animados pela mensagem de absoluta fraternidade de Jesus
Cristo que se propõe, historicamente, a concretizar um povo de livres,
fraternos e participantes."
Depois de termos nos ocupado com
a significação teológica de Igreja, vamos nos dedicar ao caráter essencialmente
missionário da Igreja, que, por sua vez, efetivamente, torna-se a prática da tríade
epigrafada.
Os textos bíblicos relatam que a
Igreja é uma comunidade que Deus criou para uma missão. É esse o conceito de "Povo
de Deus" no Antigo Testamento (Gn 12.4; 18.18; Is 43.10; 42.6-8), e no Novo
Testamento (Mt 20.23-28; 28.16-20; Jo 17.15; 20.19-23; I Pe 2.9-10; 2.18-25).
Assim, a missão da Igreja não pode ser concebida como uma atividade, mas sim,
como a própria razão de ser e existir.
A Igreja não é um fim em si
mesma. Foi idealizada por Deus com um propósito distinto e definido, é o seu
agente. A igreja não existe para si mesma. Só tem sentido na medida em que está
a serviço de Deus no mundo. Tudo o mais deve girar em torno deste imperativo:
missionar. Os missionários surgem dentro da própria comunidade. Missionário e
comunidade são correlativos e complementares. Sua esfera de ação é o mundo. Só
assim a Igreja tem sentido. Só assim ela é verdadeiramente Igreja de Jesus
Cristo.
Diante disso, a Igreja não é uma
estranha no mundo e nem é sua inimiga. A missão nos leva a pensar na Igreja
como serva do mundo.
4.1 - O Mundo como obra de Deus
Deus criou o mundo e por isso lhe
pertence (Sl 24.1). Asensio, confirma: "o israelita recorda no culto, interpelando
assim a Deus, as antigas façanhas de Javé (...). Javé acima de todos os deuses,
dominador das "águas", vencedor do monstro (Raab), criador e rei."
Essa compreensão perpassa toda a
Escritura como credo confessional sobre a percepção de Deus, não como um ser
abstrato, etéreo, mas ao contrário, como unicidade concreta por sua grandeza e incomparabilidade
com os deuses das nações circunvizinhas. Josué proclama que sua casa serviria a
Javé. Elias argumenta ao povo infiel para que escolhesse a quem serviriam: a
Javé ou a Baal (I Re 18.21).
Portanto, os textos bíblicos
mostram a centralidade de Javé como criador e mantenedor da criação. O
israelita sabe que o feito criacional de Javé foi a seu favor e que somente
ele, como Povo escolhido de Deus, pode ser o intérprete da ação criadora de
Deus.
4.2 - O mundo como objeto do amor
de Deus
Deus se revela na história. Os
relatos bíblicos são os relatos do caminhar de Deus junto com os seres humanos.
Chama um povo para faze-lo bênção e sinal de Deus na terra (Gn 12). Contrai uma
aliança com Abraão (Gn 15,18) e através de Moisés com o povo de Israel (Êx 24.8).
Este é o Deus que se revelou no Êxodo e na caminhada do povo pelo deserto até a
conquista da terra prometida. Deus está sempre agindo e imiscuindo-se na
história para o bem do homem e do mundo. É através dos eventos históricos que
Deus fala, se revela e renova a vida no mundo.
Assim, o mundo é a arena da
atuação libertadora e renovadora de Deus. A Igreja participa na medida em que
participa do mundo. A missão da Igreja é juntar-se a Deus no seu trabalho de
libertação e renovação.
No entanto, os pobres devem ser
os primeiros destinatários da missão da Igreja, uma vez que a boa-nova de Jesus
se mostra como boa na capacidade de gerar sentido lá onde a existência parece
ter fracassado. Uma evangelização que não trouxer uma potenciação maior de
vida, que não desafogar as mentalidades dos medos existenciais, que não levar a
estruturas sociais de maior colaboração e humanização, dificilmente prolonga e atualiza
a boa-nova de Jesus. Assim, cabe à Igreja atualizar os atos redentores de Deus
em favor de todos, mas, prioritariamente, aos empobrecidos, como sujeito
principal da evangelização.
Odilon Chaves avança um pouco
mais, complementando a tese de Boff, afirmando:
"A Igreja deve anunciar que
chegou para ficar ao lado dos oprimidos (...) a Igreja não deverá somente se
preocupar em resolver seus problemas sociais. Cristo deve habitar em cada
coração, dando conforto, amor, alegria, certeza que Deus está presente. Deve
haver uma transformação interior, no coração, e uma transformação social."
Mas, para proclamar a ação
histórica de Deus ao mundo, torna-se necessária a compreensão de que o mundo é
o "locus teológico", onde Cristo envia sua Igreja e promete
conduzi-la.
4.3 - O mundo como "Locus
teológico" do Povo de Deus
O Povo de Deus é chamado a viver
no mundo. É o local para onde Deus enviou sua Igreja, para viver a sua fé, e
ser um sinal de esperança e libertação para o mundo. Não é concebível uma
vivência cristã fora do mundo. O mundo é a terra onde Deus plantou a semente da
sua Igreja.
Essa compreensão do propósito
intencional, missional e universal de Deus para com o mundo, deve causar grande
impacto na sua Igreja, tanto da forma de pensar, como também de agir como Povo
de Deus.
Primeiramente, como aqueles que
foram eleitos e chamados para ser parte integrante do Povo de Deus, reside
apenas na ação intencional que Deus teve um dia para conosco; temos que
reconhecer que esse fato reside tão somente na graça de Deus. Como Povo de Deus
precisamos aprender acerca do sentimento de Jesus quando ora: "Não te
peço para tirá-los do mundo; e, sim, para guardá-los do maligno." (Jo
17.15)
Em segundo lugar, o Povo de Deus
precisa reconhecer que a ação intencional de Deus nos concedendo "vida juntamente
com Cristo" não é apenas dom de Deus, mas também responsabilidade para
com aqueles que nos cercam, pois somos agora "feitura dele, criados em
Cristo para boas obras" (Ef 2.1-10). Como Abraão foi chamado para ser
uma bênção para todas as nações da terra, em Jesus fomos escolhidos e chamados
para sermos sal da terra e luz do mundo (Mt 5.13-16). Assim, como Israel, fomos
eleitos e chamados não apenas para ser "depósito" das bênçãos de
Deus, mas principalmente "canal" para que estas cheguem a todo homem
e mulher latino-americano.
Em terceiro lugar, uma vez
compreendido nosso papel como veículos das bênçãos de Deus aos povos da terra,
precisamos reavaliar nossas atividades e estruturas eclesiais, tendo em vista
uma postura missionária mais clara e objetiva em relação ao povo brasileiro.
Assim como os discípulos foram chamados para ir e dar frutos, e frutos que
permanecessem, nós também fomos chamados por Deus e enviados a gerar frutos em
nosso locus vivendi (Jo 15.16).
Concluindo este capítulo, podemos
perceber que a compreensão de pertença ao Povo de Deus é, realmente, uma
descoberta maravilhosa. A pessoa surge, apoiada na força da esperança, das
profundezas de seu desespero. Sua covardia é substituída pela coragem. Os laços
rígidos de seu egoísmo são rompidos pelo sabor da gratidão que o desprendimento
traz. A alegria brota e inunda sua dor, e o amor entra na vida do homem para
aniquilar sua solidão e restaurar sua dignidade.
Ademais, ao proclamar a Palavra libertadora,
ao experimentar a comunhão dos santos e ao servir o outro, o Povo de Deus pode
encontrar seus semelhantes e seu lugar na história, tal é a transformação do
isolamento existencial no modelo saudável de Jesus Cristo e, paralelamente,
descobrir o que significa viver na dimensão da Igreja como Povo de Deus.
CONCLUSÃO
Chega o momento de uma conclusão
final. O texto bíblico e a sua teologia mostram que Deus confiou uma missão ao
povo de Israel, no entanto, Israel fracassou pela sua desobediência e
apostasia, embora, Deus havia revelado toda a sua vontade em fazer de Israel um
sinal de sua presença e bondade a todos os povos.
Com o advento de Jesus Cristo,
rompendo todas as barreiras sócio-político-religiosas, fora transferida à
Igreja toda urgência dessa tarefa.
Se Jesus não for levado a sério,
a igreja pode justificar sua passividade. O texto bíblico, porém, declara
exatamente o oposto. Se Israel que era "considerada" a oliveira boa
e, por causa da desobediência, foi rejeitada, quanto mais não rejeitará a
oliveira brava, precisamente, nós, a Igreja de Jesus Cristo. À luz do destaque
bíblico a complacência e a indolência da Igreja não serão toleradas.
A conclusão que chegamos resume
em poucas palavras o que requereu muitas páginas para desenvolver e explicar.
Martinho Lutero disse:
"Acaso esses [discípulos de
Jesus] eram chamados de povo de Deus naquele tempo? Eles certamente eram o povo
restante de Deus, mas não tinham esse nome, ao passo que quem tinha esse nome não
o era. Quem sabe se em todo o curso do mundo, desde a origem da Igreja de Deus,
o estado desta sempre tenha sido tal que alguns eram chamados de povo e santos
de Deus e não o eram, ao passo que outros dentre eles o eram efetivamente qual
remanescente, mas não eram chamados de povo ou santos?" (LUTERO, p. 62,
V. 4)
Possa Deus ajudar seu Povo a
compreender que a proclamação da Palavra não está confinada às quatro paredes
do templo, nem é monopólio da liderança da Igreja. A palavra de Deus não é mais
propriedade da instituição, não está mais presa sob a velha ortodoxia alienante
e desfigurada. A Igreja é Povo de Deus. Todos participam. Todos podem participar
do serviço de ensinar, todos são enviados à missão, todos são responsáveis pela
comunidade, todos devem se santificar, "todos somos irmãos" (Mt
23.8).
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