DIVÓRCIO A SOLUÇÃO INDESEJADA PARA O OPRIMIDO
Objetivo:
Apresentar
o conceito de divórcio no contexto bíblico.
Quando vamos
tratar de divórcio dois textos são extremamentes importantes na bíblia para
esta conversa. E não podemos ler um sem o outro, uma vez que ambos estão
amarrados um no outro. Isso se deve porque quando Jesus foi indagado sobre o
divórcio, ele respondeu aos seus questionadores baseado na decisão de Moisés de
conceder carta de divórcio. Portanto quero convidá-los a junto comigo olharmos para
estes dois textos em busca do que Jesus realmente estava dizendo sobre o
divórcio. Vamos partir da fala de Jesus e buscarmos compreender o que ele
estava dizendo aos seus questionadores.
1Tendo acabado de dizer essas coisas, Jesus saiu
da Galiléia e foi para a região da Judéia, no outro lado do Jordão.
2Grandes multidões o seguiam, e ele as curou ali.
3Alguns fariseus aproximaram-se dele para pô-lo à
prova. E perguntaram-lhe: "É permitido ao homem divorciar-se (apolyō - repúdio) de
sua mulher por qualquer motivo?” (Mateus 19.1-3 – Marcos 10.1-12)
1 – Por
qualquer motivo?
Veja! Eles não perguntaram para Jesus se era permitido divorciar-se.
O divórcio era aceitável para eles, mas se eles podiam repudiar sua mulher por qualquer motivo.
O que não estava claro
para eles era por quais razões o repúdio era licito. Devemos antes de respondermos a pergunta “por quais
motivos”, respondermos a pergunta: por que o divórcio era algo normal para
eles?
Jesus nos responde no verso oito a esta pergunta:
8Jesus respondeu: "Moisés lhes permitiu divorciar-se (apolyō - repúdio) de
suas mulheres por causa da dureza do coração de vocês. Mas não foi assim desde
o princípio. (Mateus 19.8)
Quero destacar a palavra divorciar-se, pois creio que seja
relevante para nossa conversa. A palavra divorciar-se, neste texto, é a palavra grega “apolyō”- que
deveria ser traduzida como repúdio e não divórcio – significa liberar, despedir,
libertar por completo. Este é princípio do divórcio, colocar a pessoa em
liberdade total. Entretanto
Jesus até aqui está falando de repúdio, que é o direito do homem mandar a
mulher embora, descrita em Deuteronômio 22.13-21.
Para os judeus o
divórcio era aceitável porque Moisés o havia estabelecido conforme podemos ler em Deuteronômio
capítulo 24.1-4.
1Se um homem casar-se com uma mulher e depois não a quiser
mais por encontrar nela algo que ele reprova (Dt
22.13-21), dará certidão
de divórcio (kᵉrîthûth - divórcio) à mulher e a mandará
embora (shalach - repúdio).
2Se, depois de sair da casa, ela se tornar mulher de outro
homem,
3e o seu
segundo marido não gostar mais dela, lhe dará certidão de divórcio (kᵉrîthûth -
divórcio), e mandará embora (shalach - repúdio) a mulher. Ou também, se ele morrer,... (Deuteronômio 24.1-3)
Moisés regulamentou a lei do repúdio através do divórcio. Vemos aqui uma divorciada saindo
feliz com a assinatura consensual de seu marido, com liberdade para casar-se de
novo. Quem casasse com ela não cometeria adultério. A
mulher rejeitada pelo marido podia se casar novamente.
Exemplo é a mulher samaritana descrita
pelo evangelista João.
16Ele lhe disse: "Vá, chame o seu marido e
volte". 17"Não tenho marido", respondeu ela. Disse-lhe Jesus: "Você
falou corretamente, dizendo que não tem marido. 18O
fato é que você já teve cinco; e
o homem com quem agora vive não é seu marido. O que você acabou de dizer é
verdade". (João 4.16-18)
Olhando para estes textos percebemos que o divórcio era algo
aceitável na vida dos judeus, como algo natural na relação conjugal, contudo
Jesus se opõe a esta atitude.
Os judeus repudiavam
a suas mulheres e lhe davam carta de divórcio sempre que isso lhes era
conveniente, após a regulamentação de Moisés. Por
isso o problema não estava no divórcio e sim no repúdio. E essa é a pergunta que fazem a
Jesus: “Quando é permitido ao homem repudiar sua mulher? Por qual motivo?”.
2 – Jesus
Defende a Indissolubilidade do Casamento
Os fariseus chegaram a Jesus com essa
pergunta devido a duas correntes de interpretação sobre o repúdio e claro sobre
o divórcio. Assim como hoje a correntes de interpretação sobre diversos
pontos bíblicos. Por exemplo: predestinação e livre arbítrio, arrebatamento
pré-tribulacionista ou meso-tribulacionista, batismo imersão ou aspersão, etc.
Naquele tempo havia duas correntes muito forte que defendiam o repúdio/divórcio.
Contudo elas se diferenciavam no entendimento “do que era reprovável” ou “feio”
na atitude da mulher que dava ao homem o direito de divorciar-se.
1Se um homem casar-se (bā`al – ser dono, ter domínio) com uma mulher e depois não a
quiser mais por encontrar nela
algo que ele reprova, dará certidão de divórcio (kᵉrîthûth –
corte, rompimento do vinculo matrimonial) à mulher e a mandará
embora (shalach - repúdio). (Dt 24.1)
Dois importantes rabinos que
viveram antes de Jesus, Hilel e Shammai, deram suas interpretações para o que
viria a ser “coisa feia” ou “reprovável”, porém com perspectivas bem
diferentes. Hilel, mais
liberal,
entendia que “coisa feia” poderia ser até mesmo coisas triviais do dia a dia da
convivência da mulher com o marido, como queimar a comida, por exemplo, e que
isso seria uma justificativa suficiente para o homem dar carta de repúdio e divórcio
à sua esposa. Shammai,
mais conservador,
entendia que “coisa feia” ou “reprovável” era uma referência à infidelidade
conjugal e má conduta e que nesse caso sim, o homem era livre para dar carta de
repúdio e divórcio à sua esposa.
Não
podemos deixar de dizer que estamos diante uma cultura patriarcal, influenciada
pelo pecado, e desta forma a mulher, auxiliadora, passou a ser vista como
propriedade dos homens. Casar tornava a mulher propriedade de seu marido. É
importante lembrarmos também que estamos diante um modelo de casamento
deturpado, e não no modelo original que encontramos em Gênesis 1 e 2.
Neste modelo patriarcal somente o homem
podia tomar a iniciativa de conceder a carta de divórcio. Normalmente ele não o
fazia, pois isto implicava em devolver o dote dela para o seu pai. E com isso a
mulher repudiada continuava presa ao casamento, embora rejeitada por seu marido.
A resposta de Jesus ao questionamento dos fariseus quanto ao
“por quais motivos” o repúdio era licito, se inicia trazendo uma correção na
compreensão que eles tinham sobre o casamento e o repúdio.
4Ele respondeu: "Vocês não leram que, no
princípio, o Criador ‘os fez homem e mulher’
5e disse: ‘Por essa razão, o homem deixará pai e
mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne’?
6Assim, eles já não são dois, mas sim uma só
carne. Portanto, o que Deus uniu, ninguém o separe". (Mateus
19.4-6)
Ele não se preocupa em “entrar na
discussão” de qual escola estava correta, se a de Hilel ou a de Shammai. Jesus toma
a planta original da relação homem e mulher, descrita em Gênesis, antes da
queda, como base para explicar a problemática do repúdio. O que era entendido
pelos fariseus como uma espécie de direito, Jesus mostra que se tratava de uma concessão
dada por Moisés e regulamentada no
divórcio.
Jesus estava afirmando que o repúdio NÃO fazia
parte do plano original de Deus. A pergunta seguinte deles à Jesus nos mostra que eles
ficaram surpresos, e, questionam então a atitude de Moisés.
7Perguntaram eles: "Então, por que Moisés mandou dar uma
certidão de divórcio (apostasion – algo que separa) à mulher e mandá-la embora (apolyō - repúdio)? " (Mateus 19.7)
A pergunta deles é em outras palavras:
“Por que Moisés regulamentou o divórcio se não era para repudiar a mulher?”
8Jesus respondeu: "Moisés lhes permitiu divorciar-se (apolyō - repúdio) de
suas mulheres por causa da dureza do coração de vocês. Mas não foi assim desde
o princípio. (Mateus 19.8)
Esta concessão “o repúdio” só veio a
existir por causa do pecado. O pecado tornou o coração do homem duro,
insensível ao outro, incapaz de viver o projeto original elaborado por Deus no
Éden. O pecado gerou caos no ser humano e em toda criação.
O
que de fato acontecia era que o homem devido a dureza do seu coração, repudiava
sua mulher por motivos banais, e esta, não podendo trabalhar, pois vivia numa
sociedade patriarcal, não podendo mais se casar porque se encontrava
prisioneira do seu marido que a mandou embora, acabava se transformando em uma
indigente, e muitas vezes em prostituta para sobreviver, e vendo isto Moisés,
homem de Deus, concedeu carta de divórcio para que a mulher pudesse se casar
novamente, constituir uma família e ser amada. O mais importante é entendermos que Deus não reprovou a
atitude de Moisés. Jesus aponta ainda a razão desta aceitação da parte de Deus.
O divórcio foi aceito por Deus como uma
forma de libertar a mulher da opressão causada pela lei do repúdio;
visto que o ser humano vive dominado pela lei do pecado.
15Não foi o Senhor que os fez um só? Em corpo e em
espírito eles lhe pertencem. E por que um só? Porque ele desejava uma
descendência consagrada. Portanto, tenham cuidado: Ninguém seja infiel à mulher
da sua mocidade. 16"Eu odeio o divórcio (shalach -
repúdio)", diz o Senhor, o Deus de Israel, e "o homem que
se cobre de violência como se cobre de roupas", diz o Senhor dos
Exércitos. Por isso tenham bom senso; não sejam infiéis. (Malaquias
2.15,16)
Depois de mostrar aos fariseus que o repudio não agradava
a Deus, Jesus responde a pergunta dos fariseus: Por quais motivos o repúdio é
licito?
3 – O Repúdio Aceitável
9Eu lhes digo que todo aquele que se divorciar (apolyō - repúdio) de
sua mulher, exceto por imoralidade sexual, e se casar com outra mulher, estará
cometendo adultério". (Mateus 19.9)
Jesus, respondendo então aos
fariseus, afirma que a única exceção para o homem repudiar sua mulher era em
caso de “imoralidade sexual” (NVI), que a ARC traduz por “prostituição”.
A mulher repudiada
não tem carta de divórcio, portanto se envolver em outra relação a tornará
adúltera, assim também o homem que a repudiou está dizendo Jesus. Quanto à mulher pega em
imoralidade sexual essa era apedrejada pela lei de Moisés, portanto o homem
ficava viúvo e livre para viver a vida, por isso uma exceção.
Entretanto me parece que Jesus está querendo dar um novo
destino a essa mulher. Será que Jesus não está insinuando ao invés de
apedrejá-la dê-lhe a carta de divórcio? Será que ele não está insinuando a possibilidade de
deixá-la viva. No meu entender, Jesus está mais uma vez demonstrando uma
atitude de amor, como O fez com a mulher pega em flagrante adultério.
O que Jesus está
fazendo é condenando o repúdio, algo muito comum entre os homens em seu tempo.
Estes se cansavam de suas esposas e a mandavam embora, literalmente trocavam
suas esposas por uma mais nova. Mulheres abandonadas por seus maridos, mas
mulheres que desejavam ser amadas acabavam caindo em adultério, e, então na
busca de serem amadas terminavam sendo apedrejadas.
Para entendermos melhor a
concepção que os judeus tinham acerca desse tema, vejamos essa declaração de
Flávio Josefo, historiador judeu do século I: “Aquele que deseja
se divorciar da sua esposa por qualquer motivo (muito comum aos homens), deve
registrar por escrito que nunca mais voltará a se casar com essa mulher.
Portanto, ela terá liberdade de se casar com outro homem. Entretanto, enquanto
essa carta de divórcio não lhe for dada ela não poderá se casar”.
4
– Cinco Considerações Finais Sobre o Divórcio
1.
Em hipótese alguma, o divórcio, à luz das
Escrituras, é incentivado. Por mais que admitamos que a tratativa de Jesus em
Mateus 19.1-9 seja referente ao repúdio e não ao divórcio, é inegável que Jesus
sai em defesa da indissolução da união conjugal, deixando claro que a vontade
de Deus é que o casal permaneça unido, até o fim da vida. Contudo Jesus mostra
graça para com aqueles que estão nesta situação e perdoa todo o que se
arrepende.
2.
Muito do que hoje é ensinado em nossas denominações
sobre como proceder com pessoas divorciadas não está de fato alicerçado nas
Escrituras. São posicionamentos
preconceituosos e frutos de uma tradição patriarcal. A Bíblia não dá,
definitivamente, uma “fórmula” pronta dizendo “faça assim” ou “faça isso” no
que tange às inúmeras situações que envolvem um divórcio. Contudo é muito claro nos ensinos bíblicos
que Jesus deseja que todo ser humano tenha como viver com dignidade e por isso
Ele não desfez a lei de Moisés sobre o divórcio, mas refutou toda forma de
abandono e mau trato da parte do homem referente a mulher, apresentando o
projeto original de Deus aos seus questionadores.
3. O divórcio foi
e é uma solução indesejada por Deus para por fim a opressão sobre as mulheres. É resultado do
pecado humano e da desobediência aos preceitos do Senhor.
4. O divórcio
não é pecado, é uma regulamentação do repúdio. Portanto não pode
ser tratado como pecado.
5. Uma vez ocorrido na
vida de uma pessoa, Deus por Sua imensa graça pode sim trazer cura àqueles que
vivem ou vivenciaram esta experiência.
Pr. Cornélio Póvoa
de Oliveira - 23/05/2017
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